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Filho deve pagar pensão alimentícia à mãe idosa, decide Justiça paulista
A 2ª Vara de Jandira, em São Paulo, condenou um homem a pagar pensão alimentícia à mãe idosa. A decisão considerou que o artigo 1.696 do Código Civil estabelece o direito à prestação de alimentos como recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau.
Com base neste entendimento, a juíza deu provimento parcial ao pedido da mãe e fixou a pensão em 15% dos rendimentos líquidos do filho ou 1/3 em caso de desemprego.
A autora ajuizou a ação, na qual solicitou pensão correspondente a 1,1 salário-mínimo, sob o argumento de que necessita de auxílio material por ser idosa e não ter rendimento.
O filho não se opôs a prestar auxílio financeiro à sua mãe, mas alegou que é o responsável financeiro por duas filhas menores e não tem condição de arcar com o valor pedido. O homem apresentou uma oferta de 11% de seus rendimentos líquidos em caso de vínculo empregatício formal e de um terço do salário-mínimo se estiver desempregado. O Ministério Público opinou pela procedência parcial do pedido.
Ao avaliar a questão, a juíza da 2ª Vara de Jandira destacou que o dever de prestar alimentos entre ascendentes e descendentes tem respaldo legal e que o artigo 1.694 do Código Civil determina que o valor da pensão alimentícia deve ser fixado na proporção das necessidades do beneficiado e dos recursos do pagador.
Segundo a magistrada, o conjunto probatório revela capacidade contributiva moderada, ainda que variável. Entretanto, ela ponderou que “o valor pleiteado de 1,1 salário-mínimo mostra-se excessivo diante da realidade financeira demonstrada pelo réu, especialmente considerando a existência de duas filhas menores sob sua responsabilidade e as despesas discriminadas em suas declarações de renda”.
Assim, a juíza determinou a fixação de montante proporcional, razoável e compatível com as possibilidades do requerido, sem desconsiderar a necessidade da autora. Foi dado provimento parcial ao pedido da mãe e fixada a pensão em 15% dos rendimentos líquidos do réu, entendidos como salário-base, 13°, férias acrescidas de um terço e demais verbas de natureza remuneratória, na hipótese de vínculo de emprego formal; na de desemprego ou trabalho informal, em 33% do salário-mínimo vigente, a título de valor mínimo indispensável ao custeio das necessidades básicas da autora.
Estatuto do Idoso
A advogada Maria Luiza Póvoa Cruz, presidente da Comissão Nacional da Pessoa Idosa do Instituto Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões – IBDFAM, entende que a decisão é extremamente adequada e coerente com o que o Direito de Família e o Estatuto do Idoso determinam.
No caso analisado, a advogada afirma que o magistrado foi cuidadoso ao equilibrar a necessidade da mãe idosa com a” capacidade real do filho, que também possui filhas menores sob sua responsabilidade. Essa ponderação demonstra sensibilidade e respeito ao princípio da proporcionalidade, além de reafirmar que o envelhecimento, em especial quando marcado por vulnerabilidade econômica, merece proteção jurídica concreta.”
“Como presidente da Comissão do Idoso do IBDFAM, vejo essa decisão como um reforço importante à rede de proteção familiar e legal da pessoa idosa e como um apontamento sobre caminhos jurídicos para viver o envelhecimento no Brasil”, destaca.
Tribunais
De acordo com a diretora nacional do IBDFAM, os tribunais, de forma geral, reconhecem essa obrigação quando fica comprovado que o idoso não possui condições de prover o próprio sustento, seja pela insuficiência de renda, seja por limitações de saúde, idade avançada ou perda de autonomia. “Além disso, é sempre avaliada a capacidade contributiva dos filhos.”
Ela explica que não se exige que exista convivência próxima, histórico de cuidado ou relação harmoniosa: o que se avalia é a necessidade do idoso e a possibilidade dos filhos de ajudar. “Em famílias com vários filhos, a obrigação pode ser partilhada, de modo que cada um contribua de acordo com sua realidade. Trata-se de uma obrigação recíproca, prevista no Código Civil e fortalecida pelo Estatuto do Idoso.”
A decisão, segundo a especialista, segue exatamente a linha já consolidada na jurisprudência brasileira. “O entendimento de que filhos têm o dever de prestar alimentos a pais idosos que necessitam está muito bem assentado nos tribunais e não constitui novidade.”
“O que se observa mais recentemente é uma postura ainda mais cuidadosa na análise do caso concreto, para evitar que o encargo recaia de forma excessiva sobre um único filho ou que seja fixado sem observar a renda real de quem paga. Mas, em essência, trata-se da reafirmação daquilo que já é pacífico: o dever de solidariedade intergeracional, previsto na Constituição, no Código Civil e no Estatuto do Idoso”, afirma.
Proteção efetiva
Maria Luiza Póvoa reconhece que decisões assim garantem proteção efetiva ao idoso que, muitas vezes, não tem outra fonte de renda e depende desse apoio para sobreviver com dignidade. Além disso, complementa que “também trazem à tona a necessidade de fortalecimento dos vínculos familiares, porque a judicialização, embora legítima, costuma surgir quando os laços de cuidado já estão fragilizados”.
“Ao mesmo tempo, essas ações também organizam a responsabilidade familiar, especialmente quando existem vários filhos, permitindo que o dever seja partilhado. No plano social, reforçam a ideia de que cuidar de nossos idosos não é um ato de caridade, mas um dever legal e moral. Em suma, esse tipo de decisão protege, educa e orienta as famílias, ainda que muitas vezes revele conflitos que já existiam”, conclui a advogada.
Processo: 1004550-31.2022.8.26.0299
Por Débora Anunciação
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