Direito de Família na Mídia
Recusa ao relacionamento sexual não anula o casamento
18/12/2006 Fonte: Espaço VitalO matrimônio não consumado devido à recusa permanente ao relacionamento sexual revela desconhecimento sobre a identidade psicofísica do parceiro, tornando insuportável o convívio conjugal, o que caracteriza a anulação do casamento.
Esse foi o entendimento dos integrantes da 7ª Câmara Cível do TJRS que, por maioria, atenderam apelação do marido e do Ministério Público, contra sentença que, na comarca de Guaíba (RS) julgou improcedente o pedido de anulação do casamento. O matrimônio ocorreu em setembro de 2002.
O agente ministerial alegou não ter ficado esclarecido o motivo pelo qual a esposa se recusava a manter relações sexuais com o marido. Argumentou que a negativa poderia decorrer de problemas físicos ou mentais, ou mesmo da vontade da mulher, o que dá causa à anulação do casamento nos termos do art. 1.557, incisos I, III ou IV, do Código Civil. Sustentou ser injusto sujeitar o cônjuge ao status de separado ou divorciado, com as conseqüências patrimoniais decorrentes.
O marido declarou tratar-se de rejeição contínua desde a noite de núpcias. Manifestou que a relação sexual integra a vida em comum, não aceitando a omissão da esposa, que poderia ter declarado antes do casamento sua negativa às relações sexuais. Asseverou que a recusa injustificada caracteriza erro essencial quanto à pessoa, conduzindo à anulação do casamento. Salientou que "se soubesse previamente da opção da mulher em negar-se ao ato sexual, não teria casado com ela".
A mulher declarou que "a abdicação às relações sexuais não afeta os planos de existência, validade e eficácia do matrimônio". Disse que as partes coabitaram por quase um ano, e asseverou ter o casamento fracassado em razão da incompreensão do marido, que deveria ter procurado superar o problema em conjunto, cabendo-lhe recorrer à separação judicial ou ao divórcio, se desejasse a dissolução.
Segundo o acórdão, "a reiteração da conduta, de forma imotivada, viola deveres da vida em comum e consideração com o cônjuge, afetando o princípio solar da dignidade da pessoa humana e de sua imagem". Referiu que a lei fundamental brasileira ergueu como maior valor do ordenamento o princípio da dignidade da pessoa humana de acordo com o art. 1º, inciso III, da Constituição Federal. "Entre outras garantias, o respeito à intimidade, à vida privada, à imagem e à reputação, os deveres da fidelidade recíproca, da vida comum sob o mesmo teto, obrigações a que se comprometem os cônjuges, conforme o art. 1.566, incisos I, II e V, do Código Civil".
A desembargadora Maria Berenice Dias, vice-presidente do IBDFAM, foi voto vencido, sustentando que a negativa de contato sexual não configura erro essencial. "Reconhecer a obrigação de contatos sexuais acabaria por impor a existência do direito à vida sexual, o que estaria chancelando a violência sexual e até a prática de estupro na busca do exercício de um direito", ponderou. Para ela, "caberia somente a busca da separação e nunca a anulação das núpcias".
Mas o 4º Grupo Cível do TJRS sacramentou a anulação: "a existência de relacionamento sexual entre cônjuges é normal no casamento. É o esperado, o previsível. O sexo dentro do casamento faz parte dos usos e costumes tradicionais em nossa sociedade. Quem casa tem uma lícita, legítima e justa expectativa de que, após o casamento, manterá conjunção carnal com o cônjuge".