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TRF3 concede visto a estrangeiro que mantém união homoafetiva com brasileiro
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou decisão da 2ª Vara Federal Cível de São Paulo, que autorizou a concessão de visto de permanência em território brasileiro a estrangeiro que mantém, há mais de dois anos, relação homoafetiva com um brasileiro.
A sentença de 1º grau julgou procedente o pedido, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, e declarado a existência do direito do casal de receber o mesmo tratamento oferecido aos casais heterossexuais. Entretanto, a União apelou da decisão alegando que o artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal, seria uma barreira insuperável para que a situação descrita nos autos se iguale ao instituto da família. Além disso, foi argumentado que a Lei 6.815/80, que define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, não ampara a pretensão dos autores, pois não haveria na Lei a possibilidade de concessão do visto pelo fato do estabelecimento de uma convivência, sendo que o próprio Estatuto do Estrangeiro exige que tenha havido a celebração de casamento há mais de cinco anos.
A desembargadora federal e relatora do acórdão, Marli Ferreira, afirmou que os casos de associação entre pessoas do mesmo sexo, estas que possuem os mesmos propósitos de vida e mantêm o respeito e afeto mútuos, devem ser considerados nas hipóteses em que possa dessa convivência resultar direitos para um dos parceiros. Ela relembrou que, em 2007, decidiu de forma inovadora que o companheiro de união homoafetiva tinha direito de receber a pensão do falecido, servidor do TRF3.
Marli Ferreira declarou que se o que importa é a certeza de que essa convivência é permanente, nada impede que assim seja reconhecido o direito deste estrangeiro, que não tem união estável ou mesmo família, nos termos da Carta Maior, mas tem uma união reconhecida pela sociedade onde vive e trabalha, como provam os depoimentos testemunhais, de receber o visto de permanência. A desembargadora ainda apontou que embora o Estatuto do Estrangeiro não tenha previsão para o caso, a Resolução Normativa 77/2008 estabeleceu que a concessão de visto permanente, ou autorização de permanência, é deferida ao companheiro ou companheira, sem distinção de sexo.
Para a advogada Patrícia Gorisch, presidente da Comissão Nacional de Direito Homoafetivo do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a decisão é bastante importante, já que proporciona segurança aos estrangeiros em união estável homoafetiva no Brasil. “A decisão é balizada com a interpretação do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, que reconheceu a união homoafetiva entre casais do mesmo sexo. Logo, se a Constituição Federal de 1988 reconheceu a união homoafetiva como família, as benesses do Estatuto do Estrangeiro para os heterossexuais devem ser aplicadas também às uniões homoafetivas. Como o Estatuto do Estrangeiro é de 1980, a união homoafetiva sequer era reconhecida no Brasil e ainda em muitos lugares do mundo, sendo inclusive anterior à atual Constituição Federal. Logo, a decisão é constitucional. Os direitos são os mesmos de um casal heterossexual. Com o reconhecimento da união estável homoafetiva, o direito sucessório, previdenciário, civil e trabalhista são amplamente reconhecidos”, argumenta.
Segundo Patrícia Gorisch, a decisão é inovadora pela Justiça, mas logo após o reconhecimento pelo STF da união homoafetiva no Brasil, o então Secretário Nacional de Justiça em 2011 autorizou visto para um cubano que vivia no Interior de São Paulo. “Como a Lei diz que o visto permanente a estrangeiro casado ou em união estável é concedido no Brasil quando o solicitante tiver o animus de residir no país e tiver bons antecedentes criminais,a decisão é importante, pois fortalece a ideia de igualdade entre os casais homoafetivos e heterossexuais e diminui o duplo preconceito: o de ser estrangeiro e homossexual. Atualmente, vivemos o maior fluxo migratório desde a Segunda Guerra Mundial, e tal decisão torna-se um marco no combate ao duplo preconceito”, completa.
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