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Estelionato sentimental: o que caracteriza a prática? Especialista explica
Decisão recente da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba – TJPB colocou em pauta a caracterização do estelionato sentimental. No caso concreto, a Justiça rejeitou recurso de uma mulher que se diz vítima da prática.
De acordo com os autos, a mulher relata que adquiriu um veículo, valendo-se de um empréstimo, que seria utilizado pelo seu namorado para trabalhar. Passado algum tempo, o homem pediu que ela lhe entregasse os documentos do carro alegando que, nas blitz, poderia lhe ser exigido. Depois disso, ele desapareceu.
Ela ainda alega que o veículo encontra-se no nome do homem, porém ela não teria assinado o recibo de transferência.
Ao analisar o caso, a desembargadora-relatora do caso observou que inexiste prova de que a intenção do homem seria enganar a mulher após a aquisição do veículo.
"É certo que relacionamentos desfeitos geram ressentimentos, mas do mesmo modo, as partes precisam ter o conhecimento de que não há estelionato sentimental quando os planos realizados na constância do relacionamento não são mais realizados entre as partes com o término dele. Ademais, as mágoas, frustrações e desavenças do casal oriundas do rompimento não configuram ato ilícito passível de ensejar obrigação de reparação civil", pontuou.
A relatora acrescentou que para “a caracterização do estelionato sentimental deve-se comprovar cabalmente que o promovido teve a intenção de tirar proveito da boa-fé da autora, com intenção ilícita de causar prejuízo à apelante visando unicamente o seu próprio bem-estar, sem qualquer intenção de beneficiar a companheira reciprocamente”.
Cabe recurso.
Golpe
“O estelionato sentimental é um golpe aplicado a uma das pessoas que está envolvida no relacionamento, e o agente tem, na verdade, a intenção de abusar da confiança e do ‘falso’ vínculo afetivo que permeia a relação, no imaginário da vítima”, explica a advogada Fernanda Las Casas, presidente da Comissão de Pesquisa do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
O estelionatário se utiliza da relação de confiança criada para obter vantagem patrimonial da vítima, violando a boa-fé objetiva. A vítima, por acreditar no afeto e no relacionamento construído, cede às investidas e entrega ao estelionatário valores em troca de uma futura promessa ou de um compromisso mais sério, como o casamento.
“Esta expressão foi utilizada pela primeira vez em 2013, e decorre de um julgado proferido pela 7ª Vara Cível de Brasília do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios – TJDFT e, certamente, proveniente da previsão normativa encontrada no artigo 171 do Código Penal, que trata do crime de Estelionato”, afirma.
Segundo a especialista, as características do estelionato sentimental são as mesmas do estelionato em si.
“Isso acontece porque a vítima está exposta a uma falsa percepção da realidade, acreditando que aquele relacionamento é verdadeiro e que seu afeto é correspondido. Dessa forma, o agente criminoso obtém vantagem ilícita na medida em que engana a vítima para ter ganho financeiro e causando-lhe prejuízo”, explica.
Atualmente, o estelionato sentimental é entendido como uma modalidade do crime de estelionato tipificado no artigo 171 do Código Penal.
“Caso seja constatado que dentro daquela relação sentimental houve uma fraude para levar uma das partes da relação a um prejuízo financeiro em um claro abuso da boa-fé, existem dois caminhos de punição: o primeiro é pela via cível, através da promoção de uma ação de indenização por danos morais e materiais; já o segundo é pela esfera criminal, uma vez constatados os elementos caracterizadores do crime, a pena para o agente é de até cinco anos de reclusão, além da multa”, afirma a especialista.
Proposta legislativa
Em 2023, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 6.444/2019, de autoria do deputado federal Júlio César Ribeiro (Republicanos-DF), que altera o Código Penal para incluir o crime de estelionato sentimental. Segundo a proposta, a pena poderá ser de dois a seis anos de prisão. O texto será analisado pelo Senado.
Segundo a proposta, a pena poderá ser de dois a seis anos de prisão. O texto também aumenta a pena para o crime de estelionato "comum", que passa de um a cinco anos de reclusão, além de multa, para dois a seis anos de reclusão, e multa.
O projeto também prevê situações nas quais deve haver o endurecimento da pena para o crime de estelionato. Pelo texto, se o crime for cometido contra uma pessoa idosa ou vulnerável, aplica-se a pena em triplo.
A proposta ainda inclui no rol de crimes de estelionato o ato de "viabilizar a utilização de contas bancárias por terceiros para o cometimento de fraude" e fraude eletrônica, neste último caso, o texto inclui entre as possibilidades de agravante quando o crime é cometido por duplicação de dispositivo eletrônico ou aplicativo de internet.
Processo 0808003-16.2020.8.15.0001
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