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Filha socioafetiva pode pleitear verba devida pelo INSS a seu pai
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou decisão de primeiro grau que habilitou uma filha sociafetiva a pleitear a verba devida pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a seu pai, em um processo judicial ainda em tramitação. A mulher havia obtido na justiça o reconhecimento da paternidade socioafetiva por decisão transitada em julgado e passou a pleitear a herança. O pai ingressou com um processo judicial em 1990, pedindo aposentadoria por idade, e teve o direito reconhecido em sentença proferida em 1991, passando a receber o benefício. Contudo, o INSS foi condenado a pagar as parcelas desde a citação e a verba atrasada estava em fase de execução quando o homem faleceu. Assim, sua filha requereu habilitação para receber os atrasados, o que foi atendido pelo magistrado de primeiro grau.
No entanto, o INSS recorreu da decisão, alegando que deve haver o consentimento do pai para que o registro de filho não biológico possa ser feito por escritura pública. Ainda sustentou que o vínculo afetivo não prevalece sobre o biológico e que a paternidade afetiva é fruto de mera construção jurisprudencial, não estando fixado em nossa legislação pátria. Além disso, o Instituto afirmou que na certidão de óbito consta que o falecido era solteiro e sem filhos. A autarquia previdenciária também questionou o fato de não ter sido parte da ação judicial que, na Justiça Estadual, reconheceu a paternidade socioafetiva entre a mulher e o falecido segurado.
Considerando o agravo do INSS, a desembargadora federal Marisa Santos afirmou que, com o reconhecimento da paternidade socioafetiva, a garota é herdeira, na forma dos artigos 1.596 e 1.829, I, do Código Civil. A magistrada ainda declarou que o argumento do INSS de que a filiação socioafetiva é ‘mera construção jurisprudencial’ não se sustenta, pois a jurisprudência é fonte do Direito, e o que foi por ela firmado produz os mesmos efeitos decorrentes das normas legais.
A desembargadora lembrou que foram as construções jurisprudenciais que levaram ao reconhecimento e adoção, até pela Constituição Federal, da união estável. A juíza ainda exemplificou que assim como o que ocorre com a união homoafetiva, que ainda não é expressamente coberta pela legislação, mas é amplamente reconhecida pela sociedade civil e jurisprudência, a denominada filiação/paternidade/parentalidade socioafetiva também deve ser respeitada.
Marisa Santos declarou que a realidade social exige que a proteção jurídica se estenda àqueles que, com base no afeto e sem vínculo biológico, constituem famílias, até porque laços fundados no afeto podem ser muito mais resistentes aos entraves da vida que laços fundados em ligações meramente biológicas e facilmente esfacelados quando submetidos ao teste das divisões de patrimônio.
Assim, a juíza destacou que o Direito Previdenciário não pode se distanciar da realidade já reconhecida pelo Direito Civil e nem pode ser interpretado como um regramento totalmente divorciado do sistema jurídico nacional. Ela também afirmou que é direito social que tem por fim dar proteção, não podendo excluir aqueles dos quais o segurado cuidou como se seus filhos biológicos fossem. A magistrada destacou que não há dúvidas sobre a condição de herdeira, uma vez que a decisão que assim a declarou transitou em julgado e que, inclusive, na certidão de nascimento já consta o nome de seu pai. Por fim, afirmou que mesmo que assim não fosse, seria possível ao juiz da causa previdenciária reconhecer a filiação socioafetiva para fins de reconhecimento da condição de dependente, se fosse o caso, ou da condição de herdeiro, assim como o faz quando reconhece a existência de união estável para fins previdenciários.
Segundo a advogada Melissa Folmann, presidente da Comissão de Direito Previdenciário do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), a paternidade socioafetiva ainda caminha a passos lentos no Direito Previdenciário, seja pelo fato de ser um instituto relativamente novo ou por ter demandas esparsas. “Contudo, na linha do que a jurisprudência previdenciária já fez em outros momentos com institutos questionados no Direito de Família, há uma forte tendência de que o posicionamento se encaminhe de forma favorável. Desde a Constituição Federal não há mais distinção entre filhos adotados ou não, tanto que a legislação previdenciária datada de 1991 em momento algum faz diferença em relação à origem do filho. Contudo, há uma diferença entre filhos, enteados e menores tutelados, e é aqui um dos momentos em que a paternidade socioafetiva tem e terá uma de suas grandes valias, pois inúmeros são os enteados que ficam desamparados por não provarem dependência econômica em relação ao padrasto/madrasta, mas que estariam protegidos se a paternidade socioafetiva fosse reconhecida, ou pelo menos pleiteada. Em suma, não há como se pensar o Direito Previdenciário sem enaltecer sua direta relação com o Direito de Família, em se tratando de proteção social do núcleo mais caro ao segurado: a família”, comenta.
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