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Acompanhamento psicossocial de crianças e jovens após adoção é proposto na Câmara; especialista opina

O Projeto de Lei 5.000/2020, apresentado pela deputada Rejane Dias (PT-PI) à Câmara dos Deputados, inclui, no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/1990), a previsão de exames periódicos psicossociais em crianças e adolescentes adotados. O objetivo é garantir o bem-estar e o pleno exercício de seus direitos junto às famílias.
De acordo com a proposta, os adotados deverão ser submetidos – a cada seis meses durante dois anos – a estudos com o objetivo de avaliar o efetivo atendimento de seus interesses. O prazo será contado a partir da sentença definitiva de adoção. Se aprovada, a medida valerá para crianças e para jovens de até 21 anos de idade.
“Depois que a criança ou o adolescente for morar com a nova família, é importante ter um acompanhamento psicológico, visando a analisar o adotado e o adotante por meio de métodos e técnicas para tornar o processo mais humano e proporcionar uma melhor comunicação entre todos os envolvidos”, defendeu Rejane Dias.
Diferenciação entre filhos adotivos e biológicos
Presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Silvana do Monte Moreira diverge do texto do PL 5.000/2020. Ela lembra que o artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição Federal assegura os mesmos direitos e qualificações entre filhos naturais e adotivos, vedando qualquer forma de discriminação.
“O cuidado é a base para a solidificação de relações parentais sejam elas mono, hétero, homo ou transparentais. Filhos são iguais, mas com demandas diferentes. Antes de perguntar o que se faz com seu filho adotivo, pergunte-se o que você fará com seu filho, sem adjetivos. O cuidado tem que ser exercido de igual forma”, opina Silvana.
Ela observa que a juventude traz especificidades, com uma “verdadeira ebulição” de sentimentos, e cabe aos adultos saber lidar com essa fase de seus filhos, com amor, carinho, compreensão e maturidade. “Adolescentes adotivos dão mais trabalho, têm tendências a serem mais complicados? Lembre-se da sua própria adolescência e pergunte-se se ela foi fácil para seus cuidadores. A minha não foi, posso asseverar isso. Dei trabalho, e muito, dava ‘ruim’ sempre, como dizem os adolescentes de hoje”, argumenta.
Entraves na legislação
Além disso, se aprovada, a norma encontrará dificuldade em ser cumprida. “As varas da infância e da juventude não têm profissionais, psicólogos e assistentes sociais, para atender as demandas atuais. Estão todos assoberbados e não dão conta, no tempo necessário, dos procedimentos em curso”, informa Silvana.
Ela explica que a adoção tem duração máxima de 120 dias, de acordo com determinação do artigo 47, parágrafo 10, do ECA. “Esse é o prazo máximo para conclusão da ação de adoção, prorrogável uma única vez por igual período, mediante decisão fundamentada da autoridade judiciária”, detalha.
O Provimento 36/2014 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que dispõe sobre a estrutura e procedimentos das varas da infância e juventude, também segue sem efetividade, segundo a advogada: “Seis anos depois de ser lançado como a redenção dos processos da área, até hoje não foi cumprido e, temo, jamais o será”.
Também por tal razão, ela prevê que o PL 5.000/2020, se aprovado, não logrará êxito. “Aumentar a carga de trabalho das equipes interdisciplinares só seria exequível se devidamente equipadas com pessoal qualificado às respectivas varas da infância”, avalia Silvana.
Grupos de apoio à adoção podem auxiliar na adaptação
Pelo projeto Pós-natal da Adoção, Silvana do Monte Moreira recebeu menção honrosa no Prêmio Innovare, em 2015. A ação foi desenvolvida com as psicólogas Elizabeth Capistrano, Mariana Weis e Maira Medina, do Grupo Singularizando. O objetivo é promover o acompanhamento de crianças e adolescentes após a adoção, suprindo uma lacuna do Poder Judiciário.
A iniciativa nasceu da percepção de que, após a concessão da guarda, as famílias não têm monitoramento ou orientação, sem apoio necessário para a adaptação. “O trabalho é desenvolvido pela sociedade civil, pelos grupos de apoio à adoção, que entram nesse trabalho voluntário e vocacionado. Filhos, todos eles, têm os mesmos direitos e deveres, sem diferenciação em função da origem”, destaca Silvana.
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