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Projeto de lei criminaliza perseguição ou stalking e visa combate à violência contra a mulher
O seriado “Você”, lançado em 2019, pela plataforma de streaming Netflix, conta a história de Guinevere Beck (Elizabeth Lail), uma aspirante a escritora, que vê sua vida mudar completamente ao entrar em uma livraria no East Village, onde conhece o charmoso gerente, Joe Goldberg (Penn Badgley). O que a jovem não imagina é que Joe é um stalker e vai persegui-la para saber todas as suas preferências, seus hábitos e relacionamentos, até envolvê-la romanticamente.
A série foi um enorme sucesso e o personagem perseguidor passou a ser considerado o “homem ideal” e “homem dos sonhos” por jovens ao redor do mundo, o que dividiu opiniões nas redes sociais. Sobre a polêmica, o ator Penn Badgley se pronunciou, alertando que o personagem era um criminoso e aquele não é um tipo de relação saudável. Mesmo assim, “Você” foi renovada e já conta com duas temporadas.
No Brasil, perseguir uma pessoa poderá virar crime em breve. O Projeto de Lei 4411/20, insere no Código Penal o crime de perseguição ou stalking. Pela proposta, o ato de perseguir ou importunar de modo frequente outra pessoa, por qualquer meio, direta ou indiretamente, de forma a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade, será punido com detenção de 6 meses a 3 anos, ou multa.
O texto prevê também a aplicação das penas acessórias de proibição de contato com a vítima pelo período de 6 meses a 3 anos e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção de condutas típicas da perseguição.
Autora da proposta, a deputada Elcione Barbalho (MDB-PA) ressalta que a imensa maioria das vítimas de assédio persistente são mulheres e que a prática ocorre usualmente no contexto de uma prévia relação de intimidade entre autor e vítima, como no caso de término de relacionamento amoroso.
Atualmente, a perseguição não é crime, e sim uma contravenção. A Lei de Contravenções Penais prevê pena de prisão simples de 15 dias a dois meses, mais multa, para o ato de “molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável”.
Também é possível punir, conforme o Código Penal, o ato de ameaçar alguém, por palavra, escrito, gesto ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave, com detenção de um a seis meses, ou multa.
Reforço ao combate da violência contra as mulheres
A professora Alice Birchal, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, analisou o projeto e destacou que qualquer proposta no sentido que denota que a Câmara e o Senado estão preocupados com a questão da violência contra a mulher já é um passo enorme. Porém, é preciso entender que a sanção punitiva da prisão nem sempre é o único e eficaz método de se combater esses casos.
“Nós temos outros métodos alternativos que têm, às vezes, muito mais frutificação e resultado no entendimento social do que é a violência contra a mulher nos seus diversos níveis”, enfatiza.
Esse tipo de projeto acabam por reafirmar a condição punitiva do Código Penal, mas para esses homens que praticam esses crimes, ficar na cadeia não é a solução. “Nem sempre na sanção penal o homem vai conseguir enxergar o que é o seu machismo estrutural, que o faz olhar para a mulher como objeto de seu desejo que ele pode olhar e importunar o tempo todo”, diz a professora.
Problema estrutural
O fato de a mulher ser vista como um produto não é de hoje, mas algo que foi carregado com a sociedade durante os séculos. Assim, a figura feminina na sociedade precisa ser bonita, atraente e vista como objeto sexual para, de certa forma, ser aceita.
“A mulher não é vista, por alguns, como o homem na mesma função. Se o homem está ali profissionalmente, ele não está ali para seduzir ninguém, e sim fazer o seu trabalho. Se a mulher está ali, sempre tem uma visão como se ela estivesse ali para seduzir. Isso acontece porque durante os séculos a mulher foi objetificada”, explica.
Desta maneira, a melhor maneira de combater essa visão deturpada, além de criar sanções para coibir práticas violentas, é investir em educação para mudar a maneira como a sociedade enxerga a mulher. “Isso precisa ser mudado, tanto com relação ao pensamento do homem quanto o pensamento da mulher. É necessário entendermos que nós somos profissionais nos ambientes de trabalho, e que nas relações pessoais, quando nós quisermos, até poderemos ser objeto, como o homem também pode ser em uma relação amorosa saudável”, conclui Alice Birchal.
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