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Mês de Combate à Alienação Parental: Especialistas comentam projeto aprovado pelo Senado que altera Lei 12.318 de 2010 e ECA
Aprovado na semana passada pelo Plenário do Senado Federal, o Projeto de Lei 634/2022 altera a Lei da Alienação Parental (12.318/2010) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), dando um novo tratamento a um tema que tem gerado controvérsias no ordenamento jurídico nos últimos anos. O momento não poderia ser mais oportuno: na próxima segunda-feira, 25 de abril, é lembrado o Dia Internacional contra a Alienação Parental.
O projeto, aprovado pelos parlamentares, é o substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei do Senado 19/2016, com alterações posteriores feitas pela relatora, a senadora Rose de Freitas (MDB-ES). Agora, o texto segue para a sanção do presidente Jair Bolsonaro. Leia o parecer final.
A proposta aprovada pelo Senado retira a suspensão da autoridade parental da lista de medidas possíveis a serem usadas pelo juiz em casos de alienação parental e mantém: a advertência ou multa ao alienador, a ampliação do regime de convivência familiar com o genitor alienado e a alteração do regime de guarda para compartilhada ou sua inversão.
Ao contrário do que foi veiculado na semana passada, o projeto aprovado não proíbe o juiz de conceder guarda compartilhada ao pai ou à mãe investigados ou processados por violência doméstica. Essa determinação chegou a constar do projeto, mas foi retirada no parecer da relatora.
Visitação assistida e concessão de liminar
Um ponto mantido do texto que veio da Câmara trata da convivência entre pais e filhos durante o curso de processos instaurados para investigar casos de alienação parental. O texto assegura à criança e ao genitor a visitação assistida no fórum onde tramita a ação ou em entidades conveniadas com a Justiça.
O texto ressalva, entretanto, que a visita pode não ocorrer nos “casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente”. A avaliação sobre esse risco depende de um atestado emitido por profissional designado pelo juiz para o acompanhamento.
A relatora também preservou um artigo que prevê que a concessão de liminar deve ser preferencialmente precedida de entrevista da criança ou do adolescente perante equipe multidisciplinar. Ainda segundo o projeto, se houver indícios de violação de direitos de crianças e adolescentes, o juiz deve comunicar o fato ao Ministério Público.
Avaliação psicológica
Outro ponto determina que, na ausência ou insuficiência de profissionais responsáveis pela realização dos estudos psicológico, biopsicossocial ou de qualquer outra espécie de avaliação técnica exigida por lei ou por determinação judicial, a autoridade judiciária poderá proceder à nomeação de perito com qualificação e experiência pertinentes ao tema Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015).
Há ainda uma mudança quanto ao prazo para apresentação dessa avaliação. Os processos em curso de alienação parental que estejam pendentes de laudo psicológico ou biopsicossocial há mais de seis meses, quando da publicação da futura lei, caso seja sancionada, terão prazo de três meses para a apresentação da avaliação requisitada.
Já o acompanhamento psicológico ou biopsicossocial deve ser submetido a avaliações periódicas, com a emissão, pelo menos, de um laudo inicial, que contenha a avaliação do caso e o indicativo da metodologia a ser empregada, e de um laudo final, ao término do acompanhamento.
Mais a garantia à convivência familiar
Coordenadora do Grupo de Estudos e Trabalho sobre Alienação Parental do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Renata Nepomuceno e Cysne lembra que a Lei da Alienação Parental assegura a convivência familiar dos filhos com ambos os pais, ainda que seja por meio da convivência assistida, que é quando uma terceira pessoa, designada pelo juiz, acompanha esses encontros.
“A convivência somente poderá ser totalmente suspensa quando houver iminente risco à integridade física e/ou psíquica da criança ou do adolescente. Caso o projeto de lei seja sancionado, a Lei da Alienação Parental ampliará ainda mais a garantia à convivência familiar, pois dispõe que o Estado deve disponibilizar esse espaço de convivência, seja no próprio fórum ou em entidades conveniadas”, comenta Renata.
Segundo a especialista, a proposta também apresenta avanços com relação à atuação interdisciplinar, ao prever a possibilidade de a autoridade judiciária nomear perito com qualificação na temática da alienação parental. “Com relação ao acompanhamento psicológico, o projeto descreve melhor o procedimento, que deverá contar com laudo inicial, metodologia e laudo final, assim como dispõe que as avaliações devem ser periódicas.”
“A escuta da criança também teve destaque no projeto, que prevê a entrevista da criança ou do adolescente perante a equipe multidisciplinar antes da concessão da liminar, sempre que possível. Assim como faz o alinhamento normativo ao assegurar o depoimento nos termos da Lei 13.431/2017. Importante registrar que, ainda que a entrevista ocorra com base na Lei 13.431/2017, a avaliação técnica deve considerar a dinâmica familiar como um todo, com ampla análise da sistemática em que a criança e o adolescente estão inseridos.”
A advogada lembra que o projeto propõe ainda a revogação do inciso VII, do artigo 6ª, que prevê a declaração da suspensão da autoridade parental como uma das medidas que pode ser adotada em casos de alienação parental. “Ressalta-se que a suspensão da autoridade parental continua prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente e pode ser medida adotada por descumprimento injustificado das determinações judiciais.”
“O Projeto de Lei 634/2022, assim como a Lei da Alienação Parental em vigor, preza pela celeridade do trâmite das ações de alienação parental, e concedeu o prazo de três meses para apresentação de laudo psicológico dos processos que estejam pendentes de avaliação há mais de seis meses”, destaca Renata Nepomuceno e Cysne.
Importância do acompanhamento psicológico
“O psicólogo foi novamente levado a um lugar de importância nas discussões em relação à Lei da Alienação Parental”, comenta a psicanalista Giselle Groeninga, diretora de relações interdisciplinares do IBDFAM. Ela observa que o projeto de lei aprovado no Senado se preocupou em modificar os procedimentos de acompanhamento psicológico.
A especialista destaca: “O texto aprovado diz que deve haver um laudo no início e durante o acompanhamento psicológico. Também os prazos desses laudos foram contemplados pela modificação no projeto de lei e a previsão de que, se for o caso de realizar visitas assistidas, essas devem ocorrer no fórum”.
A abordagem evidencia, mais uma vez, a importância dos psicólogos nos processos que investigam alienação parental, segundo Giselle. “O psicólogo é tão importante que a própria Lei da Alienação Parental prevê como devem ser realizadas as perícias, de forma que todos os envolvidos sejam avaliados.”
De acordo com a psicanalista, esses profissionais desempenham função fundamental para identificar fatores inconscientes, dinâmicas disfuncionais, além da ocorrência e também o grau da alienação praticada. Também são os responsáveis por levar a pais e mães a importância de uma parentalidade conjunta, com igualdade de cuidados e deveres.
Mediação em vez de litigância
“A solução para os conflitos parentais está no desejo de harmonia dos pais em prol do desenvolvimento saudável dos filhos”, destaca a psicopedagoga Edna Maria Galvão, membro do IBDFAM e autora do livro “Quanto Bem-Me-Queres? Alienação Parental na Produção de Memória”.
Mediadora judicial e extrajudicial do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSC-RJ e como conciliadora privada de casais em conflito com foco no bem-estar de crianças e adolescentes, a especialista diz que a mediação pode servir ao sistema de Justiça em casos como esses.
Afinal, o caminho deve ser o consenso e não a litigância pelo Judiciário, segundo Edna. “Ao se separarem, os casais devem buscar advogados familiaristas e/ou mediadores para resolverem satisfatoriamente e na paz as suas questões. Estudos demonstram que a alienação parental afeta negativamente a produção da memória, a autoestima da criança ou do adolescente e o rompimento de vínculos”, destaca a especialista.
“A mediação familiar pode agir com mais rapidez para atender às demandas e interesses dos pais parentais em seus conflitos familiares, tão recheados que são de subjetividades e singularidades. Isso tudo com o intuito também de desafogar o Judiciário. Este e suas leis existem para que a Justiça e a paz possam assegurar direitos e responsabilidades da sociedade e das famílias.”
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