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Lei Maria da Penha: uma década de lutas e conquistas
Há dez anos, o Código Civil brasileiro ganhava um instrumento legal capaz de coibir a violência doméstica praticada contra a mulher. No dia 7 de agosto de 2006, a Lei Maria da Penha (lei nº 11.340/2006) foi sancionada pelo então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. Conhecida por 98% da população brasileira, a norma diminuiu em 10% o número de homicídios contra mulheres, de acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgados no ano passado. Sua significância ultrapassou fronteiras, e a ONU – Organização das Nações Unidas – a reconheceu como uma das três melhores legislações do mundo neste sentido.
Adélia Moreira Pessoa, presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do IBDFAM, reitera a efetividade da norma. De acordo com ela, “a Lei Maria da Penha trouxe maior visibilidade à violência de gênero e, após sua vigência, a mulher tem adquirido mais coragem para denunciar e romper com a situação”. Entretanto, afirma, as leis, isoladamente, não modificarão tal realidade. “Para determinar a mudança de padrões culturais sexistas que ainda imperam em nossa sociedade, se fazem necessárias ações educativas em todos os níveis de ensino e através de todos os meios de divulgação, especialmente a mídia”, defende.
A observação de Moreira Pessoa vai ao encontro das constatações do Mapa da Violência de 2015. O estudo aponta que, entre 2003 e 2013, o número de homicídios cometidos contra vítimas do sexo feminino passou de 3.937 para 4.762, aumento de 21% na década. De acordo com a OMS – Organização Mundial da Saúde –, o Brasil apresentou taxa de 4,8 homicídios por 100 mil mulheres em 2013, o que coloca o país na 5ª posição internacional, entre 83 nações avaliadas. É importante salientar que, das 4.762 mortes registradas naquele ano, 2.394 (50,3%) foram perpetradas por um familiar da vítima, e 1.583 (33,2%) pelo parceiro ou ex-parceiro.
“A superação da violência contra as mulheres está longe de ser alcançada. Sem dúvida, um longo caminho já foi traçado, mas se desenha no horizonte um vasto trajeto a percorrer, com múltiplos desafios”, comenta Adélia. Para ela, a falta de apoio efetivo às mulheres em situações de violência (no âmbito público e privado), a incompreensão e resistência dos agentes sociais responsáveis pelos atendimentos e encaminhamentos, e a inexistência de um programa de atendimento ao autor da agressão são pontos a serem discutidos e aperfeiçoados.
“São necessárias políticas públicas mais consistentes em assistência social e saúde visando à proteção à vítima e sua família. Urge ainda sensibilizar todos os agentes públicos que intervêm nesta seara, compreendendo também ações de responsabilização do autor da agressão, com as necessárias medidas socioterapêuticas de ressocialização, de modo que se possa amarrar bem os elos dessa rede, para que as intervenções não sejam apenas pontuais”, defende Adélia Moreira Pessoa.
Justiça assegura medidas protetivas à mulher que optou por não abrir processo criminal contra seu agressor
A 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo deferiu pedido da Defensoria Pública do Estado e garantiu proteção a uma mulher que optou por não processar criminalmente seu companheiro. Inicialmente, a defensora que atua no caso propôs a ação e garantiu, em primeira instância, medidas protetivas à vítima. Entretanto, a decisão foi revogada pela juíza, sob alegação de que a mulher não havia aberto processo criminal contra seu agressor.
Com isso, a defensora argumentou que a vítima de violência doméstica deve ter sua autonomia resguardada, independentemente do registro de uma queixa-crime. Nalida Coelho Monte alegou ainda que as medidas protetivas são garantidas pela Lei Maria da Penha, que visa assegurar a não violação de direitos básicos das mulheres. Os argumentos foram acatados pela 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, que determinou o restabelecimento da ação sob a justificativa de que, ao invés de comprovar crimes, as medidas protetivas buscam ratificar a efetividade da Lei Maria da Penha.
Adélia Moreira Pessoa julga como “oportuna” a decisão do TJSP. Para ela, é preciso terminar com o equívoco de interpretar a Lei Maria da Penha com o olhar tradicional, sendo preciso considerar sempre os fins a que ela se destina: a proteção e assistência à mulher em situação de violência. “A Lei Maria da Penha trouxe um novo paradigma: não podemos mais pensar apenas em responsabilizar, com todas as garantias constitucionais, o autor do delito, mas também ter um olhar de proteção integral à vitima – e a medida protetiva é um dos caminhos”, explica.
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