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Projeto que prevê abandono afetivo de idoso está pronto para votação na CCJ
Se os filhos podem recorrer à justiça para obter indenização por abandono afetivo, os pais idosos também podem. O projeto de lei 4.294/2008, do deputado Carlos Bezerra, altera os artigos 1.632 do Código Civil e 3º do Estatuto do Idoso e prevê a indenização por dano moral decorrente de abandono afetivo de pais e prevê também a indenização no caso do abandono de idosos por sua família.
O parecer favorável ao projeto de lei, elaborado pelo relator, o deputado Antônio Bulhões, está pronto para ir à votação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Em seu relatório, Bulhões defendeu o PL, argumentando que as obrigações existentes entre pais e filhos não se limitam à prestação de auxílio material, mas também ao suporte afetivo. "Embora seja verdade que não se possa obrigar alguém a amar ou manter relacionamento afetivo, há casos em que o abandono ultrapassa os limites do desinteresse e, efetivamente, causa lesões ao direito da personalidade do filho ou do pai, sujeitando-os a humilhações e discriminações", justificou o relator, acrescentando que seria nesses casos que estaria configurado o abandono afetivo gerador do direito à indenização moral.
A proposta tramita em caráter conclusivo nas comissões da Câmara. Como já foi aprovada na Comissão de Seguridade e Família, basta a aprovação do relatório do deputado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para que seja encaminhada ao Senado. O relator reconhece que a matéria divide opiniões no meio jurídico, mas acredita que o projeto obterá votação favorável. "Pela sua importância e atualidade, no contexto de discussões e modificações nas relações familiares do país, não tenho dúvidas que a CCJ vai apreciar e aprovar o projeto com celeridade", analisa.
O abandono
A advogada e especialista em direitos da personalidade, Andryelle Vanessa Camilo, explica que a ocorrência de abandono afetivo na vida de idosos gera uma violação da integridade psíquica do sujeito refletindo em angústia e em afastamento social. “Quando se fala em abandono afetivo, não se trata apenas da monetarização do afeto. É uma ação afirmativa para mudar a consciência das pessoas para a importância do afeto na vida dos sujeitos”, completa.
De acordo com Andryelle, o grande problema para a efetivação do Estatuto do Idoso e mais ainda, da alteração que prevê o abandono afetivo, é a dificuldade que o idoso tem em denunciar os abusos. “Eles se envergonham em denunciar e toleram essas violações. A gente só toma conhecimento quando a situação é extremamente grave”, enfatiza.
Com relação à jurisprudência sobre o assunto, a advogada diz não conhecer nenhum caso de condenação por abandono afetivo de idosos. “Fui procurada várias vezes, mas geralmente as pessoas não querem levar a denúncia adiante. Quando explico sobre o prazo e as conseqüências do processo, elas desistem”, comenta. Andryelle detalha que os processos de dano moral necessitam de testemunhas e narração precisa do fato para justificar a ação. “Tem que tocar nas feridas”, reforça.
O idoso na sociedade atual
A advogada considera que o abandono do idoso difundiu-se após o advento da Revolução Industrial, em que o valor humano tornou-se secundário em relação ao valor produtivo fragilizando aquele que tem sua produção reduzida em decorrência das limitações de idade. Mas nem sempre foi assim. Ela explica que na Roma antiga, época dos “pater familias”, o idoso assumia papel essencial na transmissão de conhecimentos. Eram os mais velhos que detinham o poder de guardar e passar adiante a memória dos ritos, danças e cantos para a celebração dos cultos. Em artigo sobre o tema, ela escreve que era a participação dos anciãos que assegurava a continuidade, a unidade das sociedades primitivas no campo religioso, político, econômico e social.
Mesmo que a sociedade brasileira esteja envelhecendo e que os meios de comunicação difundam a imagem do idoso ativo e cheio de saúde, o contexto de valorização do idoso ainda está longe de se difundir na sociedade como um todo. Essa situação ideal de vivência da terceira idade ainda se restringe mais às classes economicamente favorecidas. “Essas oportunidades ainda estão ligadas à classe social. Muitas famílias dependem da aposentadoria do idoso que não consegue desfrutar dos benefícios”, enfatiza.
É por isso que a advogada ressalta a importância da intervenção do Estado não só na promulgação de leis mas também na execução de políticas públicas para os idosos. “O Estatuto do Idoso, que entrou em vigência em 2003, foi um passo importante. Agora é preciso a implementação de políticas públicas, atividades educacionais, culturais, para que o idoso não precise viver em ostracismo”, reflete.
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