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Dia das Pessoas com Deficiência: Especialista comenta suspensão pelo STF de decreto que instituiu educação especial
Às vésperas do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, celebrado nesta quinta-feira, 3 de dezembro, o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal – STF, suspendeu a eficácia do Decreto 10.502/2020, promulgado em em 30 de setembro, que instituiu a Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida. A decisão liminar foi proferida na terça-feira (1º), na Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 6.590, e será submetida a referendo do Plenário.
De acordo com o decreto suspenso, a União, em colaboração com os estados, o Distrito Federal e os municípios, deveria implementar programas e ações para garantir os direitos à educação e ao atendimento educacional especializado aos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. Também incentivava a criação de escolas e classes especializadas.
O Partido Socialista Brasileiro – PSB, autor da ADI 6.590, afirmou que, apesar de sua finalidade declarada, o decreto teria como real objetivo de segregar os alunos com deficiência, ao prever o incentivo à criação de escolas e classes especializadas. Segundo o PSB, esse modelo provocaria discriminação entre os educandos com e sem deficiência, violando o direito à educação inclusiva.
Direitos humanos não estão garantidos, diz advogada
"Direitos humanos não estão garantidos, digo isso pois a Constituição Federal e o Decreto Executivo 6.948/2009 não têm a força de efetivação sem que a sociedade civil organizada busque sua eficácia por meios extrajudiciais e judiciais", defende a advogada Claudia Grabois, presidente da Comissão da Pessoa com Deficiência do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Segundo a especialista, as dificuldades enfrentadas por essa população perpassam a realidade socioeconômica de cada um. "As pessoas com deficiência estão inseridas em todas as classes sociais, mas a pobreza ainda é o que predomina. Por este motivo, quando da ausência do Estado, não se tem acesso aos direitos sociais e, por consequência, aumenta a dificuldade da efetivação dos demais direitos."
Também por tal razão, faz-se necessária toda atenção a novas leis e decretos, a exemplo desse que, às vésperas desta data de celebração, teve a sua eficácia suspensa. A especialista entende que a decisão do STF confirmou o compromisso assumido pelo Estado com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Ela destaca um trecho da decisão de Toffoli:
"Salta aos olhos o fato que o dispositivo trata as escolas regulares inclusivas como uma categoria específica dentro do universo da educação especial, como se houvesse a possibilidade de existirem escolas regulares não inclusivas."
"Interpretações à parte do acórdão que pode ser aqui analisado, fato é que a suspensão ocorreu e a ação de ativistas e entidades sociedade civil que se habilitaram como amicus curiae fizeram toda a diferença, e, à parte disto, se destaca a ação incisiva do Ministério Público e da Defensoria Pública da União em defesa das pessoas com deficiência e, da mesma forma, de conselhos de educação de todo Brasil", frisa Cláudia.
Para ela, retrocessos e tentativas correntes devem ser enfrentados da mesma forma. "Quando há retrocesso em qualquer área e setor, as pessoas com deficiência são igualmente atingidas, com a possibilidade de serem ainda mais afetadas por violações de direitos. Mesmo que repetitivo, até hoje a visibilidade da pessoa com deficiência é incerta, seja pela falta de acessibilidade, seja pelo questionamento do seu direito de existir plenamente em sociedade."
"Pode ser que a falta de união seja um entrave, pode ser que os mesmos favorecidos ainda não sejam os verdadeiros beneficiários dos direitos conquistados e desrespeitados, agora, é fundamental fortalecer o protagonismo e servir o movimento social em defesa de direitos, sem se servir dele", acrescenta a especialista.
Hipervulnerabilidade na pandemia
Em entrevista ao IBDFAM no ano passado, a advogada definiu 2019 como um tempo de retrocessos na luta pelas pessoas com deficiências. "Muito embora os retrocessos maiores tenham sido anunciados em 2019, seria falta de honestidade intelectual não informar que começaram a ser desenhados há alguns anos", avalia.
Em 2020, a vulnerabilidade foi acentuada diante da pandemia do Coronavírus. "A Covid-19 apresentou a realidade do lockdown permanente para toda uma população de pessoas hipervulneráveis pela condição. Na falta de acessibilidade, a pessoa deixa de existir e é apagado aos poucos e essa ainda é a realidade permanente de parcela da população. Quanto maior a invisibilidade, quanto menos informação e quanto menor a renda, maior a possibilidade de exclusão social."
Neste contexto, o convite é para a reflexão e enfrentamento. "Se o corpo da pessoa com deficiência incomoda, se sua presença causa estranhamento ou se a ausência não diz nada, ou mesmo se a falta de acessibilidade é recebida com naturalidade, cabe reflexão maior. Cabe refletir sobre violência intrafamiliar subnotificada, sobre falta de acessibilidade em cursos de graduação e mestrado, sobre como se percebe a pessoa com deficiência na sociedade."
Há a necessidade de auto-inclusão social, segundo Claudia. "As pessoas com deficiência existem, protagonizam cada vez mais e, não fosse pelas barreiras sociais, teríamos maior participação. Todos somos responsáveis por derrubar barreiras e apresentar soluções que promovam a participação igualitária em todos os espaços e setores."
"Neste 3 de dezembro, o convite é para o respeito à ciência, enfrentamento proativo dos desafios e barreiras interpostas, efetivação dos direitos e garantias constitucionais e celebração da vida de pessoas com e sem deficiência. Que as tensões sociais sirvam para fortalecer a vida e a existência intensa, que as violações de direitos percam a eficácia nos tribunais, se preciso for. Que a vida triunfe e a justiça sobreviva, se fortaleça e prevaleça", conclui Claudia Grabois.
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