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A utilização da Justiça Restaurativa no enfrentamento da violência doméstica
A pedido da Ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a aplicação da Justiça Restaurativa deverá contribuir na resolução de casos de violência doméstica. Ainda utilizada em poucos tribunais, o intuito da técnica é viabilizar a recomposição das famílias, sobretudo nas situações que envolvem crianças. Oficinas temáticas de reflexão são realizadas junto aos ofensores e às vítimas, que, posteriormente, têm seus conflitos tratados em Círculos Restaurativos. O trabalho tem duração média de duas horas.
Incentivado pelo CNJ, o método visa a reparação dos danos, o atendimento das necessidades da vítima e a responsabilização do ofensor, no intuito de pacificar as relações sociais. Quando utilizada em crimes graves, a Justiça Restaurativa não exclui o sistema criminal, mantendo, portanto, a pena aplicada ao agressor. Importante salientar também, que a técnica pode ocorrer na fase anterior à acusação, antes do processo e, ainda, na etapa em juízo (antes do julgamento ou durante o tempo da sentença). Além disso, pode ser uma alternativa à prisão ou fazer parte da condenação.
Na opinião de Adélia Moreira Pessoa, presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), é válida a utilização da Justiça Restaurativa como método alternativo e complementar à Justiça Tradicional. Porém, a advogada alerta: “Importante frisar, entretanto, não poder substituir a prestação jurisdicional das Varas Criminais ou Especializadas em violência doméstica, nem possibilitar a impunidade ao agressor”. Ela destaca que a aplicação da técnica possibilita o diálogo, bem como o reconhecimento e a responsabilização dos atos praticados pelo autor da agressão.
“De maneira incipiente, podemos registrar a existência de grupos reflexivos [com o agressor] em alguns estados, mostrando a eficácia destas intervenções psicossociais, na menor reincidência naqueles que participaram dessas sessões. [A Justiça Restaurativa] Tem sido um bom método de resolução de conflitos, restaurando o diálogo entre as partes. Nem sempre é eficaz, entretanto”, afirma Adélia. Ainda de acordo com ela, quando se trata de conduta sujeita à Ação Pública Incondicionada (casos em que a instauração do processo penal independe da vontade da vítima), a Justiça Restaurativa deve ser aplicada de maneira complementar, mesmo que o autor da violência tenha sido preso provisoriamente ou, após a sentença, condenado à prisão.
Brecha para a impunidade?
Não obstante à valorização do diálogo e à recomposição familiar, Adélia Moreira Pessoa acredita que a Justiça Restaurativa não vislumbra impunidade. Entretanto, esse risco só é eliminado quando respeitadas as seguintes diretrizes: “Aplicação adequada da técnica, com profissionais capacitados, em formação continuada, sob o acompanhamento do Poder Judiciário e do Ministério Público, de maneira complementar ao processo penal tradicional”, comenta a advogada. “O restabelecimento do respeito entre as partes envolvidas nas relações familiares - ou mesmo se ocorrer a restauração da relação dos laços entre as partes - não significa a extinção da punibilidade, quando tratar-se de crime de ação pública incondicionada”, completa.
Desconstrução da “naturalização” da violência contra a mulher
Adélia Moreira Pessoa acredita que a Justiça Restaurativa contribuirá para desconstruir mitos e estereótipos que, de acordo com ela, permeiam nossa sociedade: “Vale observar que, muitas vezes, agressões são justificadas com base nesses mitos, as quais são atribuídas ao comportamento provocativo e sedutor da mulher. Todos nós conhecemos frases do tipo: ‘Mereceu o abuso’, ‘você não sabia que ela era assim?!’, ‘isso é normal’, ‘foi assim comigo, mas eu suportei’”.
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