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Alienação parental ameaça vínculo entre pais e filhos
29/09/2016 Fonte: ALEPEHá 24 anos, o professor universitário Lairson Lucena, de 47 anos, conheceu a mãe de seus dois filhos. A então namorada engravidou e ele assumiu os deveres de pai. Ele conta que, desde o início da relação, a companheira mostrou-se ciumenta e agressiva. Ao longo dos anos, o abuso doméstico se intensificou. No auge da violência, a ex-companheira de Lairson atacou a própria filha, então com 15 anos. A agressão, quase fatal, foi registrada em boletim de ocorrência. Mas ele conta que a mãe ficou impune.
Lairson decidiu olhar pra frente. Casou de novo e atualmente luta para restabelecer o contato com os filhos, com quem não convive há seis anos. “O dia em que eles entenderem que a porta da minha casa continua sempre aberta, que o meu coração não mudou nada, desde quando eles nasceram. Que nenhuma das mentiras levantadas sobre a minha pessoa são verdades, espero ter nos meus filhos a minha descendência”, revela.
O professor planeja escrever um livro sobre sua devastadora experiência para alertar outras famílias. E está pesquisando o percentual de adolescentes e adultos que vivem na zona de risco social como consequência da alienação parental desde a infância. Lairson acrescenta que encontrou forças no novo casamento, sobretudo no apoio da mulher e das enteadas. “Foi essa família nova que me deixou fortalecido. Mas meus filhos precisam reconhecer que não estão sozinhos no mundo. Vejo que eles estão órfãos. Eles nem veem o pai, nem a mãe.”
A avó materna, Leide Albuquerque, 68, tomou conhecimento de que o neto, de 20 anos, tornou-se viciado em drogas há mais de dois anos. “Eu tenho muita pena de Lairson, sei que ele gosta dos filhos e queria que isso não tivesse ocorrido”, comenta. Ela disse não ter mais esperanças de que os laços de família sejam refeitos. Leide acrescenta que nenhum dos netos quer conviver com ela. “Eu sinto o desprezo deles, além de tristeza e desgosto”, revela.
A situação vivida por Lairson e Leide se encaixa no que psicólogos e profissionais do Direito chamam de “alienação parental”. É quando, com a separação ou divórcio, a parte inconformada pode iniciar uma “campanha” de desqualificação do outro genitor e até de outros parentes, no intuito de afastá-los do convívio com os filhos.
Em Pernambuco, ainda é reduzido o número de processos judiciais de alienação parental. São três os casos analisados atualmente pela juíza Paula Malta, titular da 11ª Vara da Família, localizada no Fórum Joana Bezerra, no Recife. Mas ela ressalta que, num simples caso de regulamentação de visitas, acabam surgindo pistas de que um dos genitores está manipulando os filhos para denegrir a imagem do ex-parceiro. Segundo Paula, a incidência de alienação pode ser ainda maior. “Quando o feito caminha e os ânimos se exaltam, isso vem à tona. Tem processo em que as pessoas acusam reciprocamente a prática de alienação parental”, conta a magistrada.
E como se sente a criança manipulada? Chefe do Centro de Apoio Psicossocial do Tribunal de Justiça de Pernambuco (CAP/TJPE), a psicóloga Helena Ribeiro descreve o quadro psicológico típico da criança vítima de alienação. “Pode apresentar baixa autoestima, queda no rendimento escolar, agressividade, depressão, sentimento de menos valia e isso pode ir se agravando ao longo do tempo. Porque perder um pai ou uma mãe quando vivos, isso é pior do que a morte de fato”, alerta a psicóloga.
Desde 2010, o Brasil conta com a Lei Federal n° 12.318, que estabelece penalidades para o alienador. O juiz poderá advertir, estipular multa, determinar a guarda compartilhada ou sua inversão e até a perda do poder familiar. Identificar a tentativa persistente de distorcer a imagem de um dos genitores é fundamental para prevenir que o laço familiar seja rompido. Com esse objetivo, o deputado Zé Maurício (PP), apresentou um projeto de lei para conscientizar crianças e adolescentes sobre os riscos de serem manipulados pelos pais. Segundo a Lei Estadual nº 15447, sancionada em 2014, bibliotecas de escolas públicas e privadas devem disponibilizar uma cartilha impressa sobre alienação parental.
O manual foi elaborado por um grupo de trabalho composto por integrantes do Centro de Apoio Psicossocial do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Faculdade Boa Viagem DeVry, Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/PE). Para Zé Maurício, o problema da alienação é uma questão educacional atual. “O grande objetivo da lei é trazer esse debate para as escolas, porque elas são o maior espaço de formação da criança fora do lar. Precisamos garantir que os jovens formem um juízo de valor próprio, ao invés de assimilar os valores de apenas um dos genitores”, salienta o parlamentar.