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Magistrado considera cadela criatura senciente e declina competência sobre processo de posse para vara de família
Tendência é mundial, afirma especialista
Os animais de estimação já estão por merecer tratamento jurídico distinto daquele conferido a um simples objeto. Com esse entendimento, o juiz Leandro Katscharowski Aguiar, titular da 7ª Vara Cível de Joinville (SC), declinou competência em favor de uma das varas de família daquela unidade jurisdicional, sobre processo que discute a posse e propriedade de uma cadelinha de nome "Linda" entre casal recém-separado.
“Penso que a questão de fundo versa, necessariamente, sobre a declaração, ainda que incidental, da posse e propriedade do animal, cuja discussão, por sua vez, envolve o direito de família", disse o magistrado em sua decisão. Ele considerou que os magistrados das varas de família são mais “sensíveis” à questão.
"Quem sabe se valendo da concepção, ainda restrita ao campo acadêmico, mas que timidamente começa a aparecer na jurisprudência, que considera os animais, em especial mamíferos e aves, seres sencientes, dotados de certa consciência", concluiu.
“Independente do contexto da disputa (econômico ou afetivo), se o litígio tiver sua gênese em um término relacional, a competência deverá ser da vara de família”, afirma a advogada Marianna Chaves, diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
Segundo ela, considerando a situação hipotética em que após a dissolução conjugal um ex-casal não entra em acordo sobre quem ficará com a matriz da criação de cães que possuem, a questão deve ser resolvida na partilha e deverá respeitar a natureza do animal. “Sendo o animal um ‘bem indivisível’, não faria qualquer sentido o juiz determinar uma venda judicial e a repartição do produto pelos dois”, conta. Por outro lado, na hipótese de uma disputa da companhia do animal, nos moldes de um litígio de guarda de filhos, também deverá ser resolvido nas varas de família, “adaptando-se as regras aplicáveis ao direito de convivência com a prole”.
Para ela, a decisão revela a sensibilidade da magistratura brasileira. “O juiz de Joinville, a exemplo dos magistrados de Jacareí e do Rio de Janeiro, onde já temos precedentes, materializou uma realidade que por vezes, esquecemos: o Direito existe para a vida. Fugiu do dogmatismo conduzido pela leitura estrita da lei e se aproximou à vivência social”, diz.
Segundo ela, os precedentes conhecidos, nesse sentido, são de decisões nos EUA. Mas a tendência em se considerar os animais como seres sencientes é mundial. “Com esse avançar da nossa jurisprudência - que reflete como os animais são vistos na sociedade e no seio familiar - penso que estamos maduros e chegou a hora de pensarmos sobre a elaboração de um estatuto jurídico do animal de companhia, com elementos do Direito Ambiental, Direito Constitucional, Direito das Obrigações e, claro, Direito das Famílias, tendo como base um princípio orientador: o melhor interesse do animal”, reflete.
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