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CNJ recebe propostas para criação do Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial
Atualizado em 02/05/2024
Menos de um ano após a implementação do Protocolo de Perspectiva de Gênero, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ atua na construção de um nova normativa, desta vez voltada ao reconhecimento de questões raciais. Entidades, acadêmicos e outros interessados que trabalham com o tema raça e justiça podem enviar contribuições para a construção do Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial.
O objetivo é orientar a magistratura brasileira e garantir decisões judiciais justas, iguais e sensíveis às questões raciais, além de enfrentar e mitigar o racismo estrutural, institucional e as diversas formas de discriminação, promovendo uma aplicação da lei mais justa e inclusiva.
A iniciativa reconhece as particularidades dos grupos histórica e racialmente discriminados e está alinhada às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
As sugestões podem ser enviadas até 5 de maio, por meio do e-mail: fonaer@cnj.jus.br. As propostas serão avaliadas pelo Grupo de Trabalho do CNJ e, posteriormente, integradas ao texto final do protocolo.
Cada propositura deve conter a indicação do nome da instituição ou das pessoas que subscrevem o documento, com dados e documentos que permitam a identificação, os contatos telefônicos, bem como descrição de sua atuação acerca da temática; a informação de endereço físico e eletrônico; e a limitação de, no máximo, de cinco páginas, em fonte Times New Roman ou Arial, tamanho 12, espaçamento 1,5. As propostas apresentadas por pessoas jurídicas ou por entidades deverão ser assinadas apenas pelo representante legal.
Podem ser enviadas propostas sobre:
Família: abordagens para garantir a equidade racial em questões de família, como adoção, guarda e pensão alimentícia.
Cível: iniciativas que visem diminuir a desigualdade racial em litígios cíveis, incluindo contratos, propriedades e direitos de vizinhança.
Infância e juventude: estratégias para assegurar a proteção integral de crianças e adolescentes, com atenção especial aos impactos da discriminação racial.
Criminal: medidas para combater o racismo institucional no sistema de justiça criminal, da investigação ao julgamento.
Execução criminal: propostas para promover uma execução penal justa e sem discriminações, enfatizando a reintegração social.
Eleitoral: soluções para assegurar a igualdade racial no processo eleitoral e na representatividade política.
Previdenciário: estratégias para assegurar que decisões e benefícios previdenciários sejam concedidos sem discriminação, abordando questões específicas de desigualdade racial que afetam a seguridade social.
Acesse o site do CNJ e saiba mais.
Avanço significativo
No entendimento da advogada Caroline Freitas Vidal, vice-presidente da Comissão de Diversidade Racial e Etnia do IBDFAM, políticas que consideram perspectivas raciais devem ser estudadas, aplicadas e aplaudidas, pois “trazem um avanço muito significativo para a população a longo prazo". Ela cita, como exemplo, a inclusão de cotas raciais na educação.
A especialista explica que o protocolo, como tendência mundial estabelecida pela decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos, tende a promover ambientes mais favoráveis para a equiparação racial. O objetivo, segundo Caroline, é reparar a desigualdade estrutural.
“O Judiciário ainda é composto por uma minoria, que tem a tomada de decisões em suas mãos. Processualmente falando, isso impacta a vida dessas pessoas”, pondera.
Caroline afirma que, em grande parte dos processos em Direito de Família, figuram mulheres pretas, enquanto os altos cargos do Judiciário são ocupados por pessoas de realidades diferentes. “Há um certo distanciamento.”
“O protocolo não vai tratar de modo diferenciado, como muita gente confunde. É uma maneira de trazer para dentro da realidade desses magistrados a compreensão dos aspectos dessa comunidade, que é parte nesse processo”, observa.
Segundo a advogada, a normativa deve aproximar as partes. “Uma proximidade necessária para que os julgamentos sejam mais próximos à realidade.”
“O Judiciário vai ter condições para buscar mecanismos de acompanhamentos para decisões judiciais que se adequem mais àquele público, de raça diversa daquelas de quem está julgando”, pontua.
Caroline entende que ampliar a participação de grupos diversos na construção do texto garante maior assertividade ao protocolo. “Quanto mais diversa, ampla e profunda, a resolução se torna mais acessível e usual. Não vai ser um protocolo utilizado ‘para enxugar gelo’, mas sim efetivo.”
“Podemos avançar muito nas discussões e superar questões enraizadas na estrutura judicial, além de vencer também muitos entraves, com a participação ampla de todos”, afirma.
A especialista reconhece que a instrumentalização do Judiciário possibilita um padrão de atuação. “A perspectiva racial vai começar a romper essa estrutura, e trazer para os magistrados brasileiros novos olhares.”
Gênero
Com base no novo protocolo, a advogada diz que é preciso instituir também políticas públicas de combate ao racismo. “Vai abrir um campo de discussão, assim como o protocolo de gênero também abriu para discussões de ações internas e externas.”
“Estamos falando de todas as camadas. Vamos ter ali meninos, meninas, crianças, mulheres, homens, negros e pardos e então a gente tem um desafio maior. Também é algo que tem que ser superado, comparando ao gênero, é o limite de atuação.
Ela ressalta a importância de desenvolver ciclos de formação para aplicação do protocolo. “É preciso adotar o combate a qualquer tipo de discriminação. Este desafio vai permear todas as áreas do Direito.”
“Ainda há um gargalo muito grande de acesso ao sistema judiciário. Os juízes vão lidar com mais casos e mais demandas nas quais será necessário seguir o protocolo, e, por isso, devem estar atentos e superar questões individuais”, antecipa a especialista.
Por Débora Anunciação
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