Notícias
Mês de Combate à Alienação Parental: sociedade é responsável por garantir direitos de crianças e adolescentes no contexto familiar
Saúde, educação, lazer, cultura, dignidade, respeito e liberdade são alguns dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes previstos na Constituição Federal. Garanti-los é dever das famílias, da sociedade e do Estado, cujos papéis também é proteger esses indivíduos de toda forma de negligência, discriminação, exploração, crueldade, opressão e violência, entre elas a Alienação Parental. No contexto do Dia Internacional de Combate à Alienação Parental, celebrado em 25 de abril, especialistas do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM explicam como se dão os direitos das crianças e adolescentes no contexto familiar e o quanto a sociedade é responsável por garanti-los.
A advogada Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão Nacional de Adoção do IBDFAM, observa que, nas últimas décadas, crianças e adolescentes têm sido negligenciados diante do acesso quase irrestrito à tecnologia, causando o que ela chama de “alienação tecnológica”. Para ela, isso é fruto da ausência de responsabilidade social no cuidado empreendido pelas famílias.
“Nesse contexto, há uma ausência de cuidado parental, que se traduz em falta de afeto e convivência mesmo que todos e todas residam na mesma casa. Sinto uma falta de afeto nas famílias, algo quase robótico, com pessoas fixadas em telas de diversos tamanhos, sem conversarem entre si. Essa responsabilidade pelos afetos familiares precisa ser debatida, estudada e analisada. Crianças e adolescentes precisam ter convivência parental de qualidade para que se desenvolvam como adultos saudáveis e felizes. Essa responsabilidade é preponderantemente da família”, afirma.
Silvana do Monte Moreira destaca que a prática da alienação parental retira da criança e do adolescente – “únicos sujeitos de direitos, cuja prioridade absoluta deve ser atendida em seu superior interesse” – o direito à convivência familiar com o genitor ou genitora alienado. Dessa forma, está sendo violado o direito à convivência familiar, previsto tanto pela Constituição Federal quanto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/1990).
“Essa prática, lamentavelmente comum, não fere apenas o outro genitor ou genitora não residente. Fere, principalmente o filho ou a filha vítima da alienação, que se vê privado da convivência. A alienação parental, a criação de falsas memórias, as chantagens praticadas pelo alienador ou alienadora causam dores que irão permear a vida desse ser em estágio de desenvolvimento, criando buracos afetivos em sua vida. A alienação parental é uma das piores crueldades praticadas contra crianças e adolescentes”, pontua.
Lugar de afeto
A advogada entende a família como o “locus do afeto”. Ela defende que questões entre os pais têm que ser resolvidas sem que os filhos e filhas sofram. “Somos os adultos da relação e precisamos preservar as crianças e os adolescentes que não são obrigados a lidar com os restos dos nossos afetos. A família extensa, para além do par parental, tem o dever de alertar diante do menor indício de alienação parental, indicando, inclusive, terapia familiar”, aponta.
Vale ressaltar que a alienação parental pode ser exercida por qualquer pessoa com quem a criança tenha residência habitual contra outra que não residente. Nesse bojo, podem estar avós, padrastos, madrastas, irmãos e etc.
“Essa supressão da convivência familiar natural, extensa ou socioafetiva é uma prática absolutamente cruel, que demonstra a falta de capacidade do alienador ou alienadora de exercer a parentalidade responsável de sua prole. Quem pratica alienação parental não ama o sujeito, e sim coisifica o filho ou a filha como arma para ferir o outro ou a outra, sem qualquer preocupação com os danos emocionais e psíquicos que a supressão da convivência familiar causará”, comenta.
Silvana defende que a sociedade não pode se esquivar ao testemunhar atos de alienação parental. “É preciso assumir o que se vê e observa. Essa intervenção, pela criança, é nossa obrigação. Unidades de ensino não podem compactuar com a alienação, não podem privar esse ou aquele genitor ou genitora de participar das festividades escolares, se negar a entregar a agenda ou praticar qualquer tipo de supressão de direitos. Deve, também, comunicar ao Conselho Tutelar se algo fora dos padrões normais do exercício da parentalidade responsável esteja acontecendo com a criança.”
O que diz a lei?
De acordo com a Lei 12.318/2010, a Alienação Parental é a "interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este".
No artigo 3º, a norma determina que a prática “fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda”.
A isso soma-se o artigo 4º, inciso 2, alínea b da Lei 13.431/2017, que estabelece a prática da alienação parental como uma forma de violência e a inclui no sistema de garantias de direitos da criança e do adolescente vítimas ou testemunhas de violência.
“A criança e o adolescente têm direito de conviver com toda a família, o que não se restringe a pai e mãe, também inclui recasamentos, famílias mosaicos, famílias reconstituídas e também a família comunitária, formada por amigos, colegas de escola, vizinhos etc. A Alienação Parental, quando acontece, fere direitos fundamentais constitucionais de crianças e adolescentes como o direito à liberdade e o direito à convivência familiar. A prática induz a criança a não conviver com outra pessoa, então ela está sendo privada de ter afeto, receber cuidado e isso não pode acontecer porque essa criança tem que ser livre para amar e ser amada”, explica Glicia Brazil, psicóloga do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro – TJRJ e vice-presidente da Comissão da Infância e Juventude do IBDFAM.
Para ela, a sociedade também é responsável por garantir esses direitos na medida em que a criança não é propriedade dos pais, mas sim uma responsabilidade de todos. Segundo a especialista, isso garante que a criança seja tratada como um indivíduo e não uma extensão do pai ou da mãe.
“A sociedade, os juízes e a família têm que garantir que a criança conviva com quem é da família dela, ainda que em meio a um conflito enorme ou com pessoas que não se falam e se odeiam. Trata-se de um direito da criança e os pais precisam se resguardar e respeitá-lo. É uma questão de dignidade, a qual a criança tem direito”, avalia.
Rede de atendimento preparada
Glicia observa que a questão da Alienação Parental carece de políticas públicas para que profissionais da rede de atendimento possam compreender o que é a prática. Para ela, muita gente ainda não compreende que se trata de um fenômeno psicológico, ou seja, manipular a mente de uma criança ou adolescente para agir conforme seus próprios interesses.
“Toda a rede de atendimento precisa de formação e capacitação para que as pessoas tomem mais cautela na hora de tomar uma decisão ou na hora de dar uma opinião muitas vezes precipitada quando o assunto é Alienação Parental”, pontua.
“Ainda assim, é fundamental que a sociedade tenha compromisso com suas crianças e adolescentes. A Alienação Parental é um fenômeno psicológico que, ainda que a lei seja revogada ou modificada, ainda não continuar existindo porque sempre existiu. Trata-se de um fenômeno que diz respeito à questão dos conflitos mal resolvidos da conjugalidade. Nesse sentido, todas as esferas da sociedade precisam estar prontas para lidar com o problema”, conclui.
Leia mais: Mês de Combate à Alienação Parental: formas de exercer a parentalidade podem evitar a prática
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br