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Projeto de lei busca considerar abandono afetivo e sobrecarga de guardião na pensão alimentícia
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Atualizado em 28/08/2025
A Câmara dos Deputados analisa um projeto de lei que define novos critérios para calcular o valor da pensão alimentícia destinada a crianças e adolescentes. Pela proposta, o valor deverá considerar a sobrecarga de quem tem a guarda e também situações de abandono afetivo por parte de um dos genitores.
Deverá ser levado em conta ainda o critério já existente da "necessidade-possibilidade", que determina que sejam consideradas tanto as necessidades do filho quanto as possibilidades financeiras do genitor alimentante. O projeto altera o Código Civil.
O texto, aprovado recentemente pela Comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família, foi o substitutivo elaborado pela relatora, deputada Laura Carneiro (PSD-RJ), para o Projeto de Lei 2121/2025, da deputada Maria Arraes (Solidariedade-PE).
No substitutivo, a relatora substituiu o termo “ausência” por “abandono afetivo”. A relatora Laura Carneiro destacou que, diferentemente da ausência prevista no Direito Civil, o abandono afetivo ocorre quando os pais deixam de oferecer cuidado e presença ao filho.
Segundo ela, essa falta pode sobrecarregar o genitor responsável, sobretudo em famílias monoparentais, afetando sua saúde e condições de cuidado, além de trazer prejuízos emocionais às crianças e adolescentes, como baixa autoestima, ansiedade, depressão e dificuldades de relacionamento.
O projeto tramita em caráter conclusivo e ainda será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para virar lei, a medida precisa ser aprovada na Câmara e no Senado.
Proporcionalidade
O jurista Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, explica que a aprovação do PL 2.121/2025 “introduziria agora, sim, uma verdadeira inovação no Direito das Famílias: é que poderia, por isto, ser agora realmente chamada de ‘trinômio alimentar’”.
Rolf explica que, atualmente, o valor da pensão alimentícia é fixado a partir do binômio clássico, que considera a possibilidade de quem paga e a necessidade de quem recebe. Com a mudança, passaria a existir um terceiro fator: o abandono afetivo.
Na prática, isso significaria que além da obrigação alimentar proporcional, poderia ser acrescido um valor indenizatório quando ficar configurada a ausência proposital e injustificada do genitor em relação ao filho. Assim, o trinômio alimentício uniria possibilidade, necessidade e reparação, incorporando ao cálculo da pensão uma compensação pelo dano emocional decorrente da negligência afetiva.
Na visão do jurista, a inclusão do abandono afetivo no cálculo da pensão alimentícia tende a tornar os processos mais complexos. Isso porque, atualmente, a necessidade de filhos menores ou incapazes é presumida, bastando ao juiz equilibrar possibilidade e necessidade. Com a aprovação do projeto, além dessa análise, seria preciso comprovar se houve de fato abandono afetivo.
Nesse caso, a indenização funcionaria como uma sanção, aumentando o valor da pensão. O jurista ressalta, contudo, que a apuração exigirá produção de provas, já que nem sempre a ausência de convivência resulta de um abandono deliberado. “Nem sempre a pessoa abandona. Às vezes, uma alienação parental impede que o genitor conviva com seu filho.”
Esse novo elemento, segundo ele, tende a prolongar os processos e tornar mais demorada a fixação do quantum alimentar.
Abandono afetivo
Rolf ressalta que o abandono afetivo já é reconhecido pela Justiça como causa de indenização. A inovação da proposta é acumular esse valor diretamente na pensão alimentícia, somado à necessidade de subsistência do filho uma compensação pelo dano causado pelo afastamento do genitor.
“Claro que gera custos maiores, mas é a consequência do reconhecimento de um ilícito que é o abandono, que inclusive pode ser enquadrado como crime pelo artigo 244 do Código Penal”, observa.
O jurista pondera, no entanto, que a medida traz desafios práticos. “Se hoje a pensão é fixada, por exemplo, em 30% da renda, a indenização pelo abandono poderia elevar esse percentual para 40% ou 45%, funcionando como forma de punição e desestímulo ao abandono.”
A dificuldade, segundo o especialista, será diferenciar a parte destinada à sobrevivência do alimentando daquela que corresponde à reparação pelo abandono. “Isso porque, em caso de inadimplência, a prisão civil é cabível apenas para a dívida alimentar propriamente dita, e não para parcelas indenizatórias”, diz.
Rolf Madaleno observa, no entanto, que o texto proposto não é claro de que a comprovada ausência diga respeito ao abandono afetivo ou que esteja relacionado aos cuidados diretos para com os filhos, cujas tarefas e atenções usualmente as mães se ocupam em maior tempo e dedicação.
Por Débora Anunciação e Guilherme Gomes
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