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O que a aprovação da lei de abandono afetivo ensina sobre a revogação da lei de alienação parental
Bruna Barbieri Waquim
Doutora e Mestre em Direito. Professora universitária. Assessora jurídica. Educadora Parental. Presidente da Comissão Nacional do IBDFAM. Vice-Presidente do IBDFAM/MA.
O conceito de abandono afetivo é conhecido no Brasil há décadas, consolidado na doutrina e reconhecido na jurisprudência como uma das formas mais sutis e cruéis de violação dos deveres parentais. Contudo, a ausência de uma legislação específica sempre criou um abismo entre a teoria e a prática, deixando ao arbítrio dos juízes a definição sobre como e quando impor medidas punitivas ou reparatórias.
Mesmo diante de provas inequívocas do sofrimento psíquico e emocional causado pelo abandono, a falta de uma norma expressa limitava a efetividade das decisões e a segurança jurídica necessária para a proteção integral da criança e do adolescente emocionalmente abandonado e negigenciado.
Existir a Lei de Abandono Afetivo cumpre duas importantíssimas funções: a segurança jurídica no combate e prevenção a esse mal, e o efeito pedagógico de conscientizar a sociedade e os profissionais do Direito, da Psicologia e do Serviço Social sobre a existencia real desse mal e seus danos à infância.
De modo análogo, a revogação da Lei de Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010) representaria um retrocesso grave no sistema de proteção da infância e da adolescência. Assim como ocorreu no passado com o abandono afetivo, relegar a questão da alienação parental apenas ao entendimento subjetivo de cada magistrado é fragilizar o combate a uma prática reconhecida nacional e internacionalmente como lesiva ao desenvolvimento emocional e relacional de crianças e adolescentes.
A existência dos comportamentos parentais alienadores está documentada em estudos científicos nos Estados Unidos, na Austrália, no Chile, na China, no Líbano, no Brasil e em vários outros países que se dedicam à pesquisa científica sobre esse problema. Para isso, confiram a cartilha produzida pelo IBDFAM em :https://ibdfam.org.br/upload/ebook/alienacao_parental.pdf .
A alienação parental, embora fortemente amparada pela doutrina psicológica, jurídica e social, necessita de respaldo normativo claro e pedagógico, que oriente a sociedade sobre a gravidade de tais condutas e que forneça instrumentos concretos ao Judiciário para preveni-las e reprimi-las. Revogar a lei seria transmitir à sociedade a equivocada mensagem de que o problema não existe ou, pior, de que as práticas alienadoras estão legitimadas diante da omissão do Estado em sobre elas legislar.
Conclui-se, portanto, que revogar a Lei de Alienação Parental é desproteger a infância. É abdicar do caráter educativo e preventivo da norma, que tem papel essencial na conscientização social e na defesa de vínculos familiares saudáveis. Tal revogação abriria espaço para a impunidade e para a perpetuação de comportamentos que ferem profundamente o melhor interesse da criança e do adolescente — princípio basilar do ordenamento jurídico brasileiro e da Convenção Internacional dos Direitos da Criança.
A promulgação da Lei do Abandono Afetivo nos ensina sobre a importância de que as violências sejam nomeadas e de que ferramentas juríicas específicas sejam criadas para seu combate, ao invés de se torcer que interpretações sejam feitas sobre disposições gerais e abrangentes do ECA e do Código Civil.
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