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Entrevista: Prisão por pensão alimentícia
Levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) revelou o número de presos, em 14 estados brasileiros e no Distrito Federal, por falta de pagamento de pensão alimentícia. De acordo com o levantamento, o estado com maior número de presos devedores de pensão é São Paulo, com 499 presos, seguido do Distrito Federal (234) Minas Gerais (228), Paraná (102), Santa Catarina (98), Rio de Janeiro (37) e Espírito Santo (24). As regiões Norte e Nordeste têm o menor número de prisões. Amazonas e Maranhão não registraram nenhum preso. Roraima, Paraíba e Alagoas registraram apenas um preso. Os demais estados pesquisados foram Pernambuco (6), Pará (9) e Mato Grosso (32).
Tais dados suscitam questionamentos, que dividem opiniões, sobre a eficácia do dispositivo da prisão, atualmente vigente, e a proposta de aplicação de sanções alternativas, como a inclusão do nome do devedor no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC). Confira estes e outros questionamentos na entrevista da semana, com o advogado, especialista em Direito de Família e diretor de relações internacionais do IBDFAM, Paulo Malta Lins e Silva.
Como o senhor avalia esse quadro tendo como base a realidade judicial brasileira?
O sistema processual de execução de dívida alimentícia no Brasil é muito ineficaz. Se compararmos o número de execuções e as suas consequências sancionais, iremos ter a certeza de que esse método não funciona. O processo é lento e, mais ainda, no sistema judiciário do Norte e do Nordeste, onde, em poucas cidades, existem os Juízos de Família. A prestação jurisdicional é promovida por Magistrados que ao mesmo tempo misturam sua função com as diversas ramificações do Direito e, assim, pouco tempo sobra para o campo da família. Vejo também o elemento "valor do débito" que, quanto mais para o Sul do país, mais aumenta, quantificadamente, o valor atribuído, seja por acordo ou decisão judicial da pensão de alimentos.
Na sua opinião, qual o principal motivo para essa significativa diferença nos números de presos por pensão alimentícia na região Sudeste em comparação com as regiões Norte e Nordeste?
Em quase todas as cidades da Região Sudeste, temos os Juízados de Família, a prestação jurisdicional, mais especializada e com isso as execuções, embora também lentas, têm seu resultado mais eficaz na condução da pena. Como já disse, no Sudeste as pensões são montadas em valores mais significativos e existe o fator da instabilidade do emprego, enquanto no Norte e Nordeste os valores são inferiores, o que motiva maior facilidade na manutenção da adimplência, além de haver maior estabilidade nos empregos e o sistema do desconto em folha de pagamento do devedor predominando no critério de recebimento.
A prisão é o dispositivo mais eficaz nos casos de devedores de alimentos?
Não considero. Embora a lei busque a eficácia ao dar ao devedor o prazo de 72 horas para adimplir o débito sob a pena de prisão. Nas outras execuções de dívidas, a pena se aplica em 24 horas, a penhora. A justificativa em 72 horas alonga muito as discussões, chegando processos de execução simples de alimentos a levar de 2 a 10 anos de tramitação no Poder Judiciário. Todos os recursos são utilizados pelos devedores contumazes e assim ganham tempo, levando as suas famílias ao desespero. A prisão é decretada, mas os "habeas corpus" são concedidos facilitando ainda mais o devedor, em prejuízo da família. Os meios de penhora "on line" ou mesmo o leilão de ativos do devedor têm se constituído condições de maior celeridade para a solução do débito.
O senhor acredita que o judiciário tem sido efetivo na prisão por dívida de alimentos?
Não! O mesmo Judiciário que manda prender, na instância superior, manda soltar. As execuções, como afirmei, são delongadas e sofridas pelas partes credoras e raramente os devedores convencem os Juízos de Família, com suas ponderações, mas esses demoram muito no decreto sancional, diante da versatilidade que a Legislação concede aos devedores para não pagar.
Quais os principais motivos para o não pagamento de pensão por parte dos devedores? O senhor acredita que existem outras questões de ordem subjetiva para que o alimentante não pague os alimentos devidos ao alimentado?
A perda de emprego, a atualização do valor pelo salário mínimo, a instabilidade financeira assumida pelo devedor decorrente de mutações de seus empregadores e algumas vezes a rixa entre os casais, que não resolvem seu "status" afetivo com o divórcio, deixando para trás diversos traumas, rusgas que colaboram para agravar ainda mais o relacionamento. Ele, por capricho, deixa de pagar e ela, por ódio, exige dele o que não pode pagar. Ele, para se ver livre, assume e se torna inadimplente em seguida. As rixas e problemas emocionais não resolvidos no divórcio levam também, além dos aspectos financeiros, instabilidade nos empregos e nos ganhos do profissional liberal, do autônomo e mesmo do empresário, muitas vezes, à inadimplência e ao risco das execuções.
O senhor acredita que a possibilidade de inclusão do devedor no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), estratégia que começa a ser utilizada em alguns estados como Goiás, Mato Grosso do Sul e Pernambuco, vai diminuir o número de presos por dívida alimentícia?
Creio que todos os métodos, inclusive a prisão como última alternativa, se justificam para reduzir as cobranças alimentícias nos Juízos de Família. A penhora "on-line", o bloqueio de bens com leilão em seguida, a inclusão no SPC forçariam uma solução mais abreviada, para se exigir o pagamento de uma dívida alimentícia, do que as condições no momento hoje vigentes na legislação, que alongam o sofrimento dos credores e somente beneficiam os devedores.
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