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Especialista analisa legitimidade dos motivos do genitor sobrevivente e vantagens para o filho gerado post mortem em artigo da Revista Científica do IBDFAM
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"A análise da legitimidade dos motivos do genitor sobrevivente e das vantagens para o filho gerado post mortem em face do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente” é tema do artigo que está entre os destaques da 48ª edição da Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. O texto é de autoria da advogada e professora Patrícia Ferreira Rocha, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Segundo a advogada, a reprodução humana assistida carece de regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro, ainda que o tema não tenha surgido recentemente. A disciplina da matéria consta no aspecto das presunções de paternidade no artigo 1.597 do Código Civil de 2002, e da padronização da emissão de registros de nascimento de filhos gerados por tal procedimento no Provimento nº 63/2017 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Por essa razão, detalha a especialista, as Resoluções do Conselho Federal de Medicina – CFM, mesmo sem caráter e força de lei, acabam sendo utilizadas como referencial interpretativo nos conflitos oriundos da utilização de tais técnicas. “Quanto à reprodução assistida póstuma, o citado dispositivo do Código Civil admite, para fins de presunção de paternidade, a realização de inseminação artificial homóloga, ‘ainda que falecido o marido’, e a utilização de embriões excedentários decorrentes de procedimento homólogo, ‘a qualquer tempo’. Permite-se concluir, nas duas situações, a possibilidade de geração de uma criança após o falecimento de um de seus pais”, avalia a especialista.
“Em que pese a Constituição Federal de 1988, o planejamento familiar é de livre decisão do casal. O exercício do direito de decidir acerca da procriação, especialmente em se tratando de filho póstumo, não se configura num poder absoluto e ilimitado, visto que impõe a responsabilidade individual e social no terreno da parentalidade, como corolário dos princípios da paternidade responsável, da dignidade da pessoa humana dos filhos, da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente”, entende Patricia.
Ela acrescenta: “Um primeiro aspecto relevante a ser considerado diz respeito à viabilidade ou não de se conceber uma criança deliberadamente despojada da figura de um de seus genitores. Afinal, a criança a ser gerada deve ser sempre considerada um sujeito de direitos e não ser simplesmente instrumentalizada para satisfação pessoal dos pais”.
Patricia Ferreira Rocha lembra que a inexistência de limite temporal à utilização de material genético crioconservado possibilita um considerável hiato entre o seu armazenamento e o momento da gestação. Menciona o caso de uma criança concebida por meio de fertilização in vitro usando sêmen congelado por cerca de 21 anos, “o que pode trazer sérios conflitos sucessórios que se perpetuariam no tempo”.
“Por fim, há ainda a possibilidade deste filho póstumo vir a ser perseguido com estrita finalidade econômica, buscando o genitor sobrevivente ‘fabricar possíveis herdeiros’”, avalia a autora.
Instrumentalização do filho póstumo
O artigo defende, como baliza à permissão de utilização do procedimento post mortem, a necessidade de verificação de dois requisitos extraídos, por analogia, do instituto da adoção: “a legitimidade dos motivos dos adotantes, que importaria na análise dos motivos do genitor sobrevivente, e as vantagens para o adotado, que deveria ser examinado sob a perspectiva do filho voluntariamente gerado com material de pai ou mãe falecido(a), o que seria realizado por meio de um estudo psicossocial”.
Patrícia aponta para uma possível instrumentalização do filho póstumo. “Pode acabar sendo visto como um mero continuador do morto, restringindo-se a um papel subalterno na tentativa de preenchimento do luto e de compensar a dor da perda do ente prematuramente morto a qualquer preço”.
Ela cita um caso de 2010, no qual uma família obteve autorização na Justiça para realizar a inseminação artificial post mortem com material armazenado de pessoa em coma e com morte cerebral. “Em depoimento, a noiva falou sobre sua pretensão: ‘você perde a pessoa que você ama, e naquele momento você pode decidir que uma parte dele pode continuar, uma parte de nossos sonhos, o único a que pode ser dada continuidade’.”
“Entendemos que a consciência na tomada de decisões quanto ao projeto parental é indispensável para que as consequências sejam coerentes com as expectativas, pois a liberdade deve estar sempre associada à responsabilidade”, conclui a especialista.
A íntegra deste e de outros textos exclusivos estão disponíveis na 48ª edição da Revista Científica do IBDFAM. A assinatura pode ser feita pelo site ou pelo telefone: (31) 3324-9280.
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br