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Entrevista: Nelson Rosenvald
Por que alguns países estão tão avançados com relação às diretivas antecipadas de vontade e porque o Brasil é tão atrasado neste assunto?
Curioso. É porque o Estado brasileiro sempre adotou um modelo paternalista,ou seja, as relações do Brasil com seus cidadãos nunca foram pautadas pela igualdade; sempre foi uma relação entre o súdito e o superior: o brasileiro nunca se portou como cidadão autônomo. Sempre se colocou de forma submissa ao Estado. Isto é uma herança portuguesa. Diferente de países como Estados Unidos e Inglaterra, cujo modelo de cidadania foi construído de uma forma mais democrática, nesses países sempre se respeitou mais o espaço de autodeterminação, de liberdade da pessoa para que ela pudesse reger sua vida. Essa é a diferença.
Em quais casos, especificamente, o Brasil deveria evoluir com relação a esse tema?
Um primeiro passo, que seria significativo para retirar a insegurança jurídica, seria que houvesse uma lei específica sobre diretivas antecipadas, porque enquanto se trata de uma resolução do Conselho Federal de Medicina, a qualquer hora o médico mantém uma posição reativa, porque a Resolução está abaixo da Lei e o Código Penal continua punindo essas condutas. Muitas vezes o profissional da medicina vai temer respeitar uma diretiva antecipada para não se colocar em posição de responsabilidade penal. Então, a partir do momento que ou há uma lei específica sobre o tema ou há uma reforma penal (e que haja uma descriminalização expressa), haverá espaço de maior segurança jurídica para que os profissionais da medicina possam incorporar essas práticas de respeito a esses atos de autonomia.
O senhor acredita que algum dia a eutanásia seja possível no Brasil?
Não é algo que nós possamos conceber hoje em dia, até porque se fôssemos fazer uma pesquisa de opinião pública a respeito da eutanásia, ela não contaria com a simpatia da população, ao contrário da ortotanásia. A ortotanásia é uma prática que parece hoje consensual, não só na sociedade civil, como nas diversas religiões, na ciência; já se entende que o ser humano tem direito de estabelecer limites a determinados tratamentos que não trazem qualidade de vida, mas, pelo contrário, apenas sofrimento. Mas com relação a eutanásia no Brasil, ainda é um horizonte distante, e eu creio que primeiro nós temos que fincar o pé com relação a possibilidade de qualquer pessoa ter amparo jurídico para realizar suas declarações prévias, para nomear um procurador para cuidados com saúde. E um segundo passo seria justamente esse: ampliar as hipóteses de realização de diretivas antecipadas e até mesmo para que elas possam abarcar a eutanásia.
Na Bélgica, por exemplo, tem uma legislação deste ano que retira qualquer limite de idade para se autorizar a eutanásia. Basta que a pessoa, mesmo sendo jovem, seja ouvida por um médicoque constate que a decisão dela é uma decisão livre de influências, madura, não obstante a idade, que essa decisão será respeitada. Existem outros países que admitem a eutanásia, mas com imposição de idade mínima. A Bélgica é o primeiro país do mundo que autoriza isso. A cultura dos países nórdicos é de total respeito ao espaço de autonomia da pessoa.
Como fazer uma diretiva antecipada de vontade?
O primeiro passo é se dirigir ao seu médico para realizar as declarações prévias, e nesse momento o médico vai ouvi-las e reduzi-las a um termo. E isso vai para o prontuário médico. Se acontecer alguma coisa, o médico sabe exatamente como deve proceder naquelas situações-limite. Mas se a pessoa quiser dar maior publicidade à essa declaração pode levar uma escritura pública ao Cartório de Notas. Fazer uma diretiva antecipada remete ao Cartório de Notas. Existe até um site - www.testamentovital.com.br - onde a pessoa pode fazer o registro dela online, para que no futuro possa haver ainda mais segurança de que aquele ato vai ser respeitado.
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