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CNJ vai investigar conduta de juiz em caso sobre "estupro culposo", que causou manifestações de indignação e repúdio
Em setembro, o empresário André de Camargo Aranha, acusado de estuprar a promoter e influenciadora digital Mariana Ferrer durante uma festa em 2018, foi considerado inocente pela Justiça de Santa Catarina. Segundo informações do site The Intercept Brasil, o promotor de justiça responsável pelo caso alegou “estupro culposo”, tipo penal inexistente no ordenamento jurídico brasileiro, mas acatado pelo juiz.
Outros detalhes do processo, divulgados nesta terça-feira (3), causaram indignação nas redes sociais. A mesma reportagem do The Intercept Brasil denunciou, por meio de vídeos, as humilhações contra a promoter catarinense, que ocorreram por diversas vezes durante audiência.
Diante da repercussão do caso, o Senado Federal aprovou voto de repúdio ao advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, ao juiz Rudson Marcos, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC, e ao promotor Thiago Carriço, por suas ações no julgamento. A Corregedoria Nacional de Justiça, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, instaurou expediente para apurar a conduta do magistrado.
A tese de “estupro culposo” também foi repudiada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – MMFDH, que, em nota, afirmou que “acompanhará recurso já interposto pela denunciante em segundo grau, confiando nas instâncias superiores”.
Promoter foi alvo de humilhações durante audiência
A defesa do acusado mostrou cópias de fotos sensuais produzidas pela jovem enquanto modelo profissional como forma de reforçar o argumento de que a relação teria sido consensual. O advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho definiu as imagens como “ginecológicas” e afirmou que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana.
Ele classificou o choro da jovem, durante a audiência, como “dissimulado, falso” e “lábia de crocodilo”. A moça “implorou por respeito”, literalmente, ao juiz, que não se opôs às humilhações praticadas pelo advogado. O processo também foi marcado por troca de delegados e promotores, sumiço de imagens e mudança na versão do acusado, de acordo com o The Intercept Brasil.
Ainda segundo o site de notícias, o promotor de justiça Thiago Carriço de Oliveira pediu, e o juiz aceitou, a absolvição de Aranha pelo fato de ele ter cometido “estupro culposo”. A tese é de que não havia como o empresário saber, durante o ato sexual, que a jovem não estava em condições de consentir a relação, não existindo portanto “intenção de estuprar”.
MPSC nega alegação de “estupro culposo” pelo promotor de justiça
Em nota, o Ministério Público de Santa Catarina – MPSC afirmou que “não é verdadeira a informação de que o promotor de justiça manifestou-se pela absolvição de réu por ter cometido estupro culposo”. O MPSC também garantiu que Oliveira interveio em favor da vítima em ocasiões, contra a conduta do advogado, o que não consta do trecho do vídeo divulgado.
“A 23ª Promotoria de Justiça da Capital, que atuou no caso, reafirma que combate de forma rigorosa a prática de atos de violência ou abuso sexual, tanto é que ofereceu denúncia criminal em busca da formação de elementos de prova em prol da verdade. Todavia, no caso concreto, após a produção de inúmeras provas, não foi possível a comprovação da prática de crime por parte do acusado”, diz a nota do MPSC. Leia na íntegra.
A absolvição de André de Camargo Aranha teve como base o princípio in dubio pro reo, por entender que a acusação de estupro só foi baseada nos relatos de Mariana e sua mãe. Para o juiz, não ficou provado que a influencer estava alcoolizada ou sob efeito de droga a ponto de ser considerada vulnerável e não consentir com o ato sexual por não ter capacidade de oferecer resistência.
Em sua sentença, o magistrado destacou que, para a configuração do estupro de vulnerável, é necessário que a vítima não tenha condições físicas ou psicológicas de oferecer resistência à investida sexual e que haja dolo na conduta do agressor e ciência da vulnerabilidade do alvo. Contudo, exames de alcoolemia e toxicológico apresentaram resultado negativo.
“Não existe estupro culposo”: a repercussão do caso
Os trechos da audiência divulgados pelo The Intercept Brasil causaram indignação em todo o país. Por meio das redes sociais, internautas prestaram solidariedade a Mariana Ferrer e pediram a devida apuração do caso. O entendimento de que “Não existe estupro culposo” foi compartilhado por milhões de pessoas ao longo desta terça-feira.
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal – STF, se manifestou no Twitter: “As cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras. O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”.
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