Notícias
PGJ recorre de decisão que negou medida protetiva a mulher trans
A Procuradoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo recorreu ao Superior Tribunal de Justiça – STJ para anular o julgamento do colegiado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP e conceder, com urgência, medida protetiva à mulher trans que teve o pedido negado pelo Colegiado.
A 10ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo havia declarado que a Lei Maria da Penha (11.340/2006) não se aplica a pessoa transexual, negando assim a vigência do artigo 5º, que deixa claro que a norma abrange as hipóteses de violência cometida com base no gênero, e não no sexo biológico.
No caso em questão, a mulher alegou ter sofrido agressões do próprio pai, constatadas por autoridade policial, e buscou o Judiciário para obter uma medida protetiva. O TJSP, no entanto, julgou se ela podia ou não ser considerada mulher para ter direito à proteção, e negou o recurso por maioria de votos.
O relator do caso no TJSP alegou que os Princípios de Yogyakarta estabeleceram vários direitos considerados de nível constitucional e inalienáveis. "Todos esses direitos e obrigações são devidos; e, repito, ninguém (de bom senso, é claro) discordará disso. Porém, nenhum deles dá ao transgênero masculino o direito de ser considerado mulher; nenhum, para colocar de outra forma, autoriza a afirmativa de que 'transgênero feminino = mulher' e 'transgênero masculino = homem'", escreveu em seu voto.
Lei Maria da Penha se baseia em gênero
No recurso apresentado ao STJ, a PGJ destaca que o artigo 5º da Lei Maria da Penha explica que a violência doméstica ou familiar contra a mulher é "qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial", mas o TJSP "encapsulou-se em um universo bastante restrito" quando disse que a expressão "gênero" faz referência apenas ao sexo biológico feminino. "Nisso reside o equívoco, diante do afastamento da proteção integral e eficiente, sempre e incansavelmente buscada pela Lei Maria da Penha."
A PGJ defende que o artigo 5º foi redigido de modo a não deixar dúvidas de que a lei se aplica à violência baseada em gênero, não em sexo. Assim, ao afirmar que "a equiparação do interessado a mulher (e a esta está vinculado o pedido) ofende o princípio da tipicidade estrita e o da proibição da analogia in malam partem", o TJSP negou a vigência da própria lei. “Não se tratava de fazer analogia, e, sim, apenas de aplicar o texto da lei, que é claro.”
O recurso reúne ainda precedentes das cortes superiores, como a decisão do Supremo Tribunal Federal – STF que permitiu a mudança de nome e gênero no registro civil independente da comprovação de cirurgia de redesignação de sexo (ADI 4.275 e RE 670.422); do próprio STJ, que tinha concluído que a identidade psicossocial deveria prevalecer em relação à identidade biológica; e do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, que definiu que cotas de candidatos das agremiações políticas seriam definidas pelo gênero, e não pelo sexo.
A petição ainda lembra que a Câmara Especial do TJSP, diante de conflito de competência suscitado em caso de mulher trans agredida pelo companheiro, decidiu que o processo deveria tramitar na Vara do Foro Central de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Capital.
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br