Notícias
Artigo científico examina o desvirtuamento de pensão alimentícia e a possibilidade da prestação de contas
"Indícios de Desvirtuamento da Pensão Alimentícia da Criança e do Adolescente e a Possibilidade da Prestação de Contas" é tema de artigo científico de autoria da advogada Barbara Heliodora de Avellar Peralta, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM. O texto está disponível na 42ª edição da Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões.
A autora cita o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça – STJ em 2020, que acolheu a possibilidade de prestação de contas sob indícios de desvirtuamento da pensão alimentícia. O precedente permitiu acionar judicialmente quem recebe pensão alimentícia em nome dos filhos e não direciona os valores ao verdadeiro detentor do direito aos alimentos.
Segundo ela, não se trata de um combate em face do representante legal da criança ou do adolescente, “mas de garantir que os valores estejam sendo direcionados aos filhos, garantindo assim, um mecanismo que dá efetividade ao princípio do melhor interesse e da proteção integral.”
A especialista ainda destaca: “É fundamental que o Judiciário entenda que, enquanto houver resistência em exigir a prestação de contas, estaremos protegendo não os menores e lhes garantindo a efetividade da proteção integral, mas sim aquele que comete o ilícito cruel de desvirtuar os alimentos”.
Prestação de contas
De acordo com a advogada, o tema esbarrava em questões processuais que aniquilavam o direito do menor em ter a certeza do recebimento dos alimentos. Agora, sendo viável tal questionamento, fica mais difícil que aquele que recebe e administra a pensão alimentícia não direcione os valores aos filhos. Afinal, não encontrarão guarida em questões processuais que impossibilitavam a certificação do desvio suspeito.
“Sendo agora viável tal questionamento, ficará mais difícil que aquele que recebe e administra a pensão alimentícia não direcione os valores aos filhos, quando agora,não encontrarão guarida nas questões que impossibilitavam a certificação do desvio suspeito.”
Mas ela pontua: há um longo caminho a ser percorrido. “Afinal, ainda que tenhamos essa possibilidade acolhida pela Corte superior, não é uma realidade nas varas de famílias, que continuam resistindo a aceitar tal demanda. Nós advogados é que temos o poder de mudar a jurisprudência, fazendo com que os tribunais superiores se posicionem sobre questões relevantes ao direito familiar contemporâneo.”
“É importante salientar que não se perquire aqui a análise contábil de todos os valores e gastos, mas a análise dos valores primordiais dos gastos dos menores, como educação e saúde, por exemplo”, frisa Barbara. Conforme a autora, após a análise dos valores apurados, e tendo sido constatado o desvirtuamento da pensão, o alimentante pode ingressar com ação revisional para adequar os valores com as reais e atuais necessidades dos alimentados, ou até mesmo adequar a melhor forma de pagamento para in natura.
Alienação parental
Recentemente nomeada presidente da Comissão de Alienação Parental da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB em Niterói, Barbara Heliodora afirma que o tema pode ser observado em diversos casos de alienação parental, quando o genitor alienado percebe que o genitor alienante usa os alimentos como instrumento para suas práticas odiosas de alienação parental.
“Já tive casos no escritório em que o representante legal, apesar de receber valores que deveriam ser destinados ao tratamento psicológico do infante vítima da alienação parental, nunca frequentou uma sessão de psicoterapia sequer. Tendo sido o processo de prestação de contas o meio adequado a comprovar o ato de alienação e, posteriormente, embasar uma ação autônoma de alienação parental”, exemplifica. Em outro processo, a advogada aponta uma situação na qual, mesmo com os materiais escolares pagos pelo genitor, a mãe deixava os filhos sem o material e atribuía o prejuízo no rendimento escolar a uma suposta negligência paterna.
“Sendo caso de alienação parental, deve a parte procurar um profissional especializado para assessorá-lo juridicamente, seja para acionar o Judiciário para cessar a alienação parental, seja para exigir a prestação de contas em face daquele que recebe os valores”, reitera.
No que se refere à prestação de contas em casos de inversão da guarda por alienação parental, Barbara assegura: “No precedente citado do STJ, entende-se que aquele que não detém a guarda do menor, nos termos do Art. 1.583, parágrafo 5º do Código Civil, possui o direito a prestar contas. Portanto, no caso da inversão de guarda, aquele que passa a não deter a guarda, poderá acionar o outro de forma a prestar contas dos valores pagos a título de alimentos.”
“Particularmente, entendo que a supervisão daquele que tem indícios de desvirtuamento da pensão é função inerente a qualquer dos detentores do poder familiar. Além de ser um dever imposto pelo legislador, é um instrumento que efetiva os princípios do melhor interesse e da proteção integral da criança e do adolescente. Pouco importa quem está na condição de guarda do menor, haja vista que o poder familiar é inerente aos pais”, argumenta a especialista.
Impactos da pandemia
Para Barbara Heliodora, a pandemia trouxe, além de inúmeras reflexões para o Direito da Família e Sucessões, um grande prejuízo na questão da alienação parental, pois não há nada mais grave do que manter em isolamento o menor com seu algoz. “Muito se falou sobre o aumento da violência doméstica, o que foi notório, no entanto, pouco se falou sobre o prejuízo dos infantes que foram mantidos em isolamento com seus genitores alienadores e afastados do convívio com o outro genitor.”
Outro impacto observado pela advogada se refere aos estudos psicológicos, imprescindíveis nos processos de alienação parental, que passaram a ser feitos virtualmente. Para ela, isso nunca substituirá o contato pessoal do perito com a vítima de abuso, afinal, até o silêncio e o olhar da vítima é rico de elementos para o expert que precisa traduzir em pouco tempo o sofrimento do indivíduo.
“No que se refere à prestação de contas, temos que lembrar que os valores questionados, por mais que sejam objetos de prestação de contas, nunca serão resgatados, ainda que sejam considerados desvirtuados, diante da irrepetibilidade dos alimentos”, reconhece a especialista.
Em sua avaliação, ela afirma que o ideal é que os genitores tenham a possibilidade de direcionar os gastos “economizados” com a suspensão de atividades decorrentes do isolamento social para um investimento ou poupança para os filhos. “Como podemos observar, a partir da admissão da prestação de contas dos valores de pensão alimentícia em nosso ordenamento, teremos uma gestão mais responsável dos alimentos pagos aos filhos, independentemente de qual guarda é adotada”, conclui Barbara.
Confira, na íntegra, esse e outros artigos exclusivos da 42ª edição da Revista Científica do IBDFAM. A assinatura pode ser feita pelo site ou pelo telefone: (31) 3324-9280. Assine!
Atendimento à imprensa: ascom@ibdfam.org.br