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Julgamento sobre criminalização da homofobia continua na próxima semana
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta tarde o julgamento conjunto da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26) e do Mandado de Injunção coletivo (MI n° 4733), que pedem a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, em face da omissão do Congresso Nacional em editar a legislação pertinente.
O Ministro Celso de Mello, relator da ADO 26, fez a leitura parcial de seu voto, que será concluída na próxima quarta-feira (20). Até o momento, o ministro rejeitou preliminar quanto à possibilidade de o Estado indenizar vítimas enquanto a conduta não for criminalizada pelo Congresso Nacional. O relator também rejeitou a possibilidade de tipificar o crime de homofobia. Ele observou que só o parlamento pode aprovar leis tipificando crimes e impondo penas. Por outro lado, reiterou a omissão legislativa.
Voto
Celso de Mello classificou o tema como “complexo e extremamente delicado” . O ministro refletiu: “Eu sei que em razão deste voto e da minha conhecida posição em defesa dos direitos das minorias que compõem os denominados grupos vulneráveis serei, inevitavelmente, mantido no index dos cultores da intolerância”.
Ele destacou a importante função contramajoritária do STF: “Mais importante que atitudes preconceituosas e discriminatórias tão lesivas quanto atentatórias aos direitos e liberdades fundamentais de qualquer pessoa, independentemente de suas convicções, ou de sua orientação sexual, ou de sua percepção em torno de sua própria identidade de gênero, mais importante do que tudo isso é a função contramajoritária do Supremo Tribunal Federal”, disse.
O longo voto do ministro conta com 18 tópicos. Até agora, ele citou escritores, como Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir e Oscar Wilde, e grandes doutrinadores brasileiros, entre eles, a vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), Maria Berenice Dias.
Celso de Mello expôs os conceitos de orientação sexual, identidade de gênero, homofobia, transfobia, ideologia de gênero e da sigla LGBT. O ministro destacou que a comunidade LGBT caracteriza-se pela diversidade de seus integrantes, “embora todos unidos por um ponto comum: sua absoluta vulnerabilidade agravada por práticas atentatórias aos seus direitos essenciais”. O relator também mencionou a sexualidade como dimensão fundamental da experiência dos seres humanos.
Segundo o ministro, grupos políticos e sociais vêm estimulando o desprezo e disseminando ódio à comunidade LGBT. Ele leu manchetes de casos de crimes contra a população LGBT e ressaltou que o Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo. Segundo ele, séculos de repressão, intolerância e preconceito com esse tema resultam em graves proporções que tanto afetam as pessoas em virtude da sua orientação sexual e identidade de gênero.
Em dado momento de seu voto mencionou: “Essa visão de mundo fundada na ideia artificialmente construída de que as diferenças biológicas entre homem e mulher devem determinar seus papéis sociais: 'meninos vestem azul e meninas vestem rosa'. Essa concepção de mundo impõe, notadamente, em face dos integrantes da comunidade LGBT uma inaceitável restrição a suas liberdades fundamentais, submetendo tais pessoas a um padrão existencial heteronormativo incompatível com a diversidade e o pluralismo que caracterizam uma sociedade democrática, impondo-lhes ainda a observância de valores que além de conflitar com sua própria vocação erótico afetiva conduzem à frustração de seus projetos pessoais de vida”.
O ministro relator chamou as agressões homotransfóbicas de comportamento “covarde racista e preconceituoso”. O voto foi classificado como “histórico” pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli.
Mora legislativa, omissão inconstitucional do Congresso
O ministro Celso de Mello ainda não concluiu a leitura de seu voto, mas já deu sinais de que considera que o Congresso Nacional incorre em mora legislativa ao não editar norma penal contra atos de discriminação praticados em razão da orientação sexual ou identidade de gênero da vítima.
Ele argumentou que a Constituição Federal (artigo 5º, inciso XLI) estabelece ao legislador a obrigação de editar lei punindo criminalmente qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.
Na interpretação do ministro, a mera existência de propostas legislativas sobre o tema em tramitação no Congresso não afasta configuração da mora legislativa, pois já se passaram mais de 30 anos da promulgação da Constituição sem que tenha sido editada lei penal contra a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero. Para ele, a inação congressual traduz situação de ilicitude.
Maria Berenice Dias
Ao se referir à procrastinação do Poder Legislativo, o ministro Celso de Mello citou a desembargadora aposentada e advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do IBDFAM e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo e Gênero da entidade: “Inúmeros projetos de leis já foram apresentados. A tramitação é exasperadamente lenta. São arquivados, desarquivados, apensados, em um constante ir e vir. E se o projeto não foi votado e o relator não é reeleito, no final da legislatura a proposição é arquivada e é preciso recomeçar todo um calvário para que seja desarquivado e apresentado para o relator”.
A advogada está em Tóquio, no Japão, para participar, em 17 e 18 de fevereiro, do Simpósio de Direito Comparado Brasil-Japão: Direito Homoafetivo, quando abordará o tema: Casamento Homoafetivo no Brasil. Além de participar do evento, Maria Berenice será recebida pela Suprema Corte do Japão e pelo Tribunal de Família. Ela também se reunirá com advogados ativistas da causa e membros do movimento LGBTI.
Primeiro dia
O julgamento da criminzalização da homofobia teve início na quarta-feira (13), com a leitura dos relatórios dos ministros Celso de Mello (ADO 26) e Edson Fachin (MI nº 4733), seguida das sustentações orais. Entre elas, a do advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do IBDFAM. Assista aqui.
STF dá início a julgamento sobre criminalização da homofobia. Ministros começam a votar nesta quinta-feira
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