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Atraso na pensão alimentícia, pacto antenupcial e socioafetividade são temas de Enunciados do IBDFAM; envie sua proposta
Está chegando ao fim o prazo para envio de propostas de enunciados para o XIII Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões, que será realizado em outubro. O Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM recebe as proposições até 30 de agosto. Nesta semana, é a vez da advogada Simone Tassinari, membro da Comissão de Enunciados, comentar algumas das diretrizes já aprovadas.
Clique aqui e envie sua proposta de enunciado para o IBDFAM. A participação é exclusiva para membros do Instituto.
Ao todo, o IBDFAM já conta com 36 enunciados, que servem para a criação doutrinária e como referência jurisprudencial no Direito das Famílias e Sucessões. Muitos deles já foram citados e usados como base para importantes decisões de tribunais superiores e deram origem a entendimentos já consolidados no ordenamento jurídico brasileiro.
Diretora nacional do IBDFAM, Simone Tassinari comenta os Enunciados 21, 22, 23, 24 e 25. São orientações sobre parentalidade socioafetiva, divórcio extrajudicial, atraso na pensão alimentícia, pacto antenupcial e o instituto da curatela na vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015). Confira a íntegra da análise:
Enunciado 21 - O reconhecimento voluntário da parentalidade socioafetiva de pessoa que não possua parentalidade registral estabelecida poderá ser realizado diretamente no ofício de registro civil, desde que não haja demanda em curso e independentemente de homologação judicial.
Desde o julgamento do Tema 622 pelo Supremo Tribunal Federal – STF, muitas questões atinentes ao reconhecimento de parentalidade sofreram alterações. Com a tese “A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”, o STF abriu os olhos da população brasileira para realidades não convencionais e tutelou juridicamente famílias fáticas efetivamente constituídas.
Na esteira dessa decisão, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ publicou dois provimentos relacionados ao tema: o Provimento 63 e o 83. Uma dúvida que poderia ter restado seria a possibilidade de reconhecer voluntariamente os filhos, na pendência de demanda judicial. Entretanto, o Enunciado 21 deixa claro que será necessário eleger a via adequada ao reconhecimento.
Se houver consenso, pessoa com mais de 12 anos, elementos relacionados à posse do estado de filiação (nome, tratamento, fama), passíveis de serem comprovados perante o registro civil podem utilizar esta via. Entretanto, se algum destes elementos não estiver presente, a via deverá ser a judicial. O reconhecimento extrajudicial não pode ser “meio” para a prova judicial. São esferas autônomas de conhecimento, portanto, na pendência de ação cujo objeto seja este, não se pode reconhecer extrajudicialmente. Se os elementos estiverem presentes para o extrajudicial, o ideal seria a desistência da ação e a migração para a outra esfera de conhecimento.
Enunciado 22 - É possível a utilização da via extrajudicial para o divórcio e dissolução da união estável, nos termos do artigo 733, do CPC/15 se, havendo consenso entre as partes, inexistir nascituro e as questões relativas às crianças e adolescentes e aos filhos não emancipados e curatelados (como guarda, convivência familiar e alimento) já tiverem definição na via judicial.
A Lei 11.441/2007 possibilitou a realização do divórcio na via extrajudicial. Em uma leitura ampliada, a própria união estável ganha autorização, por equidade. Para isso, exigiu consenso, presença de profissional da advocacia e ausência de interesse jurídico das pessoas indicadas no Enunciado 22 do IBDFAM.
De 2007 para os dias atuais, procurou-se investigar a ratio da vedação de processamento extrajudicial, com a presença destes, cuja vulnerabilidade exige atuação ministerial. Com razão, a simples presença de pessoas com essa circunstância não poderia vedar o processamento do pedido de divórcio, pois a existência pura e simples de filhos, nascituros, crianças, adolescentes, não emancipados, ou curatelados por si, não gera impedimento de processamento.
O telos normativo é construído no sentido de que os interesses juridicamente protegidos destes exige atuação judicial, com fiscalização do Ministério Público. Logo, demanda que verse apenas sobre interesses relacionados à conjugalidades (casamento, união estável), não encontra vedação legal.
Ao contrário, a possibilidade destacada no Enunciado 22 do IBDFAM vem a autorizar que se leve a conhecimento judicial todas as questões relacionadas aos vulneráveis, cuja atuação protetiva decorre do texto constitucional e que, disciplinadas estas na via judicial, possa-se levar os interesses das conjugalidades, em apartado, para a via extrajudicial.
Cumprem-se os ditames protetivos exigidos pelo princípio da prioridade absoluta e respeita-se a autonomia privada dos adultos, maiores e capazes, que desejam ver suas questões decididas em ambiente de construção de consensos.
Enunciado 23 - Havendo atraso ou não pagamento da verba alimentar e indícios de que o devedor dispõe de recursos econômicos, o juiz cientificará ao Ministério Público para apurar a prática do crime de abandono material.
Um dos maiores desafios da contemporaneidade diz respeito ao adimplemento do essencial à mantença da vida, na forma de alimentos. Bem se sabe que o cumprimento de sentença e execução de verbas alimentares constitui-se em um verdadeiro calvário ao alimentado. Sob o prisma da proteção da dignidade dos devedores, tem-se exigido passar pelas restrições menos gravosas antes de exigir alguma das medidas coercitivas atípicas (inciso IV do artigo 139 do CPC). Há decisões que entendem que inserir o nome do devedor em cadastros restritivos de crédito, ou mesmo constringir a licença para dirigir são meios muito gravosos. (Parecer nº 449/2018 – SFCONST/PGR, Sistema Único n.º 291148/2018 - Raquel Elias Ferreira Dodge)
Infelizmente – para quem como eu, entende que as medidas do Direito Criminal são última ratio – a ameaça efetiva de prisão tem sido a única modalidade com eficácia para se chegar ao crédito. Aqui a pesquisadora entra em rota de colisão com a advogada!
Entretanto, há de se considerar que na existência de indícios de disponibilidade econômica, aferível pela Teoria da Aparência e do Estilo de Vida, há de investigar a possibilidade da existência do crime de abandono material. Já se tem pesquisa científica que comprova que as famílias monoparentais estão na qualidade de superendividadas (pesquisa conduzida pela Professora Cláudia Lima Marques em parceria com o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS). E, considerando-se a escusa indevida no adimplemento da pensão, talvez a investigação criminal possa ser um forte agente motivador de adimplemento.
De outro lado, cabe aos profissionais da advocacia refletir sobre o ônus excessivo imposto a quem tem o alimentado em sua companhia. Uma opção ousada, mas talvez, efetiva, possa ser a ordem judicial de sub-rogação do credor dos alimentos nos créditos pré-aprovados em contas-correntes bancárias e até mesmo nos limites de cartões de crédito.
Os contratos de contas-correntes em instituições financeiras contam com a anuência dos titulares para a existência de limites – com tarifas pré-aprovadas que visam a lhes assegurar existência em eventual situação emergencial. Há anuência dos titulares para a existência deste recurso, pois sem sua anuência, retiram-se as condições de crédito em cheque especial e limites no cartão.
Há, então, um crédito contratado previamente, já deferido e pré-aprovado pelas instituições financeiras. O débito alimentar constitui-se em crédito extremamente privilegiado, por força de lei. Ora, mediante autorização judicial, uma simples autorização de sub-rogação de créditos, mediante a instituição financeira (banco ou operadora de cartão), torna a dívida alimentar adimplida e o antigo devedor dos alimentos agora converte-se em devedor para a instituição financeira com a qual já havia pré-contratado o crédito. O crédito privilegiado de alimentos, converte-se em dívida quirografária (menos onerosa em qualidade para o devedor).
Por quais motivos quem tem os alimentados em sua companhia precisam estar sozinhas na condição de superendividadas, enquanto o devedor dos próprios alimentos já contratou e tem para si créditos aprovados? (Utiliza-se a flexão de gênero uma vez que os dados apontam feminilização desta função e implicações familiares específicas a isso relacionadas.)
Assim, além da possibilidade jurídica de investigação relacionada ao crime de abandono material, propõe-se sub-rogação especial de créditos, mediante autorização judicial.
Enunciado 24 - Em pacto antenupcial ou contrato de convivência podem ser celebrados negócios jurídicos processuais.
Uma das grandes inovações da legislação processual em vigor é possibilidade da celebração do que vem sendo chamado de convenções processuais, ou negócios jurídicos processuais. (artigo 190 do Código de Processo Civil – CPC) Os pactos antenupciais ou contratos de convivência podem fazer uso deste instrumento para disciplinar questões muito significativas da vida familiar.
As partes podem eleger regras de processamento em caso de falecimento de um dos membros, escolher métodos autocompositivos de solução de controvérsias, como por exemplo a mediação e até mesmo a arbitragem, para os direitos patrimoniais disponíveis.
Podem as partes renunciar antecipadamente os prazos recursais, indicar rol de bens que ingressarão em futura partilha, ou excluí-los, podem indicar a posse específica de bens certos e determinados, em face da necessidade, podem indicar a modalidade de avaliação dos bens, dentre outros. Há uma infinidade de possibilidades de consensos possíveis no momento da constituição familiar.
Enunciado 25 - Depende de ação judicial o levantamento da curatela de pessoa interditada antes da vigência do Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Sem dúvidas, a Lei Brasileira de Inclusão trouxe uma verdadeira virada de Copérnico para o sistema de capacidades brasileiro. Na mudança do modelo médico para o modelo social acaba por exigir um sistema de apoios em que a curatela passa a ser medida excepcional e não desejada.
Uma das grandes dúvidas que se tinha desde sua entrada em vigor, relacionava-se com a possibilidade de levantamento das curatelas previamente constituídas, pois como se trata de alteração de “estado” pessoal, em regra, a vigência legislativa é imediata.
Entretanto, para fins de adaptação do sistema jurídico aos novos contornos exigidos pela Lei, importante se faz a análise da situação concreta de cada uma das pessoas anteriormente curateladas. Pensar em levantamento de todas as curatelas pelo simples fato da alteração legislativa, pode acabar por trazer prejuízos às pessoas que necessitam de efetiva proteção.
Assim, na proposta do Enunciado 25, a revisão judicial deve ter por finalidade a compatibilização da autonomia e da proteção de quem efetivamente não consegue exprimir vontade.
Envie sua proposta de enunciado até 30 de agosto
O envio das propostas de enunciados à coordenação deverá ser realizado até 30 de agosto. A sugestão deve ser feita em frases curtas, com breve justificativa apontando a referência normativa em questão. O envio pode ser feito pelo site oficial e também pelo e-mail enunciados@ibdfam.org.br.
De 31 de agosto a 30 de setembro, a Comissão de Enunciados do IBDFAM vai sistematizar as propostas recebidas. O período de votação será de 4 a 11 de outubro. A divulgação dos aprovados será durante o XIII Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões do IBDFAM.
O evento será realizado nos dias 27, 28 e 29 de outubro. Por conta da pandemia da Covid-19, a programação será on-line. O tema “Prospecções sobre o presente e o futuro” perpassa todas as palestras, cuja relação já foi divulgada. O evento contará com uma homenagem ao jurista Zeno Veloso.
As inscrições estão abertas, mas as vagas são limitadas. Clique aqui e garanta já a sua participação.
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br