Direito de Família na Mídia
Histórias mostram que, em 15 anos, o Estatuto da Criança e do Adolescente fez diferença
21/06/2005 Fonte: Revista Época - SP em 22/06/05Paloma Cotes
A lei que pela primeira vez tratou crianças e jovens como cidadãos com direitos e deveres chegou à adolescência. Quinze anos depois de sua criação, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) salvou o futuro de vários brasileiros. A lei, sancionada em 13 de julho de 1990, estabeleceu direitos de crianças e adolescentes e criou órgãos, como os conselhos tutelares e delegacias especializadas. De lá para cá, praticamente todas as crianças entraram na escola. As estatísticas de trabalho infantil caíram 47%. A mortalidade infantil também. "Ainda há muito a fazer. Mas o ECA permite transformar demandas em algo real", diz Rubens Naves, da Fundação Abrinq.
Foi o que fez o adolescente João Dias da Silva. Exemplos como o dele (leia os quadros) compõem o livro Causos do ECA - Tramas da Vida, com dez histórias selecionadas ent re as 127 recebidas em um concurso literário promovido pelo portal da Rede Internacional Solidária (RISolidária). Os "causos" também estarão disponíveis no portal. "Queremos mostrar que o ECA não foi feito somente para cuidar dos jovens infratores da Febem", diz Sérgio Mindlin, presidente da Fundação Telefônica, parceira da RISolidária no projeto. "Ele influencia cotidianamente a vida de milhares de brasileiros", afirma.
O direito de brincar
Com 1 ano e meio de idade, Mariana era tímida e não sorria. Maria das Graças dos Santos Neves, sua mãe, não entendia o motivo daquele comportamento sério. Mas estava mais preocupada com os afazeres domésticos do que em brincar com a única filha. Mesmo morando em Santos, no litoral paulista, ambas jamais haviam passeado juntas ou ido à praia. Percebendo a situação, uma vizinha levou as duas a uma brinquedoteca criada pela prefeitura, seguindo as recomendações do ECA. "Eu não sabia como estimular minha filha. Achava que se a deixass e no chão ou no carrinho era o suficiente", conta Maria, oito anos depois. "Descobri que brincar com os filhos é importante como dar comida ou colocar para dormir", diz.
Educação em horário acessível
João Dias da Silva, de Vinhedo, conseguiu seu primeiro emprego aos 16 anos. Precisaria apenas mudar de turno na escola. Parecia simples, mas a escola pública não tinha vagas para o período noturno. "Fiquei desesperado. Não queria abrir mão nem da escola e nem do emprego", conta. João procurou o Conselho Tutelar da cidade, que obrigou a escola a se adaptar. Foi criada até uma classe noturna a partir disso. "A reivindicação do João resultou em benefício para outras dezenas de adolescentes", afirma a psicóloga Nadia Feliciano Pereira, da ONG Aveha, que intermediou o caso. Agora, João, no 2o ano de ensino médio, poupa o salário mínimo que recebe para poder pagar uma faculdade.
Auto-estima transformadora
Aos 14 anos, Josimar Manoel Martins sonhava com uma vida diferente, como todo adolescente. Mas, vivendo numa favela pobre e violenta, era pessimista. "Achava que tinha nascido e ia morrer na mesma situação." Até que conheceu a artista plástica Lucila Maia. Ela desenvolve um projeto na favela a partir dos princípios do ECA. "Pesquisando, vi que me sentia como muitos pintores famosos. Eles tinham um enorme potencial, mas poucos acreditavam neles", conta Josimar. Hoje, aos 17 anos, e cheio de auto-estima, ele faz cursinho e trabalha como auxiliar em um escritório de Direito. "Assim como Josimar, outros meninos aprenderam que a persistência pode levá-los muito longe", diz Lucila, fundadora da Associação Cultural Constelação.