Direito de Família na Mídia
Its the end of the world as we know it...
02/01/2012 Fonte: O Povo OnlineNão se pode dizer que foi uma revolução silenciosa. Muito menos repentina. Há muito, homossexuais brasileiros lutam - e com muita grita - para ter seus direitos civis reconhecidos. Nos últimos anos, o avanço foi pontual, com conquistas aqui e ali. Importantes, sem dúvida, mas de âmbito restrito. Leis municipais e estaduais estendendo certos direitos a casais homoafetivos, iniciativas privadas, uma ou outra sinalização de órgãos federais neste sentido. No entanto, o fundamental, o passo decisivo sempre foi barrado sistematicamente por uma robusta bancada conservadora no Legislativo brasileiro, que anunciava e garantia que o mundo, tal qual conhecíamos até o século passado, não iria se acabar.
No dia 5 de maio deste ano, decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) ruiu com esta certeza e o "tal mundo" se acabou. Por unanimidade, os ministros do STF reconheceram que uma união homoafetiva constitui unidade familiar e equipararam casais gays em união estável a casais heterossexuais, o que implica que ambos devem ser regidos pelas mesmas regras, sem distinção.
O fato
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, em 2011, a constitucionalidade de uniões civis de pessoas do mesmo sexo. A decisão é vinculante - ou seja, válida para qualquer casal homoafetivo no País. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou, para um caso específico, o casamento civil homossexual - status não conferido pela união civil. Diferentemente da decisão do STF, a sentença do STJ não vale para todos os casos, mas abre precedente.
"Pelo que dou ao art. 1.723 do 49 Código Civil interpretação conforme à Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva", escreveu no voto o ministro Ayres Britto, relator do caso.
Mais recentemente, outras decisões judiciais avançaram ainda mais. Em 25 de outubro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Compreenda, a decisão anterior não garantia o casamento homoafetivo, "apenas" equiparava a união gay a uniões estáveis heterossexuais (se é que a decisão dessa monta cabe um "apenas"). A decisão do STJ não é vinculante, mas abre importante precedente para que tribunais de instâncias inferiores e até cartórios adotem postura semelhante.
No Ceará, em novembro, o Ministério Público Estadual entrou com ação civil pública para obrigar os cartórios a celebrar casamentos civis entre pares homoafetivos. "É preciso ter coragem para vencer preconceitos e respeitar a Constituição como o sacrário da Justiça e não utilizar-se dela com altar-mor da hipocrisia e dogmas religiosos", justificou o promotor de justiça Luís Laércio, um dos autores da ação.
Também em novembro, o Ministério Público do Rio Grande do Sul entendeu que casamentos gays constituídos fora do Brasil devem ser reconhecidos aqui como matrimônio, legando aos cônjuges homoafetivos os mesmos direitos que têm os heterossexuais. Em parecer sobre o pedido de um casal formado por um brasileiro e um inglês, casados em Londres, de ter seu casamento reconhecido no Brasil, a promotora Velocy Melo Pivatto, da Promotoria de Cível de Lajeado (RS), afirmou: "Reconhecer tal situação trata-se de mero ato de formalizar o que de fato já existe, pois o casal homoafetivo já vive e se comporta como duas pessoas casadas que, além do afeto e da harmonia, acabaram construindo um lar e vivendo toda a rotina que um casal heteroafetivo vivencia''.
O Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça publicou decisão no Diário Oficial de 14 de novembro concedendo visto de residência permanente no Brasil a partir de união homoafetiva.
Um cubano casado com um brasileiro do Interior de São Paulo foi o primeiro homossexual estrangeiro a gozar deste direito. Já era possível ao casal binacional homoafetivo requerer o visto de permanência no Brasil, mas o processo era de uma burocracia praticamente intransponível (para se ter ideia, o proponente tinha de se submeter a vistorias da Polícia Federal, a quem cabia atestar a veracidade da união). Como a decisão do STF equiparou direitos de casais homoafetivos aos dos heterossexuais, inclusive o visto de residência, agora basta apresentar a certidão de união estável.
Sem dúvida, em 2011 foram muito os avanços na área jurídica para a causa homoafetiva, mas ainda falta muito a ser conquistado. Inclusive na questão do respeito social. O fato é que o mundo como conhecíamos acabou e nem esperou cumprir as profecias do calendário maia para isso. Saudemos então ao novo mundo que já chegou.
...And I feel fine*
*É o fim do mundo como conhecemos... e eu me sinto bem"
"No Ceará, o Ministério Público entrou com ação para obrigar os cartórios a celebrar casamentos civis entre pares homoafetivos"