Direito de Família na Mídia
Justiça de Goiás reconhece união entre homossexuais
06/02/2007 Fonte: Consultor Jurídico com AscomA Justiça de Goiás reconheceu a união estável de um casal homossexual. Segundo a juíza Sirlei Martins da Costa, da 3ª Vara de Família, Sucessões e Cível de Goiás, ambos formam uma entidade familiar com "todas as conseqüências legais advindas de uma união".
O caso trata de uma ação de declaração de sociedade na qual o casal sustenta que vive junto e tem construído patrimônio desde de julho de 1999, data tomada como marco, pela juíza, para extensão dos efeitos da sentença. De acordo com a decisão, os juízes das varas de família são competentes para julgar causas que envolvem relação de afeto formada por pessoas do mesmo sexo, "à semelhança das questões da mesma natureza envolvendo casais heterossexuais".
De acordo com a juíza, a jurisprudência é tranqüila em relação à possibilidade jurídica do reconhecimento da união homoafetiva, vez que os princípios da Constituição Federal vedam qualquer discriminação, inclusive quanto ao sexo.
Admitindo que ainda não existe lei específica sobre o assunto, a juíza ponderou: "A consagração do princípio da dignidade da pessoa, como norte principal para o julgador, permitiu ao juiz brasileiro a possibilidade de suprir a lacuna existente na legislação sobre o tema. Há julgados recentes reconhecendo uma série de direitos em prol de homossexuais, dentre eles o reconhecimento da união homoafetiva como verdadeira entidade familiar".
Quarta família
A interpretação judicial sobre a união homossexual pode vir a criar a quarta família brasileira. No atual contexto, a Constituição prevê três enquadramentos de família. A decorrente do casamento, a família formada com a união estável e a entidade familiar monoparental (quando acontece de apenas um dos cônjuges ficar com os filhos).
A decisão goiana vai no sentido sinalizado pelo ministro Celso de Mello, no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade em fevereiro do ano passado. O ministro afirmou que a união homossexual deve ser reconhecida como uma entidade familiar e não apenas como "sociedade de fato". A manifestação foi pioneira no âmbito do Supremo Tribunal Federal e indicou que a discussão sobre o tema deve ser deslocada do campo do Direito das Obrigações para o campo do Direito de Família.
A opinião do ministro foi explicitada no exame de uma ação proposta pela Associação Parada do Orgulho Gay, que contestou a definição legal de união estável: "entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família" (artigo 1.723 do Código Civil).
Celso de Mello extinguiu o processo por razões de ordem técnica, mas teceu considerações sobre o que afirmou ser uma "relevantíssima questão constitucional". O ministro entendeu que o STF deve discutir e julgar, em novo processo, o reconhecimento da legitimidade constitucional das uniões homossexuais e de sua qualificação como "entidade familiar". Ele chegou até mesmo a indicar o instrumento correto para que a questão volte ao Supremo: a ADPF, Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental.
Em sua decisão, o ministro cita a vice-presidente do IBDFAM, a desembargadora gaúcha Maria Berenice Dias, que ressalta a importância do Judiciário como agente de transformação social: "Ao menos até que o legislador regulamente as uniões homoafetivas — como já fez a maioria dos países do mundo civilizado — incumbe ao Judiciário emprestar-lhes visibilidade e assegurar-lhes os mesmos direitos que merecem as demais relações afetivas. Essa é a missão fundamental da jurisprudência, que necessita desempenhar seu papel de agente transformador dos estagnados conceitos da sociedade".