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Valor resultante da venda de bem de família também não pode ser penhorado
Atualizado em 18/04/2024
Em decisão recente, o juízo da 7ª Unidade de Apoio em Execução Fiscal da Justiça Federal deu ganho de causa a uma pessoa que teve bloqueada uma quantia referente à venda do imóvel onde morava. O entendimento é de que o valor resultante da venda de bem de família também não pode ser penhorado.
Conforme a sentença, “os valores decorrentes da alienação de bem de família também são impenhoráveis, sendo abrangidos pela proteção conferida pela Lei 8.009/1990, especialmente, quando destinados à aquisição de um novo imóvel para residência do executado e de seu núcleo familiar”.
A sentença foi proferida em um processo de embargos a uma execução promovida pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT contra uma família que reside em Itá, município de Santa Catarina. Cabe recurso.
O juiz responsável pelo caso considerou que o imóvel é utilizado para a residência da família, conforme fatura de energia elétrica, de modo que está presente a impenhorabilidade. “Ainda, a afirmação dos embargantes de que há a intenção de utilização dos valores para a aquisição de um novo imóvel, bem de família, [pelo executado], é verossímil, já que não possui outro imóvel de sua propriedade e, diante disso, necessita adquirir um novo lar.”
Segundo o magistrado, a Lei 8.009/1990 deve ser interpretada de acordo com a Constituição, que protege o direito à moradia e a função da propriedade dos núcleos familiares, considerados direitos fundamentais. “Tais são considerados como direitos humanos, já que previstos em diplomas internacionais, como o Pacto de San José da Costa Rica e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – Pidesc”.
O juiz ressaltou ainda: “Existindo colisão entre o direito fundamental à moradia do executado e o direito à satisfação de crédito decorrente de multa administrativa do exequente, entendo que o primeiro deve prosperar, entendimento esse balizado pelos sistemas global e interamericano de direitos humanos”.
Não foi aceito o argumento da ANTT de que a impossibilidade de penhora da quantia não teria sido informada no prazo determinado pela legislação. De acordo com o magistrado, “a impenhorabilidade do bem de família e, por extensão, dos valores sub-rogados e decorrentes de sua alienação é matéria de ordem pública, sendo passível de invocação a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição”.
Interpretação extensiva
Para o advogado Carlos Eduardo Elias de Oliveira, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a decisão é primorosa. “O texto legal, por vezes, diz menos do que queria. Cabe ao juiz suprir essa falta por meio de uma interpretação extensiva, sempre prestigiando o espírito da norma”, reflete.
“Quando a lei protege o único imóvel residencial, é óbvio que ela blinda o devedor durante o processo de mudança de residência. Ou seja, imuniza o dinheiro obtido com a venda do imóvel, quando se evidenciar que esse valor está destinado à aquisição de outro imóvel”, explica.
Segundo o especialista, a decisão dialoga com a tendência atual do Direito brasileiro de garantir o mínimo existencial para toda pessoa, inclusive para sua família. “As famílias brasileiras encontram, nessa decisão, uma necessária proteção jurídica para a sua moradia, inclusive durante os procedimentos normais de aquisição de um novo lar em substituição do anterior.”
Por Débora Anunciação
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