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17 de maio: especialista reforça importância do Dia Nacional de Combate à Homofobia
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Em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial da Saúde – OMS retirou a homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde – CID. Vinte anos depois, um decreto presidencial incluiu a data no calendário oficial do Brasil como Dia Nacional de Combate à Homofobia.
A trajetória do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM reafirma o compromisso do Instituto na luta por direitos e por respeito à população LGBTI+. Como amicus curiae, o IBDFAM contribuiu com relevantes causas no Supremo Tribunal Federal – STF, como no julgamento que reconheceu a união estável homoafetiva como entidade familiar (ADI 4277 com a ADPF 132), e no julgamento em que a homotransfobia foi reconhecida como crime de racismo (ADO 26 e MI 4333).
De acordo com o advogado Paulo Iotti, que proferiu a sustentação oral nesse último julgamento, a LGBTI+fobia ou homotransfobia abarca a violência física, as ofensas, os discursos de ódio e a discriminação contra pessoas LGBTI+ em razão de sua orientação sexual não heteroafetiva ou identidade de gênero não cisgenera (transgênera).
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“Há o crime de praticar, induzir ou incitar o preconceito e a discriminação por raça no art. 20 da Lei 7.716/1989, que abarca os discursos de ódio em geral, e crimes específicos de discriminação no comércio, no ambiente de trabalho e em outras situações em outros artigos da lei”, esclarece Iotti.
O especialista explica que a ofensa com base na sua orientação sexual ou identidade de gênero configura o crime de injúria racista homotransfóbica, do art. 2-A da Lei 7.716/1989. “A motivação homotransfóbica configura motivo torpe, segundo o STF, então isso agrava as penas de quaisquer crimes.”
Ele exemplifica: “Se alguém danificar meu carro porque me despreza por eu ser gay e isso ficar provado, então a pena do crime de dano será agravada pelo motivo torpe da homofobia. Isso no âmbito penal. Na Justiça Comum Cível, a pessoa ofendida, agredida ou discriminada pode pedir indenização por danos morais – e materiais em caso de prejuízo financeiro também”.
Nos estados e municípios com lei administrativa antidiscriminatória, complementa o advogado, a punição também pode ser via advertência ou multa, conforme a legislação vigente.
Como exemplos de condutas homofóbicas, Iotti cita: “Ofender um gay dizendo que ele não é homem ou seria menos homem que um homem hétero, vincular homossexualidade, bissexualidade ou transgeneridades à pedofilia, assédio sexual ou a doenças mentais, negar atendimento no comércio ou sobretaxar casal do mesmo sexo ou pessoa trans, exigir que pessoas LGBTI+ usem elevador dos fundos (ainda acontece muito, principalmente com pessoas trans), chamar pessoa trans pelo nome civil mesmo ela pedindo para ser chamada pelo nome social (pois isso desrespeita a identidade de gênero dela e lhe causa sofrimento e gera discriminação) etc”.
O especialista afirma que testemunhas do crime de racismo homotransfóbico devem acompanhar a vítima à Delegacia, para fazer Boletim de Ocorrência. “Embora não precise ter testemunhas para ser feito, elas já são ouvidas na Delegacia e isso consta no BO, o que dá força jurídica a essa notícia-crime e, no âmbito pessoal, gera acolhimento e apoio moral a uma pessoa que está em um momento de vulnerabilidades, sofrendo pela violência física ou moral (discriminação etc) que sofreu.”
O advogado destaca que a omissão só é crime em alguns contextos, como omissão de socorro. “Se a pessoa ver uma vítima de violência e for embora mesmo com ela caída, sofrendo, aí sim pode ser punida criminalmente.”
Homotransfobia estrutural
Segundo Paulo Iotti, a homotransfobia é estrutural. “A sociedade difunde valores homotransfóbicos como se fossem ‘naturais’ e ‘corretos’, por isso eles estruturam a sociedade e estão tão internalizados no inconsciente coletivo que as pessoas são homotransfóbicas sem perceber.”
“Obviamente, há casos intencionais, mas muita gente tem atitudes que discriminam sem achar que está discriminando. Por exemplo, quando você não contrata uma pessoa LGBTI+ porque acha que ela pode ter uma ‘influência negativa’ nos seus filhos ou nas suas filhas. Ora, por que isso? Pessoas LGBTI+ são tão normais e tão respeitosas das normas de boa convivência social e das normas de bom senso quanto pessoas cishétero. Ninguém ‘vira LGBTI+’ só por conviver com pessoas LGBTI+ – o que em si já é uma preocupação preconceituosa, que muitos estudos já desmitificaram”, comenta.
Ele acrescenta: “Muita gente ainda tem medo de nós por conta desses estereótipos pejorativos homotransfóbicos que nos desumanizam. Muita gente acha que nós seríamos ‘assediadores/as’ em potencial só por sermos LGBTI+”.
Neste contexto, o advogado reconhece a necessidade de políticas públicas de capacitação e sensibilização da sociedade. “Pessoas LGBTI+ são tão decentes, trabalhadoras, dedicadas, afetuosas e respeitadoras das normas de boa convivência social como pessoas cishétero.”
Ainda conforme o advogado, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou o dever de mapear a homotransfobia para criar políticas públicas de prevenção e repressão dessa violência e de garantia de direitos às pessoas LGBTI+, quando decidiu o caso Azul Rojas vs. Peru, em 2020. Apesar disso, diz que ainda faltam dados oficiais no Brasil.
Estatísticas
Iotti aponta o aumento do índice de violência homotransfóbica contra pessoas LGBTI+ em denúncias de ONGs históricas como o Grupo Gay da Bahia – GGB e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais – ANTRA.
“Até que o Brasil ‘tome vergonha na cara’ e faça essas pesquisas oficiais, que até fez entre 2011 e 2013, com os então chamados ‘Relatórios da Violência Homofóbica’, frutos do Disque 100 LGBT, os dados das ONGs e essas matérias terão que ser aceitas para subsidiar políticas públicas e decisões judiciais de proteção de pessoas LGBTI+”, afirma.
O advogado cita um princípio geral de Direito: ninguém pode se beneficiar da própria torpeza. “O Estado e a parcela da sociedade que não querem fazer essas pesquisas não podem se beneficiar da sua nefasta inércia estruturalmente e por vezes intencionalmente homotransfóbica para negar os dados levantados e trazidos pelos Movimentos Sociais.”
“Se acham que podem fazer pesquisas melhores, e as entidades melhoram ano a ano suas metodologias, que façam, mas até lá, os dados e as matérias em questão produzidas pelas ONGs e pela mídia terão que ser aceitas contra a torpeza homotransfóbica que fica deitada em berço esplêndido para, deliberadamente, nada fazer para proteger pessoas LGBTI+ contra a homotransfobia”, conclui.
Por Débora Anunciação
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