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Pais de menino espancado na escola serão indenizados; especialista teme aumento da violência contra crianças e adolescentes na quarentena
Em Santa Catarina, uma criança foi vítima de agressões na cantina da escola, que resultaram em sequelas na região da face. Na semana passada, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC confirmou a condenação imposta ao Estado para indenizar os pais do menino em R$ 5,1 mil por danos morais e materiais. A decisão aponta que houve descuido da responsabilidade de garantir a segurança dos alunos que frequentam a rede pública de ensino.
Matriculado na 2ª série do ensino fundamental, o menino de apenas 7 anos foi espancado com inúmeros socos no rosto por outro estudante da escola, que frequentava a 4ª série. Segundo informações contidas nos autos, também houve considerável demora na prestação do socorro médico. O processo tramitou em segredo de justiça.
Presidente da Comissão da Infância e da Juventude do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Melissa Barufi aponta que a decisão foi adequada. “O Estado responde objetivamente pelos danos causados aos estudantes na rede pública, decorrentes da sua omissão no dever de vigilância e zelo. Desta forma, são indenizáveis tanto os danos materiais como morais sofridos por estudantes vítimas de agressão no ambiente escolar”, explica.
“Admite-se atenuação ou mesmo exclusão da responsabilidade, quando há o rompimento do nexo de causalidade entre a ação estatal e os danos, como nas hipóteses de força maior, culpa exclusiva da vítima, ou caso fortuito. Entretanto, em relação à decisão em análise, não se evidencia a ocorrência de alguma hipótese modificativa do liame de casualidade entre a omissão no dever de vigilância e o resultado final”, acrescenta a advogada.
Problema de saúde pública
Segundo Melissa Barufi, o caso expõe a violência contra crianças e adolescentes, já considerada problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Ela acrescenta que o bullying também passou a constar na lista de principais violências contra os mais jovens, que reúne ainda negligência, abandono, violência psicológica ou emocional, física e sexual, entre outras formas.
“Esse tipo de violência (bullying) geralmente é praticada por um grupo de pessoas para uma única pessoa, geralmente por questões de orientação sexual, raça, forma física, hábitos. As agressões podem acontecer de forma verbal, física e psicológica, normalmente ocorrem juntas”, detalha.
Dados mais recentes do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde – Datasus apontam que, em 2017, 41% das vítimas de violência no Brasil eram crianças ou adolescentes. Em 2018, o Disque 100 (canal de denúncias do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) registrou 152 mil tipos de violações contra essa parcela população.
Por si só, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA e os dispositivos da Constituição Federal não dão conta de reverter esse quadro. “Apesar de uma legislação que visa a proteção integral, a realidade, muitas vezes diversa, demonstra que a criança e o adolescente continuam expostos a distintas formas de violência e maus-tratos”, afirma Melissa.
Violência sexual e intrafamiliar
Na última segunda-feira (18), foi lembrado o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. A data foi instituída pela Lei 9.970/2000, em memória da menina Araceli Sánchez Crespo, estuprada e assassinada em 18 de maio de 1973, em um caso que chocou o País.
“No que se refere a esse tema, a pior de todas as realidades é o fato de que os mais próximos se tornam os maiores abusadores. A violência intrafamiliar, nesse sentido, se torna a mais cruel, pois promovida por quem menos se espera – os próprios familiares”, ressalta Melissa.
O contexto se agrava em meio à pandemia do coronavírus, que tem o distanciamento social como procedimento necessário para conter a disseminação da doença. De acordo com Melissa, pode-se esperar o aumento da violência contra crianças e adolescentes neste período, já que o lar nem sempre é o lugar mais seguro para aqueles em situação de vulnerabilidade.
Para o enfrentamento do problema, a advogada aponta a necessidade de uma rede de proteção, que deve ser instalada através de políticas públicas, a fim de coibir a violação de direitos. “A rede consiste em uma ação conjunta e horizontal, sem hierarquia, entre instituições governamentais e não-governamentais para prevenir e proteger crianças e adolescentes contra quaisquer tipos de violência”, detalha.
A advogada ressalta a necessidade de um comprometimento maior do Estado e da sociedade em prol da implementação de políticas públicas eficazes, da efetividade das leis vigentes e do aumento da fiscalização. “Importante que todos saibam e façam uso dos mecanismos e meios disponíveis para solicitar ajuda quando uma criança, adolescente, idoso ou qualquer pessoa em condição de vulnerabilidade esteja correndo risco de violência de qualquer natureza (Disque 100 ou Disque 180). Importante não desistir de denunciar ou solicitar socorro quando alguma dificuldade surgir”, frisa Melissa.
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