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Rede pública gaúcha irá custear fertilização de embrião para transplante
O Estado do Rio Grande do Sul e o município de Vista Alegre do Prata vão custear a realização de fertilização in vitro com embriões selecionados a um casal. O procedimento procura gerar um irmão compatível com uma menina de oito anos, portadora de uma doença conhecida como Beta Talassemia Major, e que há anos aguarda na fila para transplante de medula.
Pelo motivo de risco de dano irreparável, o juízo da Comarca de Nova Prata fixou o prazo de 15 dias, a contar da data da notificação, para que o Estado e o município promovam o tratamento pelo SUS ou hospital conveniado, sob pena de ter o valor bloqueado. O custo do procedimento é de R$ 33.510,00.
A Beta Talassemia Major é uma mutação genética que pode matar em até três anos, se não for tratada. Mas com a realização de transfusões de sangue regulares, como no caso da menina, a expectativa de vida pode ser elevada até os 10 anos. Na decisão, foi ressaltado que a jurisprudência gaúcha para casos parecidos é divergente quando se trata de atribuir ao Poder Público a responsabilidade de arcar com fertilizações in vitro.
Entretanto, no caso foi considerado o fato de que não está se demandando a concessão de um tratamento contra a infertilidade para assegurar o direito à maternidade sem risco de vida à paciente, mas sim a determinação de fornecimento de um tratamento médico para assegurar à autora a única possibilidade de sobreviver constatada por seu médico.
Com relação à autorização para o transplante de medula óssea por incapaz, no caso o nascituro, foi lembrada na decisão a garantia dada pela Lei 9.434/97, que exige o consentimento dos genitores, autorização judicial e ausência de risco de vida para o doador, que, no caso, deverá ser provada futuramente. Por fim, foi destacado que não há ofensa ao princípio da dignidade humana do nascituro, pois não se estaria utilizando a humanidade (criança concebida) como um simples meio em relação a outrem. Esta nova vida gerada com a fertilização, ainda que possa representar a salvação da vida da autora, a partir do transplante de células, não está sendo concebida com esta única finalidade.
A juíza e professora universitária Rosana Broglio Garbin, presidente da Comissão de Bioética do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM/RS), aponta que a utilização de técnicas de reprodução assistida, no caso, decorre da necessidade de prévio Diagnóstico Genético Pré-Implantação (DGPI) para a seleção de embrião que seja compatível para fins de tratamento de doença de terceira pessoa, no caso, a irmã. “As legislações e/ou regulamentações referentes às questões de reprodução assistida, vedam o DGPI que tenha por finalidade apenas melhorar características da criança a ser gerada. Contudo, permitem o diagnóstico prévio para fins de evitar doenças genéticas e também para fins de obter grupo HLA (human leukocyte antigen) compatível para efeitos de tratamento de doença grave. Neste sentido, por exemplo, a lei portuguesa abre exceção nas proibições de seleção de embriões, permitindo para o caso ora apresentado, conforme consta do artigo 7º, item 3, da Lei 32/2006”, explica.
Rosana Broglio Garbin esclarece que igualmente, no Brasil, a Resolução 2013/2013, do Conselho Federal de Medicina, que trata das questões relativas à reprodução humana, é expressa em permitir a seleção para este fim. Segundo ela, o item VI, 2, determina que as técnicas de RA também podem ser utilizadas para tipagem do sistema HLA do embrião, com o intuito de seleção de embriões HLA - compatíveis com algum filho(a) do casal já afetado por doença, esta que tenha como modalidade de tratamento efetivo o transplante de células-tronco ou de órgãos. “A controvérsia surge no momento em que se projeta o que se chama de ‘bebê-remédio’, ou seja, a concepção de um ser humano com a finalidade de servir de doador para terceira pessoa, ainda que do mesmo núcleo familiar, com risco de não concretizar a finalidade, gerando assim frustração nas pessoas envolvidas. A decisão proferida, pelo que consta, considera todas as variáveis, com referência ao fato de que esse filho faz parte do projeto parental e que, para além da perspectiva de cura da irmã, é ressaltada pelos pais a possibilidade de ter um filho saudável. A urgência veio justificada, assim como a impossibilidade financeira dos pais em custearem o tratamento. A decisão ainda analisa a questão ética, justificando sua tomada de posição com os elementos que constam dos autos, mostrando-se bastante adequada”, completa.
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