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Câmara vai debater proibição de união poliafetiva em audiência pública
A Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (7), a convocação de uma audiência pública para debater o Projeto de Lei 4.302, de 2016. O texto busca incluir a proibição expressa da "união poliafetiva" no ordenamento jurídico brasileiro. O pedido foi feito pelo deputado Alexandre Padilha (PT-SP) e a data ainda será definida pela Câmara.
Padilha justificou o debate como necessário para explicar aos deputados a questão, assim como evitar uma "antecipação legal inadequada" ao tema. "Essa é uma construção contemporânea sobre os novos sentidos de família que não mais estão apegadas a formalidades e estruturas documentais, mas necessariamente às manifestações afetivas plúrimas e de cuidados entre as pessoas reunidas em circunstâncias típicas das relações familiares, pois baseadas em vivências de amor e afeto", escreveu o parlamentar em sua justificativa.
O texto
O projeto de lei, apresentado em fevereiro de 2016 pelo deputado Vinícius Carvalho (Republicanos-SP), busca inserir um novo parágrafo único ao artigo 1º da Lei 9.278, de 1996 – que regulamenta a união estável, prevista no § 3° do artigo 226 da Constituição. O texto passaria a tornar expressamente proibido o reconhecimento da união poliafetiva, formada por mais de um convivente.
A justificativa possui um único parágrafo. Para o parlamentar, o texto busca coibir cartórios no país de reconhecerem tais arranjos – que seriam feitos, segundo ele, ao “arrepio da legislação”. Nas palavras do parlamentar: “Entendemos que reconhecer a Poligamia no Brasil é um atentado que fere de morte a família tradicional em total contradição com a nossa cultura e valores sociais”.
O texto, no entanto, segue em fase inicial de debates – ele está na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara desde março de 2016. Deputados de oposição, como o então parlamentar pelo PSOL do Rio de Janeiro Jean Wyllys, já chegaram a atuar contra a tramitação da proposta. À época, Wyllys tentou fazer com que este PL tramitasse junto a outro que versava em direção oposta, dando o reconhecimento de todas as formas de união entre duas ou mais pessoas.
Construção jurisprudencial
O advogado e professor Marcos Alves da Silva, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, discorda do teor do projeto de lei. "Não acho que exista, em primeiro lugar, nenhuma fundamentação jurídica, nem de índole constitucional, que permitisse um absurdo desse", ponderou o professor. "Óbvio que isto se funda numa perspectiva conservadora e retrógrada da sociedade, e só por esse motivo e com essa configuração talvez do Congresso hoje é que algo desta natureza tenha condições de passar."
Marcos Alves teme que o PL destrua um exaustivo trabalho jurisprudencial de concepção da conjugalidade, ocorridos depois da Constituição de 1988. "Não existe nenhuma previsão legal sobre isso [união poliafetiva]. Da mesma forma como não há, até hoje, nenhuma previsão legal de uma união estável ou homoafetiva. Não se encontra em lei nenhuma, nada dessa natureza", pondera o professor. O artigo 1.723 do Código Civil, assim como o § 3° do artigo 226 da Constituição só reconhecem a união entre homem e mulher.
Por isso, o avanço ocorreu nos tribunais. "É uma construção jurisprudencial, fundada em um labor doutrinário muito intenso, de anos, que consagra o princípio da pluralidade das entidades familiares, princípio que está inscrito no caput do artigo 226 como cláusula de inclusão", disse o professor. "Uma lei que venha a apresentar uma restrição às possibilidades de constituição de família ofende, em primeiro lugar, o princípio da pluralidade das entidades familiares consagradas pela Constituição, e um direto à liberdade evidente das pessoas, em relação à autodeterminação existencial e coexistencial – as pessoas se fazem família da forma que bem entenderem", concluiu.
Por Guilherme Mendes - repórter em Brasília
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