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Crianças quilombolas são submetidas a trabalho escravo e exploração sexual na região central do Brasil
Após 127 anos da Lei Áurea, crianças negras e pobres, descendentes de escravos de um quilombo, são submetidas a exploração doméstica e sexual na Região Centro-Oeste do Brasil.
Neste mês de junho, uma reportagem da Rede Record revelou ao país a realidade vivida no Estado de Goiás, há muitos anos, por crianças da comunidade quilombola dos Kalunga, localizada no território dos municípios de Monte Alegre de Goiás, Cavalcante e Teresina de Goiás.
Ao longo de dois meses, os repórteres da rede televisiva levantaram documentos e investigaram uma série de crimes desumanos contra crianças quilombolas. Meninas, de 9 a 14 anos de idade,são amarradas e torturadas, sendo transformadas em empregadas domésticas e escravas sexuais de seus patrões. Neste mesmo cenário, é possível identificar famílias coagidase estruturas de Conselhos Tutelares e defensores de direitos humanos postos em condições de completa degradação.
Para a advogada Melissa Barufi, presidente da Comissão da Infância e Juventude do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), infelizmente a situação dessas crianças não é muito diferente da maioria das crianças brasileiras que vivem em periferias e longe da proteção do Estado. “Digo isto porque nos grandes centros, em função de um ativismo mais atuante, você ainda tem associações, grupos e ONGs que lutam pelos direitos básicos da minoria, mas como uma onda de rádio, quanto mais distante dos centros de transmissão, mais fraco é o sinal, ou seja, menos potente fica o efeito da luta e sua repercussão nesses grupos”, aponta.
Segundo a advogada, o que acontece na prática é o que é relatado neste caso: em uma comunidade quilombola negra, naturalmente excluída pela sua história e estórias, crianças e adultos já igualmente esquecidos são feitos novamente escravos e novamente violentados em todos os seus direitos. “Infelizmente, esta é a prova cabal da falta de presença do Estado e da sociedade brasileira no cumprimento da lei, principalmente referente ao alcance da proteção integral dos mais vulneráveis. Em resumo: não estamos alcançando a proteção da vida humana com dignidade”, disse.
De acordo com Melissa Barufi, o primeiro grande passo foi dado e a imprensa denunciou o fato, ou seja, a democracia e a liberdade de imprensa foi exercida. Conforme Melissa, em um segundo momento, é preciso dar suporte a esta comunidade, do ponto de vista financeiro, legal e psicológico, e, finalmente, implementar políticas públicas para que estas pessoas, principalmente as crianças, consigam ter acesso à cultura através da escola, e possam a médio prazo se tornarem adolescentes que saibam seus direitos e os cobrem onde for preciso. “Mas, repito, todas estas ações só serão possíveis com a presença real do Estado e da sociedade na comunidade. Não podemos esquecer que no Brasil, se a comunidade for carente e afastada, independentemente de raça, cor e credo, corre o mesmo risco de esquecimento. O Estado deve cumprir o seu papel de gestor, criando condições de vida para esses brasileiros junto aos outros poderes, principalmente o Judiciário, fazendo com que as leis sejam cumpridas. Lembrando que a base de sustentação dos direitos humanos está na dignidade da pessoa humana, que pressupoõe a construcão do respeito a liberdade, a vida e aos valores. E em relação à liberdade, destaco José de Farias Tavares: a liberdade física da criança e do adolescente não pode ser confundida com a desídia de quem lhes deve a guarda e a segurança. A negligência, a omissão e o desprezo injustificáveis. Deixar alguém que, por viver em fase de desenvolvimento biopsicossocial, tem necessidade pessoal de ajuda e acompanhamento jogado no meio do mundo, exposto a agressões do meio natural ou a maldade humana, jamais será atitude de observância do direito a liberdade. Pelo contrário, é crime de abandono, seja material, seja moral, por ato comissivo ou omissivo, tipos previstos na legislacão penal. Deve ser retirada de todo local perigoso ou inconveniente a pessoa nos verdes anos, que, em razão da idade, não tem ainda condições de avaliar os riscos a que se expõe”, argumenta.
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