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Avanços e desafios da Medicina da Reprodução
A solicitação para integrar a Comissão de Reprodução Assistida da American Bar Association foi feita à advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), por Robert Terenzio, que diz, por meio do convite, que a Comissão conta com mais de 200 advogados de direito de reprodução de todas as partes do mundo. Dias indicou a advogada Marianna Chaves, secretária de Relações Internacionais do IBDFAM, com vasta experiência na área, como especializações, mestrado e doutorado em andamento em universidades de Coimbra e Lisboa, para integrar a Comissão de Reprodução Assistida.
Robert Terenzio explica que a Comissão está envolvida com educação contínua, aconselhamento de legislaturas, orientação de novos advogados e aconselhamento a médicos reprodutivos e do judiciário sobre as leis de reprodução, à medida que evoluem. "A Comissão tem duas conferências sobre leis reprodutivas por ano, sendo uma em maio, outra em outubro. A conferência mais recente foi nas Bahamas, e a próxima será em Quebec, no Canadá", afirma. Segundo ele, a Comissão tem um conselho executivo, do qual ele está deixando depois de dez anos, que orienta a direção das atividades. "Algumas das tarefas mais notáveis ??que o conselho tenha dirigido incluem a elaboração de uma Lei Modelo de Regulação de Agências e um parecer consultivo para Haia, na Holanda, sobre a Situação das Crianças Nascidas a Partir de Sub-rogação", garante.
O projeto, segundo Maria Berenice Dias, é muito significativo e de importância ímpar. "Marianna Chaves tem dedicado sua atenção ao tema da reprodução assistida e muito bem representará a nossa instituição. Tenho certeza que terá muito a colaborar", diz. De acordo com Robert Terenzio, o Conselho Executivo é composto por 13 advogados com diferentes graus de experiência. "Como a ABA é uma entidade global, preferimos ter advogados que espelham essa experiência. Atualmente, temos advogados dos EUA, Canadá, Austrália e Reino Unido. Nosso propósito agora é ter um advogado ou advogados da América do Sul", afirma.
A Medicina da Reprodução vem avançando a galope nos últimos tempos, segundo Marianna Chaves, e hoje, por exemplo, já conseguimos escolher o sexo de um bebê (presença ou ausência do cromossomo Y) para evitar doenças ou anomalias vinculadas ao cromossomo sexual. "Temos também o Diagnóstico Genético Pré-Implantação que - ao contrário do pré-natal tradicional - permite o rastreio de doenças nos embriões externamente ao ventre, ou seja, antes que sejam implantados no ventre materno. Outro avanço fantástico foi o progresso relativo ao congelamento de óvulos, o que faz com que as mulheres possam atrasar o projeto da maternidade (já que o que influencia no risco da gravidez é a idade dos óvulos e não da mulher em si) e também é uma alternativa à criopreservação dos embriões. A ciência médica avançou tanto nos últimos anos que sequer podemos mais dizer que é impossível que uma criança tenha mais de dois pais genéticos. Com a técnica de substituição mitocondrial, uma pessoa pode ser vinculada geneticamente a três pessoas, ou seja, carregar o DNA dos três: da mãe, dona do óvulo original, que teve o núcleo retirado; da doadora do óvulo que teve o núcleo retirado e inserido na "casca" do ovócito original e do pai ou doador de esperma. Essa técnica já está regulada legislativamente no Reino Unido desde 2015", garante.
Mas, a reprodução assistida enfrenta e sempre enfrentará muitos desafios. É o que destaca a nova integrante da Comissão. Em alguns lugares, Marianna Chaves diz, os desafios deixaram de ser técnicos e jurídicos e passaram a ser puramente éticos. "Hoje podemos escolher o sexo, as características físicas, fazer um rastreio relativo a doenças e mutações genéticas nos embriões, mas até onde podemos ou devemos ir? Há um grande debate sobre a possibilidade ou não da maternidade de substituição com caráter comercial. Por mais que possa parecer chocante, a comercialização do útero é uma realidade que não pode mais ser contida e enquanto a maioria dos países proíbe a prática, ela se realiza em lugares como a Índia ou Ucrânia - onde o turismo reprodutivo é intenso - ou no mercado negro. É um tema que precisa ser mais debatido no Brasil. Aqui, penso que o nosso maior desafio ainda é uma falta de legislação. Temos resoluções do Conselho Federal de Medicina que apenas nos dão uma falsa sensação de segurança. São corpos de normas deontológicas, que vinculam os médicos, as clínicas, os hospitais, mas não vinculam as partes", diz.
Marianna Chaves já há alguns anos vem se dedicando aos estudos da Bioética e do Direito Médico. "Ao lado do Direito das Famílias, esse domínio da ciência jurídica me fascina. Sou pós-graduada em Direito da Medicina e da Bioética, em Consentimento Informado e, mais recentemente, fiz um curso sobre Direito e Medicina da Reprodução. Além disso, faço parte há bastante tempo da World Association for Medical Law e venho participando de congressos e workshops na matéria. Inclusive já estive palestrando em um congresso da American BAR Association em Las Vegas, exatamente sobre a Reprodução Assistida no Brasil. Também venho me dedicando à advocacia no Direito Médico, especialmente na reprodução assistida. Atuamos aos pacientes que se submetem às técnicas de PMA, mas também junto às clínicas e médicos especializados", conta. E nesse momento está escrevendo junto com Eduardo Dantas, Presidente da Associação Brasileira de Direito da Saúde e vice-presidente da Associação Mundial de Direito Médico, um livro de comentários à Resolução 2121/2015 do Conselho Federal de Medicina (CFM).
A especialista afirma que há alguns anos fez parte dessa mesma Comissão que é bastante atuante na matéria nos EUA e fora, mas fazer parte do Conselho Executivo significa participar da elaboração de projetos de lei, de pareceres para Convenções sobre a matéria e trabalhos dessa natureza. "Atualmente, o conselho possui advogados de todos os continentes e, a pedido do Dr. Robert Terenzio, a nossa vice-presidente Maria Berenice Dias indicou uma pessoa para compor esse board. Certamente será um desafio, mas uma oportunidade de aprender muito com as experiências práticas estrangeiras", comenta.
Sobre o Provimento nº 52/2016 do Conselho Nacional de Justiça, resultante de um pedido de providências do IBDFAM, Chaves explica que o Provimento teve boa intenção e "certamente causou mais benefícios do que danos, mas a realidade é que estamos tratando essa matéria no Brasil de forma negligente e compartimentada". Em todas as exposições de motivos das Resoluções do CFM, a autarquia se manifesta no sentido de necessidade de uma legislação. "E o CNJ, na hora de elaborar o Provimento, não teve o cuidado de o harmonizar com as disposições do CFM. Por exemplo, o Provimento do CNJ exige - para o registro do filho - que seja apresentada uma declaração do diretor da clínica com a indicação do doador de gametas (óvulos ou esperma). Todavia, a Resolução 2121/2015 do CFM impõe aos médicos e serviços de saúde o sigilo relativamente aos doadores. O que fazer? Além da desarmonia, importa referir que o descumprimento das Resoluções do CFM podem acarretar aos médicos sanções nos termos do Código de Ética Médica. Esse singelo exemplo nos mostra a necessidade premente de uma regulação sistematizada e harmônica", finaliza.
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