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Vínculo biológico não exclui o socioafetivo de registro de nascimento
“Parentalidades são diversas, consolidadas pelo sangue, pela consanguinidade com afeto e pelo trato, fama e nome, como a posse do estado de filho; todas importando em vínculos e reconhecimento jurídico das situações fáticas que transcendem as normas, como verdades concretas de realidades vividas, fundadas no afeto como valor jurídico”. Com esse entendimento, a Justiça do Rio Grande do Sul constatou a multiparentalidade e determinou que constem dois pais na certidão de nascimento de uma menina, em respeito à verdade biológica e à realidade afetiva.
Um homem, alegando ser o pai da filha da ex-companheira, ajuizou ação de investigação de paternidade. Ele só fez isso dois anos depois do nascimento da menina, segundo ele, por não saber do nascimento da criança. A menina foi registrada pelo atual companheiro da mãe, que a reconhece e trata como se filha fosse desde o seu nascimento.
No caso, homem e mulher namoraram e passaram a viver juntos. A vida do casal sempre foi tumultuada, e após o fim do relacionamento a mulher conheceu o novo namorado. No entanto, por desavenças ocorridas após o natal de 2007, esteve separada de seu namorado, ocasião em que teve encontros com o ex-companheiro.
Em janeiro de 2008 a mulher reatou com o namorado, mantendo com este uma união estável até a presente data. Em virtude da proximidade das datas em que se encontrou com o ex, a mulher apontou que somente o exame de DNA poderia identificar o pai biológico da menina de forma segura.
A menina foi registrada pelo novo companheiro da mãe, que embora duvidando da sua situação de pai biológico, “concordou em verdadeira adoção, através de uma demonstração de paternidade socioafetiva”.Dois anos depois do nascimento da menina, o ex-companheiro ajuizou Ação de Investigação de Paternidade e pediu a anulação do registro existente.
O atual companheiro afirmou que sempre desempenhou suas atribuições junto à menor com amor e afeto,e declarou pretender adquirir a condição de pai por meio de adoção à brasileira, ou seja, pela relação de paternidade socioafetiva que sempre manteve com a menor, desde seu nascimento. As partes concordaram sobre a realização de exame de DNA,que determinou que o ex-companheiro é o pai biológico da menor.
Para a juíza Denise Dias Freire,o exame de DNA que atesta a existência de vínculo biológico não é capaz de afastar a relação de paternidade constituída por vínculo socioafetivo existente entre o pai registral e o filho, pois a filiação socioafetiva muitas vezes se sobrepõe à realidade genética, fazendo com que os laços de afeto sobreponham-se à realidade biológica.“Em casos excepcionais, a maternidade ou a paternidade natural e a civil podem ser reconhecidas cumulativamente, coexistindo sem que uma exclua a outra, sendo denominada pela doutrina ‘multiparentalidade’ ou ‘pluriparentalidade’”, diz.
A magistrada afirmou que o reconhecimento da paternidade é ato irrevogável e pode ser desconstituído em situações excepcionais, mediante comprovação cabal de erro ou vício de consentimento. “Por óbvio que o caso aqui retratado não se enquadra dentre nenhuma dessas hipóteses”, diz.Para ela, ficou comprovada a coexistência da parentalidade biológica e da socioafetiva, “à luz dos princípios da dignidade da pessoa humana, do melhor interesse da criança, bem como da afetividade e da solidariedade”.
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