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Especialista investiga os danos da alienação parental no psiquismo infantil; texto está disponível na Revista Científica do IBDFAM
“Danos da alienação parental no psiquismo infantil: fragmentos da clínica psicanalítica” é tema do artigo de autoria da psicóloga Lenita Pacheco Lemos Duarte, diretora Interdisciplinar da seção Niterói do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que está entre os destaques da 45ª edição da Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. A nova edição da publicação enfoca diferentes olhares sobre a alienação parental. Assine e garanta o seu exemplar para ter acesso ao texto na íntegra.
A autora destaca que o objetivo principal do artigo é revelar os danos da alienação parental e familiar no psiquismo infantil, e ilustrá-los mais adiante, por meio de fragmentos de um caso da clínica psicanalítica, com o título de “O mito do barco pesquisador e da sepultura: o enigma da morte de uma criança”.
Lenita Pacheco lembra que situações de separação ocorrem desde o início da vida nas relações entre pais e filhos, conjugais e interpessoais. “Temos as separações necessárias, inerentes ao próprio desenvolvimento das crianças e adolescentes, assim como as impostas e traumáticas, decorrentes dos afastamentos por divórcios e separações conjugais dos pais, além das causadas por morte.”
“Cada vez mais, os casais se separam e recasam, formando novas configurações familiares, com a criação das parentalidades socioafetivas acrescidas às biológicas. De forma rápida, as crianças e adolescentes precisam acompanhar e participar dos novos laços afetivos dos pais, incluindo outras relações de parentesco, como padrastos e madrastas, enteados, avós, tios e primos”, explica a especialista.
Lenita lembra que essas famílias se tornaram plurais, com outras pessoas que podem ocupar as funções maternas e paternas, independente do laço biológico, onde as relações de afeto têm reconhecimento e valorização jurídica. “E o lugar de autoridade, de quem estabelece os limites para as crianças, acaba se deslocando a partir dessas novas uniões, e sofrendo a influência das mudanças sociais, culturais, econômicas, políticas, e dos avanços da tecnologia e da ciência.”
“As mulheres foram para o mercado de trabalho após a segunda guerra mundial; surgiu o movimento feminista e o advento da pílula, dando mais a independência à mulher; o patriarcalismo começou a perder sua força, e os homens passaram a reivindicar igualdade parental e maior convivência com os filhos junto ao Judiciário. É nesse universo de complexo de conflitos que ocorrem os divórcios e as separações litigiosas, os quais trazem indagações para as áreas jurídica e psicológica, pois provocam variadas mudanças nas relações parentais e familiares”, reconhece a especialista.
A psicóloga ressalta que legalidade e subjetividade estão mutuamente entrelaçadas no Direito das Famílias, conforme se apresentam nas situações de alienação parental. “Na separação ou divórcio litigioso é possível encontrar certa confusão nos vínculos de parentesco e conjugalidade.”
“A união conjugal ou estável pode ser desfeita, mas não se desfaz o vínculo filial. Nos conflitos e impasses conjugais, as crianças ficam na posição de um ‘prêmio’ a ser conquistado nas batalhas entre seus pais e por parte de alguns familiares - quando ocorre o fenômeno da alienação parental. Como consequência, as crianças se mostram inseguras, fragilizadas, e angustiadas, pois são sujeitos vulneráveis, dependentes e alienados aos discursos e atos dos seus pais, ou de substitutos jurídicos”, pondera.
Ela complementa: “E nos contextos em que um dos ex-cônjuges não aceita a separação, apresentando revolta, sentimentos de traição, abandono, culpa e ressentimentos não elaborados, que se intensificam os impasses com sérias dificuldades de relacionamento interpessoal, familiar e intrapsíquico.”
As separações conjugais litigiosas, segundo a especialista, geram vários sentimentos destrutivos envolvendo as crianças, independente da vontade delas, que se tornam “objetos torpedos” para atingir os ex-cônjuges/conviventes, que tendem a intensificar diversos conflitos e disputas quanto à convivência com os filhos.
Alienação parental
A especialista aponta que, nos casos em que as separações e divórcios se transformam em litígios familiares envolvendo as crianças e os adolescentes, estes podem ser usados como “objetos” de vingança, punição e disputa de guarda entre seus pais, “sinalizando o fenômeno da alienação parental, que se caracteriza pela violência psicológica, abuso moral e emocional praticadas por parte do genitor alienador (pai ou mãe), que dificulta ou impede o contato dos filhos com o genitor alienado e seus familiares, denegrindo sua fala, imagem e conduta, ocorrendo de forma consciente ou inconsciente”.
A prática, segundo ela, é frequente nos processos litigiosos, caracterizada como uma ligação de acentuada dependência e submissão do sujeito criança/adolescente ao genitor alienador, que procura afastar e separar, de diversas formas, os filhos do outro genitor, que permanece também alienado aos ditos e atos do alienador. “No contexto litigioso, as críticas e desvalorizações em relação ao ex-cônjuge/conviventes são profundamente perniciosas e frustrantes para os filhos, trazendo-lhes muitas questões conflitantes, pois esses idealizam seus pais, e precisam se identificar com alguns de seus traços e condutas.”
Nessa direção, Lenita questiona: “Como as crianças reagirão frente à figura paterna, constantemente humilhada e depreciada por sua mãe e outros familiares, recebendo qualificações negativas, carregadas de ódio e ressentimento? Ou quando os atos e discursos maternos são recriminados e desvalorizados pelo pai, deixando a criança confusa, quanto aos sentimentos amorosos que ela vivencia junto à mãe?”
Para a psicóloga, tais condutas indicam atos de alienação parental que despertam nos filhos insegurança, dúvidas, oposição, medo, agressividade, ódio e até horror em aproximar-se do genitor alienado. “Essas atitudes em relação ao genitor alienado, foco e objeto de necessidades de punição e vingança por parte do genitor alienador, contribuem para diminuir a autoestima dos filhos e levá-los a apresentar conflitos de lealdade e sentimentos de culpa em outros momentos de sua vida, quando estiverem em condições de avaliar e perceber que as qualificações atribuídas e que foram incutidas em suas mentes, não correspondiam à realidade dos fatos.”
“As crianças e os adolescentes imersos nas discórdias conjugais podem ser nomeados, por exemplo, como ‘moeda de troca, fantoches, marionetes, pombo-correio, ioiô, troféus’, entre outras nomeações”, destaca a especialista, que assegura que o fenômeno também atinge o pai, mãe, avós e outros familiares além dos filhos, “principalmente, quando aqueles ficam muito tempo sem contato, lutando para conseguirem vê-los, em consequência da morosidade na Justiça”.
Dependência e submissão
Como consequência, pais e filhos perdem muito tempo de convivência profícua e enriquecedora que dificilmente pode ser reparado e compensado posteriormente. “Perdendo-se o vínculo afetivo, aqueles se tornam indiferentes, estranhos, rivais ou mesmo inimigos. O jovem alienado também pode evidenciar sentimentos de desconfiança, desamparo, abandono e impotência diante da vida escolar, profissional e amorosa, apresentando sérios sintomas depressivos que podem culminar em suicídios, envolvimento com drogas, conflitos com as leis, entre outras condutas destrutivas.”
“É possível constatar diversos danos da alienação parental no psiquismo infantil, como mostram a angústia e os sintomas por elas apresentados, bem como observar que seus sintomas revelam um saber inconsciente sobre a verdade do par parental. Pautando-me nos estudos de casos, pode-se dizer que os sintomas das crianças também respondem ao litígio familiar”, explica Lenita.
A psicóloga ressalta que, por meio de construções míticas, a criança diz do impossível de dizer, o que escapa ao significante, buscando dessa maneira esvaziar sua angústia. “Ela constrói seu romance familiar, expressando, dessa forma, sua questão neurótica e sua existência como ser sexuado.”
“Os atos de alienação parental provocam sentimentos de dependência e submissão da criança/adolescente ao genitor ‘alienador’; promove o afastamento e a destruição do vínculo afetivo entre o genitor alienado e os filhos; as crianças e adolescentes se tornam vítimas, espectadoras e protagonistas dos conflitos entre os pais: os filhos apresentam conflitos de lealdade, responsabilidade pela separação conjugal dos pais, com sentimentos de culpa, de traição, além de sentimento de abandono e desamparo pelo afastamento de um ou ambos os genitores. E em decorrência desses sentimentos, as crianças/adolescentes expressam angústia e sintomas”, exemplifica.
Como fontes de angústia, ela cita a ameaça de perder o amor dos pais; a separação do objeto de amor e o acúmulo de desejos insatisfeitos gerando sentimentos de abandono e desamparo. “A angústia pode se manifestar através de diversos sintomas, tanto no corpo como no pensamento, tais como: somatizações, tristeza, agressividade, inibições de aprendizagem, dificuldade de relacionamento, fobias, entre outros.”
Em crianças mais novas, o sofrimento e angústia são expressados por meio de histórias, desenhos, dramatizações, jogos e brincadeiras, metáforas e metonímias, onde aparecem as manifestações do inconsciente, como ato falho, chiste, lapso, sonhos e sintomas.
Voz e possibilidade
A diretora Interdisciplinar da seção Niterói do IBDFAM entende que a proteção dos filhos é o foco principal da lei da Alienação Parental, reconhecendo a importância da participação de ambos os lados da família nos cuidados, proteção, deveres e direitos em relação aos filhos. “A prática da alienação parental pelo genitor alienador pode incluir outros familiares, como avós, tios, que busca dificultar e impedir a convivência da criança/adolescente, sujeito vulnerável e dependente, com o(a) genitor(a) alienado(a) e seus familiares.”
Ela esclarece que ambos os pais são importantes para o desenvolvimento psíquico da criança, salvo a presença de impedimentos e outros motivos que venham prejudicá-la, por exemplo, casos de violência física e emocional e abuso sexual. “Observa-se que, além dos pais, outros parentes e alguns operadores do Direito, tomando partido do pai ou da mãe em disputas pela guarda, acabam envolvendo as crianças/adolescentes nos conflitos e litígios parentais, contribuindo para reforçar a alienação parental e familiar, e causar mais sofrimento e sintomas nos filhos.”
Como instrumentos para lidar e enfrentar as situações de alienação parental, muitos genitores, impedidos de conviverem com seus filhos, dispõem da Lei 13.058/2014, da guarda compartilhada, visando à possibilidade de participação conjunta e igualdade parental nas responsabilidades e direitos junto aos filhos. “Esta foi adotada como regra e não mais como alternativa”, comenta Lenita.
Os genitores também dispõem de recursos da Lei 12.318/2010, que prevê penalidades como advertências, multas, inversão da guarda e a perda do poder parental. “Estas últimas penalidades precisam ser observadas e revistas, pois necessitam de avaliações detalhadas e criteriosas por equipes multidisciplinares. Dependendo do caso, são indicados os tratamentos e acompanhamento psicoterapêutico individual e/ou familiar e, às vezes, médico psiquiátrico, em face da gravidade da situação.”
“Apesar do movimento de revogação da Lei da Alienação Parental que vem ocorrendo, é preciso lutar e justificar que esta é fundamental, com as revisões necessárias, para proteger o psiquismo das crianças/adolescentes dos abusos morais, emocionais e violências psicológicas praticadas contra elas”, defende a psicóloga.
Segundo ela, espera-se que com a instituição de leis, sejam minimizados os efeitos negativos da prática da alienação parental. “Além disso, considera-se necessário, juntamente ao acompanhamento psicoterapêutico previsto na respectiva lei, o atendimento e orientação dos responsáveis, pai e mãe ou substitutos, objetivando melhor conscientização e reflexão de seus atos e falas, às vezes de caráter inconsciente, que provocam danos destrutivos no psiquismo infantil.”
“Com o trabalho do psicólogo/psicanalista na função possível de mediador junto aos operadores do Direito e outros profissionais envolvidos, abrem-se novos e promissores caminhos de trabalho multidisciplinar visando à proteção e defesa dos filhos, atendendo ao melhor interesse da criança e do adolescente”, observa a especialista.
Lenita conclui que, nos casos de alienação parental é essencial que o psicólogo/psicanalista, e outros profissionais, que atendam demandas parentais seja capaz de acolher e escutar o sujeito criança/adolescente em sua singularidade, sem querer investigar a versão mais coerente e verdadeira do desentendimento entre seus pais. “O importante é dar a voz e a possibilidade da criança e do adolescente expressarem e comunicarem suas angústias e sentimentos singulares, bem como serem ouvidos acerca da situação em que, necessariamente, estão envolvidos, apostando na sua posição de sujeitos de desejos e de direitos.”
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Leia mais: Alienação parental é tema da 57ª edição da Revista Informativa do IBDFAM, disponível para associados
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