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TRF-3 autoriza a penhora de oficina localizada no mesmo terreno da residência de uma família
A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS) autorizou a penhora de uma oficina, localizada no mesmo terreno onde foi erguido o imóvel residencial do executado, considerado protegido por lei. O TRF-3 entendeu que a impenhorabilidade de bens de família protege a residência, e não estabelecimentos comerciais.
Segundo a desembargadora federal Marli Ferreira, relatora do caso, a impenhorabilidade, prevista na Lei 8.009/90, procura proteger bens patrimoniais familiares essenciais à adequada habitação. E confere efetividade à norma contida no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, princípio fundamental da dignidade da pessoa humana.
Conforme os autos, a penhora recaiu sobre o imóvel registrado em um único número de matrícula junto ao Cartório de Registro de Imóveis do município de Limeira, no interior de São Paulo. Porém, ele corresponde a dois prédios, com dois números diferentes na rua, sendo o nº 210 destinado à residência, e o nº 158 constituído de um barracão para oficina.
Com isso, a desembargadora explicou que, em casos como esses, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem considerado tais áreas como mistas e existem pronunciamentos quanto à possibilidade de penhora da parte com destinação comercial ou acessões voluptuárias, como piscinas e churrasqueiras, resguardando apenas aquela em que se encontra a casa residencial.
A juíza ainda citou que a Lei 8.009/90 tem por finalidade garantir a moradia da família. Assim, em caso de imóvel desdobrado em dois pavimentos, mesmo que se encontrem em linha horizontal, um utilizado para moradia familiar, outro para utilização de comércio, nada impede que sobre o último recaia a penhora e que seja feito, posteriormente, o devido desdobramento.
A desembargadora declarou que sendo interesse maior da Lei 8.009/90 proteger a entidade familiar, as demais edificações no mesmo terreno não têm a mesma proteção, já que a própria certidão de registro de imóvel revela que o nº 210 destina-se à residência. Portanto, segundo ela, a penhora deve recair apenas sobre o imóvel de nº 158, constituído de um barracão para oficina.
De acordo com o advogado Ronner Botelho, membro do IBDFAM, a impenhorabilidade do bem de família decorre do direito fundamental à moradia, a fim de assegurá-lo, consoante interpretação dada pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Edson Fachin (Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo, Rio de Janeiro: Renovar, 2001). “O que se tem em mente é a tutela do patrimônio mínimo existencial, como forma de garantia de vida digna. Neste passo, dispõem os artigos 1º e 5º da Lei nº 8.009/1990. Artigo 1º: O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei. (...) Artigo 5º: Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.”
Ronner Botelho explica que o preceito contido na Lei 8.009/90 também protege pessoas que, em razão de laços familiares com o proprietário, habitem único imóvel residencial, ainda que nele o dono não mais resida. A partir daí, o advogado esclarece que o significado de família se identifica no plural, pois abandonou a concepção do singular, evidenciando que são variadas as concepções familiares a gozarem desta proteção. Segundo ele, não há direitos e garantias fundamentais que se concretizem de forma absoluta.
“Tanto é verdade que a própria Lei 8.009/90, no seu artigo 3º, afastou de proteção, ou seja, determina que a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida; (Redação dada pela Lei nº 13.144 de 2015); IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. (Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991)”, diz.
Para o advogado, é importante destacar que a impenhorabilidade em exame só deve ser conferida ao único imóvel residencial do devedor executado e de sua família. Segundo ele, a proteção conferida pela Lei 8.009/90, se por um lado assegura o patrimônio mínimo existencial, por outro não visa a fornecer evasões para o devedor se esquivar da obrigação de pagar o credor.
Por fim, o advogado elucida que o abuso do direito deve ser afastado em prol da boa-fé e lealdade processual. “Assim sendo, o Superior Tribunal de Justiça perpetrou a súmula 449, prevendo que ‘A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora’. Não só isso, o STJ, por meio da Corte Especial, por ocasião do julgamento do Recurso Especial 1.114.767/RS, submetido ao rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, decidiu que, em sede de execução fiscal, a penhora poderá recair excepcionalmente sobre o estabelecimento comercial do contribuinte, aí incluído o imóvel onde exerce a sua atividade, desde que não existam outros bens passíveis de penhora. Em síntese, no caso específico como a moradia ficou preservada, pois haviam dois prédios, pelo caso concreto deve-se preservar a boa-fé e lealdade processual”, conclui.
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