Direito de Família na Mídia
Dignidade até o último momento
07/12/2010 Fonte: Jornal Estado de MinasQuando não há mais nada a fazer, ainda há muito a ser feito. A máxima que guia a medicina há longos anos ganha, enfim, respaldo da Justiça brasileira, que abre esta semana caminho para a ortotanásia no país. Nos próximos dias, a decisão judicial será publicada no Diário Oficial da União, pondo ponto final a uma polêmica que se arrastou por quase três anos. Em 2007, o Ministério Público Federal (MPF) obteve liminar suspendendo a regulamentação da prática, que consiste em não prolongar a vida de doentes terminais sem chances de cura. Porém, no segundo semestre deste ano, o MPF voltou atrás, revisou a ação e passou a defender a legalidade do procedimento. Com a reviravolta, a previsão de autoridades da saúde é de que os médicos passem a ter mais segurança do ato, já que antes os profissionais estavam sujeitos a processos judiciais.
A decisão, que valoriza a opção pela prática humanista na medicina, é considerada uma grande vitória dos conselhos da área. A controvérsia começou em 2006, quando o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou resolução que regulamentava a ortotanásia no país, deixando bem claro que médicos podiam interromper tratamentos desnecessários diante de doentes sem chances de cura. Isso inclui desligar o aparelho de um paciente na UTI e deixá-lo, caso seja sua vontade, passar os últimos dias em casa, com a família. Na época, o Ministério Público Federal entendeu que a prática não estava prevista em lei e que estimularia os médicos a praticar homicídio. Uma ação civil pública foi proposta e, no ano seguinte, liminar expedida pela Justiça Federal em Brasília suspendeu a resolução do conselho.
Este ano, a procuradora federal Luciana Loureiro Oliveira entendeu o tema de maneira diferente e apontou ainda que a ação proposta confundiu ortotanásia com eutanásia, que é o ato de dar fim ao sofrimento de um doente sem cura, mesmo que não esteja em fase terminal. Diante dessa interpretação, a ação foi retirada. "Nunca duvidamos de que a decisão nos seria favorável, pois é conveniente com o bom senso e com os valores humanistas", afirma o primeiro vice-presidente do CFM, Carlos Vital Tavares Correa Lima. Segundo ele, a antiga liminar servia como uma investigação sobre o mérito da prática. "Agora, o próprio MPF reconheceu o valor do procedimento. No próprio Código de Ética Médica, de 1988, a ortotanásia já era reconhecida. Em 2006, o conselho a regulamentou e ela continuou no novo código, que entrou em vigor em abril deste ano", explica.
Para o diretor-técnico do Hospital Paulo de Tarso, Luís Carlos Moreira, a decisão vem dar respaldo jurídico a um procedimento regular. Ele lembra que a prática, adotada há dois anos no hospital localizado na Região da Pampulha, mesmo prevista no código e regulamentada pelo conselho, não era reconhecida judicialmente. "O médico fazia do ponto de vista ético, mas agora terá o respaldo da Justiça", diz.
A prática, só permitida quando se esgotam todos os métodos terapêuticos e o paciente está em fase terminal, é aceita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com base no documento da Igreja O Evangelho da vida, de João Paulo II, em que o papa, em 1995, se posiciona contra a eutanásia, mas a favor da ortotanásia. "Nessas situações, quando a morte se anuncia iminente e inevitável, pode-se em consciência renunciar a tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem, contudo, interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes", diz o texto. Em 2005, o papa optou pela prática. No Brasil, o exemplo mais famoso é a morte do ex-governador de São Paulo Mário Covas, em 2001, o que levou o estado a ser o único do país a aprovar uma lei garantindo o direito do cidadão a uma morte digna.
CUIDADOS PALIATIVOS Considerando a decisão um progresso para o país, a presidente da Sociedade de Tanatologia de Minas Gerais (Sotamig), Ana Paula Abranches, ressalta que a ortotanásia vem legitimar o serviço de cuidados paliativos. "É o tratamento para os sintomas de pacientes sem chances de cura, sem o intuito de tratá-lo com mais sofrimento. Isso é garantir o direito da dignidade na hora da morte", explica, apontando que, nesse quesito, o Brasil não vai bem. "Em relação aos outros países, estamos bem atrasados. Minas Gerais, em comparação com o país, também precisa melhorar. Em São Paulo, por exemplo, há uma série de serviços de cuidados paliativos, em Minas são poucos", compara.
No Hospital Paulo de Tarso, referência para o assunto, em dois anos, cerca de 30 pacientes já passaram pelos serviços de cuidados paliativos por meio de um dos principais planos de saúde do país. "Esse tipo de tratamento é direcionado ao enfermo para o qual todas as possibilidade de cura estão esgotadas, do qual já se sabe quantos meses ou dias restam. O objetivo é trazer o máximo de conforto e carinho para essa pessoa, desde que ela ou os familiares concordem. Há uma equipe preparada para isso, com psicólogos, enfermeiros, médicos e até mesmo apoio espiritual", explica o diretor técnico do hospital.
Izabel de Mello Pereira Alves, de 75 anos, aprova esse tratamento. Há dois anos, seu marido, Zoiro Pereira Alves, na época com 71 anos, ficou muito doente e, durante 35 dias, ficou internado em uma UTI. "Já não tínhamos muito o que fazer, os médicos conversaram conosco e decidimos não interná-lo mais. Então, ele foi para o Hospital Paulo de Tarso, onde passou pelos cuidados paliativos. Ali, se sentiu em casa e ficava ao nosso lado. Faleceu em nossa companhia. Foi melhor assim."
A decisão, que valoriza a opção pela prática humanista na medicina, é considerada uma grande vitória dos conselhos da área. A controvérsia começou em 2006, quando o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou resolução que regulamentava a ortotanásia no país, deixando bem claro que médicos podiam interromper tratamentos desnecessários diante de doentes sem chances de cura. Isso inclui desligar o aparelho de um paciente na UTI e deixá-lo, caso seja sua vontade, passar os últimos dias em casa, com a família. Na época, o Ministério Público Federal entendeu que a prática não estava prevista em lei e que estimularia os médicos a praticar homicídio. Uma ação civil pública foi proposta e, no ano seguinte, liminar expedida pela Justiça Federal em Brasília suspendeu a resolução do conselho.
Este ano, a procuradora federal Luciana Loureiro Oliveira entendeu o tema de maneira diferente e apontou ainda que a ação proposta confundiu ortotanásia com eutanásia, que é o ato de dar fim ao sofrimento de um doente sem cura, mesmo que não esteja em fase terminal. Diante dessa interpretação, a ação foi retirada. "Nunca duvidamos de que a decisão nos seria favorável, pois é conveniente com o bom senso e com os valores humanistas", afirma o primeiro vice-presidente do CFM, Carlos Vital Tavares Correa Lima. Segundo ele, a antiga liminar servia como uma investigação sobre o mérito da prática. "Agora, o próprio MPF reconheceu o valor do procedimento. No próprio Código de Ética Médica, de 1988, a ortotanásia já era reconhecida. Em 2006, o conselho a regulamentou e ela continuou no novo código, que entrou em vigor em abril deste ano", explica.
Para o diretor-técnico do Hospital Paulo de Tarso, Luís Carlos Moreira, a decisão vem dar respaldo jurídico a um procedimento regular. Ele lembra que a prática, adotada há dois anos no hospital localizado na Região da Pampulha, mesmo prevista no código e regulamentada pelo conselho, não era reconhecida judicialmente. "O médico fazia do ponto de vista ético, mas agora terá o respaldo da Justiça", diz.
A prática, só permitida quando se esgotam todos os métodos terapêuticos e o paciente está em fase terminal, é aceita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), com base no documento da Igreja O Evangelho da vida, de João Paulo II, em que o papa, em 1995, se posiciona contra a eutanásia, mas a favor da ortotanásia. "Nessas situações, quando a morte se anuncia iminente e inevitável, pode-se em consciência renunciar a tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, sem, contudo, interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes", diz o texto. Em 2005, o papa optou pela prática. No Brasil, o exemplo mais famoso é a morte do ex-governador de São Paulo Mário Covas, em 2001, o que levou o estado a ser o único do país a aprovar uma lei garantindo o direito do cidadão a uma morte digna.
CUIDADOS PALIATIVOS Considerando a decisão um progresso para o país, a presidente da Sociedade de Tanatologia de Minas Gerais (Sotamig), Ana Paula Abranches, ressalta que a ortotanásia vem legitimar o serviço de cuidados paliativos. "É o tratamento para os sintomas de pacientes sem chances de cura, sem o intuito de tratá-lo com mais sofrimento. Isso é garantir o direito da dignidade na hora da morte", explica, apontando que, nesse quesito, o Brasil não vai bem. "Em relação aos outros países, estamos bem atrasados. Minas Gerais, em comparação com o país, também precisa melhorar. Em São Paulo, por exemplo, há uma série de serviços de cuidados paliativos, em Minas são poucos", compara.
No Hospital Paulo de Tarso, referência para o assunto, em dois anos, cerca de 30 pacientes já passaram pelos serviços de cuidados paliativos por meio de um dos principais planos de saúde do país. "Esse tipo de tratamento é direcionado ao enfermo para o qual todas as possibilidade de cura estão esgotadas, do qual já se sabe quantos meses ou dias restam. O objetivo é trazer o máximo de conforto e carinho para essa pessoa, desde que ela ou os familiares concordem. Há uma equipe preparada para isso, com psicólogos, enfermeiros, médicos e até mesmo apoio espiritual", explica o diretor técnico do hospital.
Izabel de Mello Pereira Alves, de 75 anos, aprova esse tratamento. Há dois anos, seu marido, Zoiro Pereira Alves, na época com 71 anos, ficou muito doente e, durante 35 dias, ficou internado em uma UTI. "Já não tínhamos muito o que fazer, os médicos conversaram conosco e decidimos não interná-lo mais. Então, ele foi para o Hospital Paulo de Tarso, onde passou pelos cuidados paliativos. Ali, se sentiu em casa e ficava ao nosso lado. Faleceu em nossa companhia. Foi melhor assim."