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STJ decide que Estados podem revisar base de cálculo do ITCMD
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ decidiu que os Estados podem abrir processo administrativo para revisar o valor usado para calcular o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD. Por maioria, prevaleceu o voto divergente do ministro Marco Aurélio Bellizze. A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, ficou vencida.
A decisão se deu no julgamento do recurso repetitivo sobre o Tema 1.371, que discute se o Estado pode calcular novamente o valor usado para cobrar o ITCMD com base no que está no Código Tributário Nacional – CTN ou se isso só pode ser feito quando uma lei estadual permitir.
A controvérsia surgiu a partir de mandados de segurança ajuizados por contribuintes contra atos da Fazenda do Estado de São Paulo, que questionavam o arbitramento da base de cálculo do imposto. O Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP concedeu a segurança ao entender que a Lei Estadual 10.705/2000 já define a base de cálculo como o valor venal do bem transmitido e que não caberia ao Fisco arbitrar novo valor sem previsão legal específica.
No recurso, a Fazenda de São Paulo argumentou que o artigo 148 do CTN permite que o Estado refaça a base de cálculo do imposto quando o valor declarado pelo contribuinte não corresponder ao valor real de mercado. Assim, segundo o Estado, não seria necessária uma lei estadual específica para autorizar essa revisão.
A Fazenda também afirmou que esse artigo do CTN é uma norma geral de Direito Tributário, que vale para todo o país e orienta como os tributos devem ser calculados e lançados. Por isso, todos os Estados deveriam aplicá-lo automaticamente, sem precisar repetir essa regra em suas próprias leis.
Em sessão no dia 8 de outubro, o Estado de São Paulo reiterou que o art. 148 do CTN, "por definir uma metodologia de fixação da base de cálculo do tributo, e também por interferir no próprio lançamento do crédito tributário, se constitui como a norma geral de direito tributário".
Diante disso, defendeu a fixação da seguinte tese: "O artigo 148 do CTN possibilita a instauração de procedimento administrativo para fixação da base de cálculo do tributo pelo fisco quando, por qualquer motivo, os valores declarados pelo contribuinte não forem idôneos, dispensada a previsão em lei local".
Voto da relatora
A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, votou para que o STJ não analisasse o recurso do Estado de São Paulo. Para ela, a forma de calcular a base de cálculo do ITCMD não é definida pela lei federal, mas pela lei estadual. Por isso, segundo a ministra, o STJ não poderia julgar um recurso que, na prática, discute a interpretação de uma lei estadual.
Ela explicou que o CTN apenas estabelece a regra geral: diz que a base de cálculo é o valor venal e que o arbitramento é uma forma possível de chegar a esse valor. No entanto, cabe ao Estado detalhar como esse valor será apurado e em quais situações o arbitramento pode ser usado.
Para a ministra, discutir o uso de tabelas de referência ou se o Fisco pode ou não definir novos valores não é uma discussão sobre a base de cálculo em si, mas sobre o método de cálculo do imposto, que é matéria de Direito Estadual. Por isso, ela defendeu que os Estados têm liberdade para definir quando o Fisco pode fazer uma avaliação administrativa e quando pode recorrer ao arbitramento.
No caso concreto, a relatora apontou que as decisões que afastaram o arbitramento da base de cálculo do ITCMD com base na Lei paulista 10.705/00 deveriam ser mantidas.
Diante disso, Maria Thereza de Assis Moura propôs a seguinte tese: "(i) O Direito Estadual estabelece a forma de apuração do valor venal, base de cálculo do ITCMD; (ii) a discussão sobre o cabimento do arbitramento da base de cálculo do ITCMD em face da existência de valor de referência é uma discussão fundada no Direito Estadual; e (iii) não cabe REsp contra decisão que aplica os arts. 9º e 13 da Lei 10.705/00 do Estado de São Paulo para afastar o arbitramento da base de cálculo do ITCMD".
Após o voto da relatora, o julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Marco Aurélio Bellizze.
Divergência
No voto-vista apresentado na última quarta-feira (10), o ministro afirmou que o direito de o Estado arbitrar a base de cálculo do ITCMD vem diretamente do artigo 148 do CTN. Para ele, a lei estadual pode escolher o critério para calcular o imposto, e é válido que a Fazenda abra um processo de arbitramento, desde que siga as regras do próprio CTN.
No caso concreto, Bellizze observou que o TJSP proibiu, de forma geral, o uso do arbitramento da base de cálculo.
Ao divergir da relatora, ele destacou que o processo administrativo pode ser usado para apurar o valor real do bem quando o valor inicialmente declarado pelo contribuinte não serve para calcular corretamente o imposto.
O ministro explicou que esse poder da Fazenda não fere o Direito Estadual e não pode ser eliminado por uma decisão judicial de forma ampla. Porém, ressaltou que o processo administrativo não pode ser automático nem permitir que a Fazenda simplesmente ignore qualquer valor declarado.
Segundo Bellizze, o arbitramento só deve ser aberto quando os documentos ou informações apresentados pelo contribuinte forem insuficientes, incompletos ou pouco confiáveis para calcular o imposto.
Nesses casos, compete ao Fisco "comprovar as razões pelas quais a declaração dos contribuintes seriam omissas ou não merecedoras de confiança, observado o contraditório e a ampla defesa".
Tese firmada
Ao propor a tese para o Tema 1.371, o ministro estruturou o entendimento em dois pontos:
"I - A prerrogativa da administração fazendária de promover o procedimento administrativo de arbitramento do valor venal do imóvel transmitido decorre diretamente do CTN, em seu art. 148, norma geral.
II - a legislação estadual tem plena liberdade para eleger o critério de apuração da base de cálculo do ITCMD, não obstante a prerrogativa de instauração do procedimento de arbitramento nos casos do art. 148, destinado a apuração do valor do bem transmitido em substituição ao critério inicial que se mostrou inidôneo a esse fim, a viabilizar o lançamento tributário, não implica em violação do direito estadual, tampouco pode ser genericamente suprimida por decisão judicial. Seu exercício dá-se por instauração regular e prévia do procedimento individualizado apenas quando as declarações, as informações ou os documentos apresentados pelo contribuinte, necessários ao lançamento tributário mostrarem-se omissos ou não merecerem a fé e a finalidade a que se destinam, competindo à administração fazendária comprovar que a importância então alcançada encontra-se absolutamente fora do valor de mercado, observada, necessariamente, a ampla defesa e o contraditório."
No caso concreto, a Primeira Seção do STJ seguiu o voto do ministro Marco Aurélio Bellizze. O colegiado decidiu analisar apenas parte do recurso do Estado de São Paulo e, nessa parte, deu razão ao Estado. Assim, derrubou a proibição geral que o TJSP havia imposto sobre a abertura de processos de arbitramento.
Com essa decisão, ficou confirmado que as Fazendas estaduais podem abrir procedimento administrativo para arbitrar a base de cálculo do ITCMD, desde que sigam os critérios estabelecidos pelo STJ.
REsp 2.175.094 e REsp 2.213.551
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