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Atos discriminatórios contra LGBTQIA+ se enquadram como injúria racial, decide STF
Atualizado em 24/08/2023
O Supremo Tribunal Federal – STF decidiu que atos discriminatórios contra pessoas LGBTQIA+ também se enquadram como injúria racial. O julgamento chegou ao fim na segunda-feira, 21 de agosto. Por 9 votos a 1, os ministros concluíram pela ampliação da punição da conduta.
A ação analisada pela Corte foi o recurso ajuizado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos – ABGLT, que pretendia ampliar a decisão do STF, que, em 2019, determinou a aplicação da lei de racismo para os casos de homofobia e transfobia.
Segundo a entidade, decisões tomadas por juízes em todo o país passaram a reconhecer a homofobia como crime de racismo somente nos casos de ofensas contra pessoas LGBTQIA+. Pelas decisões, a injúria racial, que é proferida contra a honra de um indivíduo, não poderia ser aplicada com base na decisão da Corte.
Ao analisar a questão, a maioria dos ministros seguiu voto proferido pelo relator, ministro Edson Fachin. O ministro entendeu que ofensas contra pessoas LGBTQIA+ podem ser enquadradas como racismo ou injúria racial.
O entendimento é de que o STF, ao proferir o acórdão, "não exclui a aplicação das demais legislações antirracistas aos atos discriminatórios praticados contra os membros da comunidade LGBTQIA+, pelo contrário, trata-se de imperativo constitucional".
"Tendo em vista que a injúria racial constitui uma espécie do crime de racismo, e que a discriminação por identidade de gênero e orientação sexual configura racismo por raça, a prática da homotransfobia pode configurar crime de injúria racial", destacou o ministro.
O voto foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Nunes Marques, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes. André Mendonça se declarou impedido de julgar o caso. Já o ministro Cristiano Zanin, apesar de estar de acordo com o relator quanto à relevância da matéria em discussão, votou pelo não conhecimento dos embargos.
O discurso racista se dá na forma de injúria racial
O advogado Paulo Iotti, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, avalia que a decisão do STF é um marco no combate às ofensas homotransfóbicas, uma vez que “o discurso racista se dá principalmente na forma de injúria racial”.
“Tradicionalmente, a jurisprudência inventou, sem base legal, antes de 1997, que ofender indivíduo por elemento racial seria uma ‘injúria preconceituosa’, mas ‘não’ um ‘discurso racista’. Também inventaram, de forma ilegal, que ‘racismo pelo discurso’ seria ‘só’ a ofensa a uma coletividade racial”, ele explica.
Segundo o especialista, o Judiciário desclassificava denúncias por racismo para injúria simples ou por fato atípico. Por isso, criou-se a Lei 9.459/1997, que altera o Código Penal para incluir a “injúria qualificada por preconceito racial”.
“Só em 2015, o STJ, e, em 2021, o STF, reconheceram que a injúria racial é forma de racismo. Tudo isso tem relevância porque, tendo a homotransfobia sido reconhecida como forma de racismo pelo STF em 2019, a única forma de punir criminalmente ofensas homotransfóbicas contra indivíduos é pela injúria racial”, afirma.
O advogado destaca que a decisão reforça que qualquer discurso homotransfóbico é criminoso, seja ele praticado contra indivíduos ou coletividades LGBTQIA+.
“Um dos fundamentos dos embargos é que essa interpretação é teratológica porque tira a maior parte da eficácia da decisão de 2019 no que tange ao racismo homotransfóbico praticado pelo discurso. Porque a ofensa racista se dá primordialmente na forma da injúria racial, não à minoria racial como um todo”, explica.
Sendo assim, ele avalia que a decisão é fundamental na repressão penal ao discurso homotransfóbico.
“Não defendo a punição penal como uma panaceia a todos os males, mas o STF reconheceu que ela é cabível e necessária para punir a homotransfobia, como espécie de racismo social”, diz.
Lei que equipara crime de injúria racial ao racismo foi sancionada em janeiro
A Lei 14.532/2023, que equipara o crime de injúria racial ao de racismo, foi sancionada em janeiro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Com a nova forma, a punição para a injúria passou a ser prisão de 2 a 5 anos – antes, a pena era de 1 a 3 anos.
A injúria racial é caracterizada como uma ofensa a um indivíduo em razão de raça, cor, etnia ou origem. Já o crime de racismo ocorre quando o agressor atinge um coletivo de pessoas, discriminando uma raça de forma geral.
A sanção segue o entendimento do STF, que equiparou os crimes em outubro de 2022.
O texto, que havia sido aprovado em dezembro do ano passado pelo Congresso, também cria o crime de injúria racial coletiva. Além disso, a pessoa que cometer o crime em estádios ou teatros, por exemplo, passa a ser proibida de frequentar por três anos este tipo de local.
Conforme a nova legislação, a pena será dobrada se o crime for cometido por duas ou mais pessoas. Também haverá aumento da pena se o crime de injúria racial for praticado em eventos esportivos ou culturais e para finalidade humorística.
A norma também definiu como racismo a homotransfobia, que são condutas homofóbicas e transfóbicas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém.
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