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STJ reconhece direito de cônjuge a bens bloqueados por incomunicabilidade
25/11/2015 Fonte: JOTAPor Bárbara Pombo
Casada desde 1993 em regime parcial de bens, uma mulher herda os patrimônios do pai e da mãe com a chamada cláusula de incomunicabilidade, que impede que os bens herdados sejam repartidos com o cônjuge. Em setembro de 2012, a beneficiária falece, e um litígio familiar se instaura em torno da herança, que envolve imóvel, carros e lojas no Rio de Janeiro.
De um lado na briga, o marido da herdeira. De outro, os tios e primos dela.
A cláusula de incomunicabilidade é prevista no inciso I do artigo 1.668 do Código Civil para possibilitar que bens herdados ou doados não sejam transmitidos ao cônjuge. O que a legislação não prevê, e o Judiciário foi chamado a responder é se a restrição permanece após a morte do beneficiário da herança. Na prática, o cônjuge poderia, após o falecimento da companheira, herdar bens gravados com a cláusula de incomunicabilidade?
No caso concreto, a discussão ganhou complexidade. A beneficiária era filha única, o pai faleceu em 1994 e a mãe, em junho de 2012. A herdeira faleceu três meses depois, em setembro daquele ano, sem deixar filhos e testamento.
Por unanimidade, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a restrição é vitalícia, mas não vale após a morte do beneficiário. Logo, o patrimônio estraria na sucessão normal. O cônjuge é herdeiro necessário e não concorre com tios e primos, por força do artigo 1829 do Código Civil. Dessa forma, o tribunal entendeu que o marido da falecida herdeira têm direito a todos os bens.
“A cláusula de incomunicabilidade não se relaciona com vocação hereditária”, afirmou a ministra Isabel Gallotti, relatora do REsp 1552553/RJ, acrescentando que a exclusão do genro fosse pretendida isso deveria ter sido feito pelo testador, inclusive dando outra destinação ao patrimônio.
O precedente fixa a orientação do tribunal em uma discussão rara no Judiciário. Segundo advogados, a cláusula de incomunicabilidade é comum nos casamentos com regime de comunhão total de bens, incomum atualmente.
“A cláusula grava o bem enquanto vive o beneficiário. Mas daí se concluir que não terá sucessão para o cônjuge é consequência falsa. Não se pode exclui bem da sucessão normal”, confirmou o ministro Luis Felipe Salomão.
Em 2014, a 3ª Turma da Corte havia decidido dessa forma, no REsp 1472945/RJ. Na ocasião, o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva considerou que o pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento jurídico brasileiro previsão “de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial.
“O fato gerador no direito sucessório é a morte de um dos cônjuges e não, como cediço no direito de família, a vida em comum”, afirmou.
Para o advogado Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a cláusula de incomunicabilidade não se restringe ao divórcio, podendo surtir efeitos após o falecimento do beneficiário. Segundo Madaleno, a ausência de filhos no caso concreto levou o marido a ser o único herdeiro da esposa. Dessa forma, não estaria recebendo a herança a partir do casamento nem na condição de marido. “A incomunicabilidade é restrita à meação [repartição entre os cônjuges do patrimônio do casal], mas não à sucessão”, afirma.