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Corregedoria Nacional de Justiça determina que juiz de paz deve realizar casamento homoafetivo no Ceará

Atualizado em 14/08/2024
A Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará deve adotar as providências necessárias para realizar o casamento de um casal homoafetivo. Após a determinação, feita no último dia 8 de agosto, pelo corregedor nacional de Justiça, o ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça – STJ, o casal conseguiu que fosse nomeado um novo juiz de paz.
Os dois homens tentam oficializar a união desde janeiro, mas receberam recusa de três juízes de paz que trabalham no cartório da cidade de Redenção, no interior do Ceará.
Antes de recorrer à Justiça, o casal buscou uma resolução administrativa no cartório e na Corregedoria estadual. Diante da falta de resposta, eles ingressaram na Justiça.
“Ingressamos com a demanda judicial pleiteando, além da obrigação de realizar o casamento, a indenização por danos morais com o caráter punitivo-pedagógico para servir de precedente. A luta do casal é por toda uma coletividade que ainda tem seu direito cerceado”, comenta Gessica Maia, advogada do caso.
No parecer, o ministro Salomão cobrou explicações sobre o motivo da recusa em realizar o casamento. Na decisão, ele classificou o fato como grave e afirmou que a lei de organização da Justiça do Ceará, que trata dos juízes de paz, não permite a invocação do princípio da "escusa de consciência religiosa" na celebração do casamento homoafetivo.
O corregedor afirmou que a Corregedoria estadual deverá prestar informações, esclarecendo todo o procedimento adotado no caso – inclusive com relação à forma como se deu a escolha dos juízes de paz e a formação da suposta "lista tríplice" para o cargo.
O processo civil ainda aguarda julgamento no que diz respeito à reparação por danos morais. Os três juízes de paz que se recusaram a oficializar a união foram removidos do cartório e o juiz de Redenção foi designado para celebrar o casamento. Agora, a delegacia da cidade investiga a prática de crime de homofobia.
Jurisprudência
A advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, avalia que a determinação do CNJ é “mais do que oportuna”.
“É até surpreendente que esse caso tenha chegado até o CNJ, uma vez que deveria ter sido solucionado pela própria Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará. Não é aceitável que, após mais de seis meses, ainda não se tenha conseguido garantir o cumprimento de uma determinação de natureza vinculante”, afirma.
Ela relembra decisões históricas da Justiça brasileira que ampliaram o direito de casais homoafetivos, tais como os julgamentos da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 132, pelo Supremo Tribunal Federal – STF, que equiparou as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres e reconheceu a união homoafetiva como um núcleo familiar. E a publicação da Resolução 175/2013, do CNJ.
“Em primeiro lugar, houve a decisão do STF, em 2011, que tem efeitos vinculantes. Depois disso, o próprio CNJ emitiu uma resolução clara determinando que ninguém se recusasse a promover, celebrar ou registrar a união homoafetiva ou sua conversão em casamento”, explica.
Maria Berenice Dias acrescenta que o casal cearense tem o direito de buscar uma indenização por danos morais sofridos devido à recusa do casamento.
“Apesar deste lamentável incidente, algo significativo emerge: a necessidade de trazer à tona esse caso para que todos saibam que não é permitido descumprir a lei ou desobedecer a determinações por motivos que não sejam estritamente jurídicos. Se um juiz de paz acredita que não deve celebrar um casamento homoafetivo, simplesmente não pode continuar nessa função e deve ser afastado”, pontua.
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