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TJSP exclui pai ausente de herança de filha incapaz
Recentemente, a Justiça paulista declarou um homem como herdeiro indigno dos bens deixados por sua filha falecida. A decisão da 12ª Vara da Família e Sucessões do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP foi fundamentada na comprovação de abandono material e afetivo por parte do homem durante a vida da filha, que era uma pessoa com deficiência.
De acordo com os autos do processo, o homem era casado com a mãe das duas filhas. Quando a mais velha foi diagnosticada com uma rara doença, aos 3 anos, ele abandonou a família, mudou-se para outro Estado e se recusou a pagar pensão alimentícia. Foram ajuizadas diversas ações de alimentos, mas o homem sempre conseguiu se esquivar da Justiça.
Trinta anos depois, a mãe e a irmã mais velha faleceram com quatro meses de diferença e o pai ressurgiu reivindicando a herança deixada por uma das filhas. Diante disso, a segunda irmã ajuizou ação de exclusão de herdeiro por dignidade alegando o abandono afetivo e material do genitor.
“Os pedidos autorais foram julgados totalmente procedentes, ou seja, o pai foi declarado indigno para receber a herança da filha que ele abandonou. Por conseguinte, a herança que cabia ao genitor passou a pertencer à irmã que oferece cuidados e amparo para a falecida”, afirma a advogada Vanessa Chaimer, que atuou no processo.
Ao analisar o caso, o Tribunal reconheceu a ausência do pai na vida das filhas ao declarar a atitude dele como um “desamparo absoluto do genitor à filha com grave enfermidade”.
"Quando a genitora faleceu, não foi o réu que passou a atuar como curador da filha, ainda que com saúde física, a demonstrar seu absoluto distanciamento da filha; foi a irmã, ora autora, que passou a se encarregar dos seus cuidados, corroborando ainda mais para a caracterização do desamparo. Vê-se que a filha não teve do genitor o amparo físico, emocional, afetivo, psicológico, de cuidado, educacional e financeiro que deveria", diz um trecho da sentença.
Além disso, o magistrado possibilitou que a exclusão do genitor fosse aceita sem que estivesse declarada em testamento.
"Embora exija-se que a deserdação seja realizada por meio de testamento, na espécie, não há como se erigir tal exigência como obstáculo ao reconhecimento da pretensão inicial. Isto porque a própria filha, a quem competiria a realização de testamento, era doente e absolutamente incapaz. Exigir-lhe o pressuposto de realização de testamento seria lhe negar acesso à possibilidade de deserdação em caso grave de abandono", conclui.
Inovação
Para a advogada, a admissão da indignidade sem o uso de um testamento de referência torna o caso inovador, uma vez que a condição de saúde da filha a impossibilitava de produzir o documento.
“No caso em questão, a deserdação não dependia da existência de testamento porque a filha herdeira era doente e absolutamente incapaz”, avalia.
Segundo Vanessa Chaimer, a decisão pode servir como um incentivo para que outras vítimas de abandono afetivo busquem a deserdação de seus genitores. “Ao tomar essa atitude, essas pessoas podem encontrar uma forma de justiça para o sofrimento emocional que enfrentaram durante a infância”, analisa.
“É comum que aqueles que passaram por abandono afetivo durante a infância optem por romper esse ciclo de dor por meio de qualificação profissional e reestruturação financeira. Dessa forma, ao progredirem na vida, buscam construir uma realidade diferente da que vivenciaram na juventude, marcada pela ausência de um pai ou mãe negligente”, afirma.
Para ela, permitir que um pai ausente tenha direito a herdar os frutos dessas conquistas após o falecimento do filho seria equivalente a validar um comportamento negligente e irresponsável. “Isso poderia ser visto como uma forma de premiar quem, durante a vida, não desempenhou seu papel de maneira adequada, privando o filho do apoio necessário”, diz.
“A decisão de buscar a deserdação do genitor que praticou abandono afetivo pode ser compreendida como uma tentativa de evitar que o autor desse abandono se beneficie das conquistas daqueles que ele negligenciou. Isso reforça a importância de responsabilizar aqueles que falharam em cumprir suas obrigações parentais, garantindo que não sejam recompensados por sua falta de responsabilidade”, conclui.
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