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STJ decide que lei não pode retroagir para garantir licença a servidora que adotou criança de 11 anos
Nesta terça-feira, dia 10, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso em mandado de segurança impetrado por servidora estadual comissionada que reclamava o direito a licença-maternidade em razão da adoção de uma criança de 11 anos. Na época da adoção, a legislação vigente garantia esse direito somente até os oito anos.
A servidora argumentou que o limite de idade imposto pela legislação da época era discriminatório. Segundo ela, a legislação previdenciária que manteve a limitação ao gozo da licença em razão da idade do adotando contrariou o objetivo social buscado pelo legislador ao retirar da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) os dispositivos que continham tal discriminação.
O STJ considerou que a lei aplicável é a vigente ao tempo do fato que determinou sua incidência. Segundo o relator do caso, ministro Humberto Martins, a servidora deve observar a regra de escalonamento da licença-maternidade de acordo com a idade da criança, conforme estabelecido no artigo 71-A da Lei 8.213 antes da redação conferida pela Lei 12.873.
A outorga de direitos sociais, segundo o ministro, “deriva da evolução da sociedade e de seu acolhimento na legislação, sendo incorporados de forma paulatina ao ordenamento jurídico”. Segundo ele, uma vez que no momento da adoção não havia lei garantindo licença à servidora, “não há como obrigar a concessão do benefício, por falta de base jurídica, em vista da impossibilidade de retroação”.
Para a advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do IBDFAM, a decisão não observou o melhor interesse da criança e também não atendeu ao princípio constitucional da prioridade absoluta. Ela explica que, no Brasil, a maioria das crianças disponibilizadas à adoção são crianças já maiores, grupos de irmãos e crianças com problemas de saúde, e ao não conceder à adotante em adoção tardia o direito a licença-maternidade, a decisão desconsiderou o sujeito de direito envolvido e desmereceu a adoção tardia, tratando-se, portanto, de um desincentivo a tal modalidade de adoção que, ao contrário, deve ser estimulada.
Aspectos interdisciplinares- Silvana aponta que o processo de adoção envolve aspectos interdisciplinares que devem ser observados, como a adaptação de crianças maiores ao novo núcleo familiar - um processo bem mais complexo para estas crianças do que para crianças menores- sendo indispensável que o adotante participe plenamente deste processo. “Não se pode analisar a adoção sob a ótica pura do direito, sem observar sua interdisciplinaridade e o seu objetivo maior: a criança”.
Ela aponta, ainda, que a lei aplicável deve ser a lei existente e vigente ao tempo do fato, desde que isto não implique em violação dos princípios constitucionais aplicáveis à espécie. “A lei foi alterada para deixar de violar direitos constitucionalmente garantidos, donde o operador do Direito não dever aplicar a lei vigente ao tempo do fato e sim o entendimento doutrinário e jurisprudencial dado a tal lei ao tempo do fato”, reflete.
Teoria legalista x tridimensional- O advogado Hélio Gustavo Alves, presidente da Comissão de Direito Previdenciário do IBDFAM, explica que neste caso o magistrado foi “estritamente legalista”, ou seja, aplicou a lei respeitando o que definiu o legislador à época dos fatos, obedecendo rigorosamente o princípio da seletividade (princípio que seleciona quem tem direito ao benefício). No entanto, atualmente, a teoria legalista não é a mais utilizada pelos cientistas previdenciaristas. “Com a evolução das relações sociais, tais como relação homoafetiva, homens solteiros adotando filhos, realidades essas que não têm a devida proteção legal pelo simples fato da lei ser antiga, logo não ter acompanhado os novos fatos sociais, é que se vem adotando a teoria tridimensional do saudoso Jurista Prof. Dr. Miguel Reale, em que se analisa os fatos e valores para originar a norma”.
A decisão, segundo o advogado, priorizou tão-somente a norma e deixou de lado a realidade atual da sociedade, “algo que ao meu ver -por ser adepto da teoria tridimensional- entendo que é uma das missões do magistrado, quando há falha do legislativo, adaptar a norma às novas relações sociais, ainda mais quando observado que a norma é ultrapassada, prejudicando a evolução social”, disse.
Ele explica, ainda, que a Lei 8.213/91 foi alterada pela Lei nº 12.873, de 2013, excluindo a idade e o prazo de recebimento do salário-maternidade, ou seja, independentementeda idade, todos terão direito aos 120 dias. Atualmente, o INSS amplia o direito a menores de até 12 anos de idade, conforme Instrução Normativa 77/2015, artigo 344. “É cediço que o Brasil tem uma política pública intensa para adoção de menores.Ocorre que a decisão do STJ acaba tendo reflexos negativos nesta campanha, vez que torna público que para mulheres ou homens que tiverem a intenção de adotar menores com mais de 11 anos, a Justiça não irá amparar esta nova família com o benefício do salário-maternidade”, reflete.
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