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Maioria do STF reconhece inconstitucionalidade da restrição à doação de sangue por homossexuais
A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal – STF votou, na última sexta-feira (1º), contra as normas que restringem a doação de sangue por homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes nos 12 meses antecedentes. A Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5543 contou com a participação do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM como amicus curiae na defesa da incompatibilidade da medida.
A previsão é que o julgamento seja concluído na próxima sexta-feira (8), com os votos dos demais ministros e a possibilidade de mudança de entendimento dos que já votaram. A maioria dos seis votos que já compõem o placar reconhece a inconstitucionalidade das normas do Ministério da Saúde e da Anvisa - apenas o ministro Alexandre de Moraes fez ressalvas.
Ajuizada em 2016 pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB, a ação questiona o artigo 64, inciso IV, da Portaria 158/2016, do Ministério da Saúde, e o artigo 25, inciso XXX, alínea ‘d’, da Resolução RCD 34/2014 da Anvisa. Os atos normativos estabelecem critérios de seleção para potenciais doadores de sangue, declarando inaptos, entre outros, homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes no prazo de 12 meses antecedentes.
Como os ministros haviam votado
Em outubro de 2017, os ministros Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber já haviam seguido o relator Edson Fachin, defendendo a inconstitucionalidade dos dispositivos. Já Alexandre de Moraes divergiu, entendendo a ação como parcialmente procedente. O julgamento foi suspenso após pedido de vista de Gilmar Mendes, que deu voto favorável, na última semana.
Na primeira ocasião, Luís Roberto Barroso considerou os atos normativos desproporcionais ao restringir direitos fundamentais dos homossexuais masculinos, reforçando o preconceito contra essa população. Segundo o ministro, a janela imunológica de 12 meses é excessiva e impede que se desfrute de uma vida sexual plena.
Para Rosa Weber, as normas promovem tratamento discriminatório quando elegem como critério de inaptidão para doação de sangue a orientação sexual do doador, desconsiderando, por exemplo, o uso de preservativo e a existência de parceiros fixos - informações que fariam diferença para avaliar condutas de risco, segundo a ministra.
Luiz Fux também se manifestou pela inconstitucionalidade das normas que, em vez de atentar às condutas de risco, elegem um grupo de risco por conta de sua orientação sexual. No entendimento do ministro, a premissa do legislador foi de que os homossexuais seriam, em maioria, portadores de HIV, na contramão de pesquisas que apontam o aumento de infectados entre homens heterossexuais.
Já Alexandre de Moraes argumentou que a Lei 10.205/2001 e o Decreto 3.990/2001 apontam a necessidade de proteção específica ao doador, ao receptor e aos profissionais envolvidos, enquanto as normas analisadas na ADI estabelecem limitações fixadas a partir de estudos técnicos e científicos, não por orientação sexual. Elas dão conta de que a possibilidade de transmissão do vírus HIV nas relações sexuais entre homens é maior do que nas relações entre homens e mulheres.
Assim, o ministro julgou parcialmente inconstitucional o dispositivo do Ministério da Saúde e votou pela declaração parcial de nulidade, com redução de texto, do inciso em resolução da Anvisa para retirar o prazo de 12 meses de abstinência. Por fim, deu interpretação conforme à Constituição à mesma resolução para que o sangue somente seja utilizado após o teste imunológico adequado.
Pandemia do coronavírus reacende a discussão
Na última semana, a Defensoria Pública da União – DPU enviou ao STF pedido de agilidade no julgamento diante da pandemia do coronavírus, que instaurou uma crise nos hemocentros com a queda nas doações de sangue. Mesmo em tal cenário, o Ministério da Saúde havia mantido as medidas restritivas aos homossexuais.
A advogada Patrícia Gorisch, diretora nacional do IBDFAM, fez a sustentação oral do Instituto enquanto amicus curiae na ADI 5543. Em entrevista divulgada na semana passada, ela atentou à necessidade de retomada da discussão. “Atualmente, os bancos de sangue estão vazios e ainda temos essa restrição que entendo ser totalmente inconstitucional”, defendeu.
“Essas medidas são inconstitucionais porque são discriminatórias; não colocam critérios médicos ou científicos. O critério é eminentemente discriminatório, dá uma ideia de que somente homossexuais estão no grupo de risco, o que é uma mentira. O grupo de risco é o comportamento inadequado, não ser homossexual”, difere Patrícia.
A matéria divulgada no portal do IBDFAM também deu conta da dupla vulnerabilidade impetrada à população LGBTI diante da pandemia da COVID-19. Leia na íntegra.
Com informações do STF.
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