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Mais de 32 milhões de idosos: mudança demográfica acende alerta no Dia Nacional da Pessoa Idosa

O Brasil ultrapassou os 32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, o que representa cerca de 16% da população. Os dados do Censo Demográfico de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, revelam que há mais idosos que jovens no Brasil e acendem o debate sobre a vulnerabilidade dessa população no Dia Nacional da Pessoa Idosa (1º de outubro).
“Daqui a 45 anos, os brasileiros com mais de 60 anos deverão corresponder a cerca de 37,8% da população do país, ou 75,3 milhões de pessoas idosas, também segundo projeção do IBGE. Essa mudança demográfica, claro, tem impactos profundos para o Direito das Famílias e das Sucessões”, avalia a advogada Maria Luiza Póvoa Cruz, presidente da Comissão Nacional da Pessoa Idosa do IBDFAM.
Segundo a especialista, o aumento das demandas por cuidados permanentes, que muitas vezes envolvem familiares diretos, podem gerar questões de responsabilidade e de regime de guarda, ou de prestação de serviços pessoais domésticos ou de saúde. “O crescimento de litígios sobre deveres de sustento e alimentos entre gerações – filhos que precisam se responsabilizar por pais ou avós, quer por necessidade material, quer por falta de assistência adequada – também pode ser uma realidade com a mudança tão acelerada da pirâmide etária brasileira.”
“Há previsão também – o que já ocorre, na prática – de processos de sucessões mais complexos. As pessoas estão vivendo mais, reconstruindo suas vidas, fazendo novas uniões e esses novos formatos também exigem novas formas de lidar com o Direito das Sucessões, com planejamento sucessório claro e seguro. E, infelizmente, há mais casos em que idosos se veem diante do abandono afetivo ou patrimonial ou de decisões familiares abusivas, o que exige maior proteção para essas pessoas”, comenta.
Relações familiares
Maria Luiza Póvoa Cruz explica que o etarismo se manifesta tanto em atitudes sociais quanto em decisões judiciais ou contratuais que ignoram a autonomia e os direitos da pessoa idosa, restringindo sua participação plena na vida familiar e social. “O Direito pode contribuir de várias formas. Com a aplicação rigorosa do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei 10.741/2003), que prevê prioridade em todos os sentidos – atendimento, tramitação processual, acesso, proteção patrimonial, contra violência, etc; com o incentivo do uso da capacidade civil, ainda que com apoio, se necessário, ao invés de regimes protetivos abusivos.”
Ela acrescenta: “Ou seja, reconhecer que muitos idosos têm plena capacidade de tomar decisões, desde que bem informados e com apoio, se necessário; garantindo tutela judicial rápida em casos de abuso patrimonial ou financeiro, o que requer que o Judiciário atue célere, com perícias médicas ou assistenciais apropriadas, e mecanismos de proteção preventiva (por exemplo, medidas cautelares)”.
São importantes também legislações ou regulamentações que coíbam práticas comerciais ou contratuais etaristas: reajustes discriminatórios de planos de saúde, cláusulas que penalizam simplesmente por idade e restrições de acesso com base em suposições de incapacidade.
A advogada também destaca a necessidade de uma educação jurídica que acolha esse tema. “Sensibilizar os operadores do Direito (juízes, promotores, advogados), para a importância de se atualizarem em relação a essa transformação que estamos vivendo. O estudo da gerontologia jurídica, por exemplo, para que as decisões respeitem a dignidade humana e não reforcem estereótipos, é algo que todos do Direito devem se preocupar.”
Desafios
Diante da crescente longevidade, a diretora nacional do IBDFAM reconhece desafios urgentes, como o cuidado continuado exige uma regulação, uma vigilância jurídica muito próxima, em especial os serviços de cuidados de longa duração (companhias de residência, cuidadores profissionais, familiares, home care, entidades), inclusive definindo responsabilidades e direitos para idosos e cuidadores.
Outro desafio, segundo ela, é a oferta de serviços de saúde compatíveis com a velhice, como reabilitação, atenção domiciliar, fisioterapia, terapias ocupacionais – áreas que muitas vezes estão esquecidas, negligenciadas.
“A proteção do patrimônio idoso é uma preocupação, também, devendo-se evitar abusos financeiros, decisões contratuais predatórias, golpes e o uso indevido de bens por parentes ou terceiros. Precisamos legitimar e garantir a eficácia de instrumentos de autonomia, como o testamento vital, procurações, diretivas antecipadas de vontade, entre outros”, pondera.
Legislativo
De acordo com Maria Luiza Póvoa Cruz, há iniciativas no Legislativo que merecem atenção. “Há muitos projetos em análise nas comissões do Senado e da Câmara que se referem ao aumento da proteção financeira da pessoa idosa e o auxílio com medicamentos e o cuidado permanente.”
Entre as propostas, a advogada cita a ratificação da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos – PDC 863/2017, “que traria importantes obrigações internacionais e parâmetros de proteção mais claros”. Atualmente o texto tramita na Câmara, na forma do Projeto de Decreto Legislativo.
Maria Luiza Póvoa cita também a PEC 81/2015, aprovada no Plenário do Senado em maio, e em análise na Câmara dos Deputados, que amplia a proteção aos idosos ao estender aos estados e ao Distrito Federal a competência para criar leis destinadas a essa população. Atualmente, esse poder cabe apenas à União.
“Há um projeto tramitando no Senado que concede incentivos fiscais com duração de cinco anos a empregadores que contratarem colaboradores com idade igual ou superior a 60 anos (PL 4.890/2019). Aprovado no Senado, o projeto também está em análise na Câmara dos Deputados”, complementa.
Outra proposta mencionada pela especialista está em análise no Senado Federal e torna obrigatória a assinatura física em contratos de empréstimo firmados por idosos. “O PL 74/2023 visa protegê-los contra fraudes e assegurar que estejam plenamente cientes dos termos acordados. Vide a fraude recém-descoberta envolvendo aposentados e pensionistas do INSS, resultando em bilhões de reais em prejuízos para essa população.”
“Tivemos ainda uma lei recentemente aprovada, em julho deste ano (Lei 15.163/2025), que aumenta as penas dos crimes de abandono de incapaz e de maus-tratos, previstos no Código Penal, e do crime de exposição a perigo da saúde e da integridade física ou psíquica da pessoa idosa, previsto no Estatuto do Idoso, e exclui a competência dos Juizados Especiais e a possibilidade de transação penal nos crimes previstos no Estatuto do Idoso e em quaisquer crimes praticados com violência contra o idoso. Uma vitória importante contra esses casos, que só crescem no Brasil”, aponta.
Por fim, ela destaca o Projeto de Lei 4.801/2023, que amplia as prerrogativas das autoridades policiais para proteger pessoas idosas em situação de risco. O texto, que tramita na Comissão de Constituição e Justiça – CCJ do Senado, autoriza que a autoridade policial adote providências para cessar o risco contra a vítima.
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Por Débora Anunciação
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