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Em Santa Catarina, Justiça determina pagamento de indenização por abandono afetivo de pai
Além de humilhar a filha, pai afetivo pediu para ser excluído da condição de pai no registro de nascimento da menina
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) manteve decisão que negou pedido de anulação de registro civil formulado por um pai após 12 anos de convivência com filha afetiva. A Corte determinou, ainda, o pagamento de indenização por danos morais, em favor da criança, no valor de R$ 50 mil.
No caso, a menina teve sua paternidade reconhecida espontaneamente quando tinha menos de dois anos de vida. Durante a relação, o casal teve um segundo filho. Após o término do relacionamento, no intuito de regularizar a guarda de ambos os menores em seu favor, o homem interpôs ação, na qual foi homologado o acordo celebrado entre as partes para manter os filhos do casal sob a responsabilidade paterna. Essa situação perdurou até os doze anos de idade da menina, quando, então, foi completamente posta de lado pelo pai, passando a residir com a mãe e deixando de estudar no colégio particular que até então frequentava, segundo a decisão.
O homem alegou em seu recurso que foi induzido em erro pela mãe da criança e que sofreu coação moral no momento em que reconheceu a paternidade. Ele pediu a anulação do registro de nascimento da menina, com sua exclusão da condição de pai. As alegações não foram comprovadas. “O reconhecimento de paternidade da ré foi realizado pelo autor de forma livre e espontânea. Não houve nenhuma manobra por parte da genitora, buscando forçar o reconhecimento. Não há prova de que ela tenha induzido em erro ou coagido o autor”, conforme a decisão.
Para o advogado Rodrigo Fernandes Pereira, membro e sócio apoiador do IBDFAM, o Tribunal catarinense sinalizou que nos casos em que o pai registral, consciente de que não é o pai biológico, espontaneamente registra como seu filho alheio, não tem o direito de se arrepender posteriormente. “Mesmo que tenha se separado da mãe da criança ou com esta se desentendido. Consignou ainda o acórdão da lavra do desembargador Raulino Jacó Brüningque o abandono afetivo, a ofensa e o descuido para com esse ser humano, constituem-se em atos ilícitos e, por conseguinte, geram o dever de indenizar moralmente. De vez que avalio positivamente a posição do Tribunal catarinense, que por seus mais variados membros vem produzindo acórdãos de excelência, vanguardeiros, sempre privilegiando a pessoa, a família e o afeto à luz da Constituição Federal”, disse.
Abandono afetivo - De acordo com a decisão, o tratamento desigual conferido pelo pai aos filhos foi relatado nos testemunhos. O estudo social comprovou que a menina teve “minada sua autoestima” com comentários maldosos do pai acerca de seu peso. E ainda, que nos últimos dias em que a menina ficou com o pai, ele a mandava embora para casa da mãe. “A conduta indevida e injustificada chega ao ponto extremo de, em sede de razões finais orais, advogando em causa própria, dizer o insurgente que ‘a menor engordou porque é de família, como eu disse na minha contestação à reconvenção, tudo é baleia, tudo gente gorda’ e ‘quando eu mandei a menina embora, eu que mandei embora mesmo, botei as coisas dela todas na porta e mandei embora’.
Diante do exposto, inconteste é o abalo psicológico ocasionado à menor”. A conduta do pai foi tomada como descaso e abandono afetivo em relação à filha.
Rodrigo Fernandes explica que ainda não há consenso sobre a indenização em casos de abandono afetivo no judiciário brasileiro. “Todavia, percebe-se que hoje a jurisprudência majoritária acolhe a indenização em casos de abandono moral, forte no cuidado como
valor jurídico”, afirma.
Para ele, a decisão é duplamente importante. “Primeiro, não deixa margem de dúvida, como realmente é o entendimento quase uníssono, que não se pode ser irresponsável e leviano no ato de registrar filho alheio, com uma série de repercussões nas vidas dos envolvidos.
Se houver essa disposição, que não seja por arroubo inconsequente, gerando futuras mágoas e dramas psicológicos, mas alicerçada no amor, no afeto, no cuidado com o semelhante.Segundo, a paternidade deve ser exercida de forma zelosa, extremosa, com cuidados como bem-estar, a saúde, a educação e o asseio dos filhos, permitindo que vivam e cresçam em ambiente sadio, fomentando o desenvolvimento físico, intelectual e espiritual. Sem discriminação entre irmãos, ofensas morais, como ocorria no caso em comento, quando houve agressão à higidez psicológica da adolescente que viveu por anos com um pai que antes lhe dava afeto. Privar o ser humano, no início de sua vida, de uma criação esmerada na dignidade e no amor, realçou o TJSC, é ignorar-lhe direitos fundamentais da pessoa humana e, por isso, sancionável na seara da responsabilidade civil”, garantiu.
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