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Rede de Atendimento implementa sistema on-line de enfrentamento à violência contra a mulher
A Rede de Atendimento à Mulher em Situação de Violência, no Estado do Acre, implementou um sistema on-line de enfrentamento à violência contra a mulher, que pretende aperfeiçoar e agilizar a assistência de acolhimento, evitando a revitimização do sexo feminino.
Com a parceira do Ministério Público do Estado do Acre (MPAC), a iniciativa almeja proporcionar às mulheres vítimas de violência um atendimento continuado e integrado, reduzir as idas e vindas de mulheres aos serviços de atendimento e garantir celeridade ao processo de encaminhamento e atendimento.
Para atingir estes objetivos, os parceiros da Rede instituíram um grupo de trabalho composto por representantes das instituições parceiras, que atuará na elaboração do cadastro das mulheres vítimas e na elaboração de um termo de referência para dar início à solicitação de processo licitatório.
Durante a reunião, a coordenadora criminal do MPAC e Procuradora de Justiça, Patrícia Rêgo, disponibilizou o software do Sistema de Automação da Justiça do Ministério Público (SAJ/MP) e da Diretoria de Tecnologia da Informação do Ministério Público Estadual para dar suporte técnico na concepção e desenvolvimento do projeto de implementação do Sistema.
A Procuradora de Justiça Patrícia Rêgo também se dispôs a intermediar, junto à Softplan, empresa que atua no desenvolvimento de softwares de gestão, a obtenção da interface dos sistemas existentes na rede de atendimento à mulher, Sistema Integrado de Gestão Operacional (Sigo) e os sistemas do Ministério da Saúde, do Judiciário e do MPAC, para que haja comunicação entre eles.
O diálogo entre os sistemas pretende possibilitar que as mulheres em situação de violência não sejam revitimizadas. O sistema integrado permitirá que se tenha acesso à ficha das mulheres cadastradas durante o acolhimento, evitando que as vitimas revivam toda a situação de agressão cada vez que contam a história, além de humanizar o acolhimento. O sistema poderá ser lançado em dezembro, após a realização da campanha 16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher e a aberturta da Conferência Estadual de Políticas para Mulheres.
Além do MPAC, a iniciativa conta com a parceria do Centro Especializado de Atendimento à Mulher (CEAM), Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), Casa Abrigo, Núcleo de Mulher da Defensoria Pública, Vara da Violência Doméstica e Familiar e Maternidade Bárbara Heliodora, Centros de Referência de Assistência Social (CRAS e CREAS) e Tribunal de Justiça, entre outros.
Enfrentamento a violência doméstica - Para a advogada Adélia Moreira Pessoa, presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), qualquer iniciativa no sentido de implementar o que já está disposto no direito brasileiro merece aplauso, especialmente se tem o intuito de tecer, de modo mais consistente, a rede de enfrentamento à violência contra a mulher, estabelecendo políticas públicas integrais. Segundo ela, a Constituição de 1988 estabelece que o Estado deve criar mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações familiares, incluídos os três poderes do Estado, em todos os níveis da Federação.
“A Lei Maria da Penha é uma proposta inovadora, fruto do processo democrático suprapartidário, que veio atender a este comando constitucional, mas urge buscar sua plena efetivação. Sem dúvida, trouxe um novo alento, mas já completou oito anos e se pergunta: a violência contra a mulher diminuiu? A violência doméstica ainda persiste e, pior, apresenta sinais de recrudescimento, especialmente no número de assassinatos de mulheres, em razão de sua condição de mulher - feminicídios - como tipificado na nova Lei 13.104/2015. Vale frisar que, diferentemente do homem, que morre assassinado predominantemente em situações de espaço público, a mulher, em grande parte, é assassinada em decorrência de suas relações domésticas”, argumenta.
De acordo com a advogada, nenhuma lei é suficiente para coibir a violência doméstica, que atualmente assume caráter de pandemia, sendo necessário atentar-se para as medidas de enfrentamento, nos três eixos: prevenção e educação; proteção e assistência; combate e responsabilização. “É necessário sempre enfatizar que as intervenções do Estado precisam ir muito além da prisão. Nas relações domésticas, a violência de gênero necessita de ações públicas que ultrapassem a cultura de que ‘em briga de marido e mulher ninguém mete a colher’. É urgente desconstruir mitos e estereótipos que ainda permeiam a nossa sociedade, gerando distorções, silêncios e preconceitos. Vale observar que negligências e omissões de pessoas ou de instituições, muitas vezes, são justificadas com base nesses mitos. Ressalte-se que ainda está muito presente entre nós a legitimação das agressões e a culpabilização da mulher. É necessário refletir se mitos reforçam preconceitos e estereótipos de gênero”, disse.
Adélia Moreira Pessoa explica que muitas vezes ocorre a legitimação da violência de gênero, que é atribuída ao comportamento provocativo e sedutor da mulher, que ouve comentários como: “Mereceu o abuso”; “Você não sabia que ele era assim?”; “Isso é normal”; “É natural, ora!”. “Continuamos a culpar a mulher, quando o foco deveria ser o crime. Assim, existe a necessidade de concretização de medidas de prevenção à violência contra a mulher, compreendendo múltiplas ações educativas e culturais que interfiram nos padrões sexistas, pois as mudanças de postura quanto aos direitos humanos das mulheres não são consequência automática da sociedade democrática. Urge ainda sensibilizar todos os agentes públicos que intervêm nesta seara, como o Ministério Público, Defensoria Pública, Poder Judiciário, Polícias Civil e Militar, profissionais de saúde e assistência social quanto ao eixo da assistência à mulher, além das necessárias medidas socioterapêuticas de ressocialização do autor da agressão, de modo que se possam amarrar os elos dessa rede, para que as intervenções não sejam apenas pontuais”, aponta.
Conforme a advogada, esta iniciativa, capitaneada pelo Ministério Público do Acre, traz novo alento, por visar à constituição mais efetiva da rede. “Se exitosa, haverá repercussão não só na qualidade de atendimento à vítima, como preconizado pelas leis, mas também provável redução dos índices de violência, evitando-se, ademais, sua revitimização, pois a Rede estará estruturada. Assim as portas de entrada do atendimento poderão ser interligadas a todo o Sistema, e tanto podem ser uma unidade de saúde, de assistência social ou uma delegacia, com o controle do Ministério Público, havendo maior celeridade e eficácia na comunicação entre os órgãos. Iniciativas como esta devem ser divulgadas, no sentido de se buscar alternativas para a efetivação plena da Lei Maria da Penha, com mecanismos que possam enfrentar a violência presente no cotidiano de milhares de mulheres brasileiras, garantindo o Estado, de modo eficaz, um bem jurídico altamente relevante: a vida e a integridade da saúde dessas vítimas, que continuam a morrer, muitas vezes com a medida protetiva de urgência reduzida a um mero pedaço de papel”, expõe.
Por fim, Adélia explica que este projeto, com sua ação interdisciplinar e inter setorial, poderá viabilizar espaços dialógicos, inovadores, e implementar o desenvolvimento de capacidades e habilidades, de consciência crítica, de recomposição de direitos e de projetos de vida, com protagonismo, participação e desenvolvimento da autonomia da mulher, e irá contribuir, com respostas consistentes, ao desafio de enfrentamento à violência feminina, evitando sua continuidade. Segundo a advogada, as mulheres enfrentam, sempre, dificuldades no enfrentamento à violência, tais como: políticas públicas segmentadas, descontinuadas, sem especificidades; ações pontuais e descontínuas; banalização da violência contra o sexo feminino, além de omissões e resistência de agentes públicos e da própria sociedade.
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